José Sarney

A Pascoela


As Oitavas de Páscoa, semana seguinte ao Domingo da Ressurreição, foram chamadas, durante muito tempo, de Pascoela. Assim ela é tratada na carta de Pero Vaz de Caminha ao Rei D. Manuel I, o Venturoso, narrando a descoberta do Brasil.

Diz Pero Vaz de Caminha: “Ao domingo de Pascoela pela manhã, … mandou naquele ilhéu armar um esperável, e dentro dele um altar mui bem corregido. E ali com todos nós outros fez dizer missa…”

Entre nós quase se esqueceu a denominação Pascoela, que ainda persiste em Portugal. Mas meu amigo Padre Wagner Portugal fala, em seu “Apostolado da Oração”, da semana da Pascoela.

Essa semana é uma semana muito importante na Liturgia. Das 16 antigas festas de “oitavas” — a semana seguinte a uma festa —, a Igreja reteve duas: a do Natal e a da Páscoa.

A Pascoela era chamada semana branca, ebdomada alba. É a continuação da grande festa da Ressurreição do Senhor.

A primeira leitura, nesses dias, é sempre dos Atos dos Apóstolos: na segunda, os testemunhos da ressurreição (At 2, 14-32); na terça, a exortação de S. Pedro ao batismo (At 2, 36-41); a cura do coxo por S. Pedro (At 3, 1-10); Pedro lembra a morte de Cristo para enfatizar a ressurreição (At 3, 11-26); Pedro e João, presos, anunciam que só em Jesus há salvação (At 4, 1-12); no sábado, mandados calar pelo Sinédrio, os dois apóstolos dizem que “não podemos nos calar sobre o que vimos e ouvimos” (At 4, 13-21). No domingo da Pascoela os Atos proclamam a eucaristia: “partiam o pão, tomando alimento com alegria e simplicidade de coração” (At 2, 42-47).

Nesse domingo branco o Evangelho segundo S. João conta a presença de Jesus entre os discípulos.

Ao entrar, Jesus diz e repete: “A paz esteja convosco.” Essa saudação simples, Shalom alechem, em hebraico, o mesmo Salaam Aleikum em árabe, assume um novo significado quando o Senhor sopra sobre eles e complementa: “Recebam o Espírito Santo.” Ele traz, portanto, a Si mesmo, e é a paz.

Por causa deste trecho do Evangelho, em que o apostolo só acredita na ressurreição depois de tocar nas chagas de Jesus, o domingo de Pascoela também é chamado de domingo de São Tomé. É ainda o domingo de Quasimodo, ou o Quasimodogeniti, da antífona “Quasi modo geniti infantes…” (1 Pe 2, 2), cantada nessa data.

Daí o nome dado por Victor Hugo ao personagem de Notre Dame de Paris: “fosse para marcar a data em que o corcunda foi encontrado, fosse para assinalar sua aparência incompleta”.

O Chag HaMatzot, festa dos pães ázimos, é um antecedente da Pascoela. Foi instituído por Moisés (Ex 12, 3-6). E os judeus ainda o festejam durante uma semana, em continuidade com a Pessach, belas festas com seu ritual muito antigo, tão importante para eles quanto significativo para os cristãos.

Assim, quando vou cumprimentar meus amigos, a quem não cumprimentei na Páscoa, digo Feliz Pascoela, sem esquecer que nela foi descoberto ou completou-se o achamento de nosso país.

Assim, com este artigo espero ter completado o meu tema da Páscoa. E a todos desejo que tenham tido uma feliz Pascoela.