Entrevista

“Zona Franca e ZPE, consorciadas, serão a maior vitrine do novo Amapá que vai surgir”

Mesmo sem mandato eletivo, o ex-presidente e senador José Sarney (PMDB-AP) mostra que continua com muito prestígio e também com a pontaria afiada. O tempo está mostrando que alguns de seus principais projetos estavam muito bem encaminhados ao sucesso, e ele acertou no alvo, como o Linhão do Tucuruí, pontes, estradas, portos e o aeroporto. Foi assim também com a Área de Livre Comércio – seu cartão de visita como senador pelo estado – e, mais recentemente com a Zona Franca Verde. Numa deferência a sua atuação, o governo enviou a minuta da regulamentação da lei de sua autoria para que ele avaliasse, antes da assinatura do decreto presidencial da regulamentação. Dizendo-se feliz e realizado, ele falou ao Diário do Amapá sobre essa importante página na história do desenvolvimento do Amapá.


Edição CLEBER BARBOSA
colaborou AFONSO BENITES

Diário do Amapá – Presidente, como está o projeto de transformação da Área de Livre Comércio de Macapá e Santana em Zona Franca Verde?
José Sarney – Olha, essa é uma lei federal de minha autoria, que data ainda de 2009, que para ser implementada precisava ser regulamentada. Trata-se de uma oportunidade valiosíssima do Amapá tirar dividendos a partir dos incentivos que essa legislação garante. O governador Waldez vinha conversando bastante comigo desde que reassumiu o governo a respeito desse projeto e se comprometeu a envidar esforços no que refere ao estado enquanto eu, em outra frente, vinha agindo em Brasília para que as coisas pudessem caminhar. A minuta da regulamentação me foi enviada pelo ministro Armando Monteiro, do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, numa deferência especial e reconhecimento por nossa atuação para a elaboração do projeto. Depois veio o decreto presidencial com a regulamentação e a Zona Franca Verde já é uma realidade, tanto que o estado já está implantando esse novo parque industrial com as primeiras empresas se credenciando a usufruir desses incentivos fiscais e começar suas operações no Distrito Industrial.

Diário – O que ela difere das regras da Área de Livre Comércio?
Sarney – Eu gosto sempre de lembrar das circunstâncias que levaram à criação da Área de Livre Comércio. Logo que cheguei ao Amapá, depois da Presidência da República e eleito senador pelo estado, nosso primeiro desafio era a energia elétrica. Havia racionamento boa parte do dia, portanto além do desconforto era uma barreira para o desenvolvimento econômico. Vencida essa etapa, com a chegada das usinas termelétricas de Camaçari, que nos foram enviadas pelo Ministério das Minas e Energia, tratamos de injetar recursos na ampliação de Paredão [Usina Hidrelétrica Coaracy Nunes] que aumentou sua capacidade geradora. Depois disso pensei num projeto econômico perene, que garantisse um horizonte para o Amapá. Foi quando conseguimos a Área de Livre Comércio, uma conquista até hoje importante para o estado. Mas respondendo à sua pergunta, ela é diferente da Zona Franca Verde, pois tem isenção para importar mercadorias, enquanto que agora teremos a possibilidade de industrializar matéria-prima da floresta, o que abre um leque de possibilidades ao Amapá. Se a Área de Livre Comércio foi o começo do comércio, a Zona Franca será a oportunidade para a indústria do Amapá se desenvolver.

Diário – O que poderá ser industrializado a partir da implantação da Zona Franca Verde?
Sarney – A regulamentação da Zona Franca Verde, que é a lei nº 11.898/09, reúne um conjunto de incentivos fiscais e financeiros para o beneficiamento industrial dos recursos e matérias-primas regionais de origem florestal, pesqueira, agropecuária e mineral.

Diário – O senhor sempre teve uma ligação com o setor elétrico, como isso foi construído presidente?
Sarney – Na verdade sou um entusiasta das obras de infraestrutura. Pois elas garantem qualidade de vida para o coletivo, para cidades, para o estado, para uma região. Mas pontes, estradas, hidrelétricas, aeroportos, enfim, não se encontram na prateleira, prontas para ser comercializadas. Elas carecem de muito planejamento, recursos e, claro apoio político para sair do papel e virarem realidade. Então com o setor elétrico é assim também, dá um trabalho enorme, então posso dizer que sempre fui movido a desafios. Quando Fernando Henrique Cardoso me convidou para o Ministério da Cultura, declinei muito respeitosamente, mas pedi a ele que pudesse indicar o ministro das Minas e Energia, pois sabia que com a Eletronorte, por exemplo, favoreceria em muito o Norte do Brasil e, claro, o Amapá. O que, de fato aconteceu.

Diário – Foram muitos projetos para o setor não é?
Sarney – Penso como Winston Churchill, que dizia “o populista pensa apenas nas próximas eleições e o estadista nas próximas gerações”. Defendi obras para o futuro do Amapá, coisas que certamente eu nem poderei usufruir, pois já não estarei neste plano… [risos] Isso tudo para dizer que sim, pudemos avançar no setor elétrico, inicialmente com a única hidrelétrica existente no estado e depois lutando por anos para a interligação do Amapá ao sistema elétrico nacional, através do Linhão do Tucuruí, outra grande vitória pessoal que me orgulho de ter alcançado, afinal nossos adversários sempre duvidaram que isso pudesse ser concluído. Hoje, além dessa interligação, passamos a ser também exportador de energia, pois foram três novas usinas que vieram para o Amapá, Santo Antônio, Ferreira Gomes e Caldeirão.

Diário – Com a tragédia ocorrida em Mariana, Minas gerais, muita gente voltou a ter preocupações com as barragens, especialmente aquelas erguidas para formar os reservatórios das hidrelétricas. Isso também preocupa o senhor?
Sarney – Não, de maneira alguma. A energia hidráulica é considerada pelos especialistas uma energia limpa e renovável, pois utiliza apenas a vazão dos cursos d’agua, que grassam no Amapá, por obra do Criador. Os impactos são minimizados com um acompanhamento rígido dos estados, dos municípios e dos organismos ambientais, seja fiscalizando a correta execução das obras, seja garantindo as compensações para as comunidades afetadas.

Diário – E sobre outro projeto de sua autoria, que prevê a implantação de uma Zona de Processamento de Exportação, a ZPE, como isso também poderá ajudar o estado?
Sarney – Se a notícia da regulamentação da Zona Franca Verde foi um presente de Natal dos amapaenses, a ZPE será a cereja do bolo, por assim dizer. Ela também está criada e pronta para ser implantada no Distrito Industrial de Santana. Esse modelo de vanguarda eu conheci ainda nos tempos que era presidente do país e fiz uma visita à China, que já adotava tal modalidade. De lá pra cá o mundo deu muitas voltas e a China acabou se consolidando como na potência econômica que é hoje. Então a Zona Franca e a ZPE, consorciadas, serão a maior vitrine do novo Amapá que vai surgir, verdadeiramente sustentável e pronto para o futuro.

Diário – O senhor é sempre otimista?
Sarney – Gosto de frases, então fecho aqui com outra, de Helen Keller, que disse: “O otimismo é a fé em ação. Nada se pode levar a efeito sem otimismo”. Então sou otimista sim.

Perfil…
Entrevistado. José de Ribamar Ferreira de Araújo Costa, o José Sarney, tem 86 anos de idade, é advogado, jornalista e escritor. Começou a vida política ainda estudante do Colégio Liceu, em São Luís (MA), tendo depois chegado a suplente de deputado federal, até vencer uma eleição para a Câmara Federal e depois elegeu-se governador do Maranhão e depois senador. Nos anos 1980 engajou-se na campanha pelas eleições diretas e pouco depois compôs como vice a chapa vitoriosa do Presidente Tancredo Neves, que faleceu antes da posse. Sarney assumiu as rédeas do País e conduziu o período da redemocratização, da Constituinte e da volta das eleições diretas para Presidente. Depois foi eleito senador pelo Amapá onde cumpriu três mandatos.


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