Dom Pedro Conti

O sinal da cruz


Um senhor gostava muito de conversar com o pároco e o considerava seu amigo, mas continuava a se professar ateu. As discussões eram longas e acaloradas. Certa noite, após algumas fatias de pizza e mais uma conversa, o bom padre acompanhou o homem até o carro para se despedir. Surpreendentemente, antes de dar a partida do motor, aquele senhor fez o sinal da cruz. O pároco abriu a porta do carro e disse:

– Mas como? Te proclamas ateu e agora fazes o sinal da cruz?

– Não é o que senhor pensa – respondeu o homem. – Eu faço assim… Levou a mão até a testa e disse: não esqueci nada, depois bateu no peito e falou: comi bem. Em seguida, bateu no bolso esquerdo da camisa e disse: tenho os óculos. Bateu também no bolso direito da camisa e exclamou: a carteira de motorista está aqui. Juntou as mãos satisfeito e disse: tudo em ordem, podemos ir. Bateu na chave do carro e foi embora.

A partir deste domingo, iniciamos aquela que nós católicos chamamos de Semana Santa. São os últimos dias da Quaresma e a Páscoa é a solenidade mais importante do ano litúrgico. Por isso, os “preceitos da Igreja” pedem aos cristãos para confessar os seus pecados, ao menos, uma vez ao ano e receber a Eucaristia por ocasião da Páscoa. É o mínimo que um católico deve fazer se quiser continuar a manter algum laço visível e significativo com a comunidade, a Igreja, que o batizou, crismou e o admitiu à mesa do Corpo e do Sangue de Jesus. É verdade que muitos batizados já mudaram de lugar; talvez estejam vivendo em outra cidade e em outra paróquia, mas nem por isso podem esquecer as origens da sua fé. É neste sentido que a Igreja é “mãe”: porque gera a vida cristã. Infelizmente, existem pais que se esquecem dos seus filhos e filhos que se esquecem dos seus pais. Esquecer da mãe Igreja é mais fácil ainda. Basta deixar de frequentá-la.

A celebração dos dias da Páscoa, sobretudo os últimos três: Quinta, Sexta e Sábado Santo com a grande Vigília Pascal, são uma excelente oportunidade para renovar a nossa participação na comunidade, confirmar os fundamentos da nossa fé, o que nos distingue de outras confissões religiosas e o porquê. Não basta usar e proclamar o nome de Jesus. Precisa, também, lembrar de maneira ativa e consciente o que ele fez e por quê o fez. As consequências da sua Paixão, Morte e Ressurreição chegam até nós. Ele mesmo mandou guardar a sua “memória” do jeito que ele escolheu. É isso que a Igreja Católica procura fazer desde o seu início. Na Mi ssa, após o “memorial” da Última Ceia, ao padre que proclama: “Eis o mistério da fé!”, todos respondem: “Anunciamos, Senhor, a vossa morte, proclamamos a vossa ressurreição, vinde Senhor Jesus!”. Dessa maneira, os cristãos se comprometem a ser sinais de esperança e vida nova para quem se encontrar na tristeza, no abandono, na “morte” do mal que faz sofrer a si mesmo e aos outros, ou se fecha no túmulo do próprio egoísmo.

Muitos vivem hoje uma vida corrida, cheia de compromissos e de tarefas. Alguns por necessidades, outros seguindo as prioridades escolhidas por eles mesmos. Encontram tempo para muitas coisas, mas dificilmente param para refletir e avaliar a própria vida, o rumo dela e o sentido mais profundo do que dizem e fazem. Jesus Cristo é o mesmo, mas nós mudamos muito e, continuamente, a cada etapa da vida. Tem o Jesus da Primeira Comunhão, o Jesus da juventude, depois da família, da idade madura e da velhice. Em nosso relacionamento com Deus, existem as pausas, as paradas, mais ou menos longas, os entusiasmos, as decepções, os abandonos e os retornos. O seu amor é para sempre. Não importa se, neste momento da nossa vida, a Cruz dele é só um enfeit e para nos proteger do mau olhado e dar sorte na vida. Não importa se o sinal da Cruz só serve para ver se tudo está em ordem no nosso bolso. Deveria servir para lembrar a sua vida doada, para nos sentirmos amados pelo Pai, o Filho e o Espírito Santo. Nunca é tarde para nos deixar alcançar pelo amor de Jesus. É Páscoa de novo!