Nilson Montoril

O torturador Moacyr Fontenelle


No dia 16.5.1964, o General Luiz Mendes da Silva, o primeiro governador do Território Federal do Amapá, do período revolucionário, nomeava o capitão Francisco Moacyr Meier Fontenelle para exercer o cargo em comissão de Diretor da Divisão de Segurança e Guarda e Comandante da Guarda Territorial. O capitão desenvolvia suas atividades no 26º Batalhão de Caçadores, sediado em Belém, mas tinha sido cedido ao governo do Amapá. O capitão chegou a Macapá no entardecer do dia 12 de maio, chefiando um contingente do Exército, que fora mandado desalojar da Fortaleza São José os insurretos da Guarda Territorial, que tinham se declarado solidários ao Tenente Charone, oficial ao qual o Secretário Geral Orlando de Sabóia Barros, no exercício do governo, repassou determinações do coronel Terêncio Furtado de Mendonça Porto no sentido de exercer forte pressão sobre diversos segmentos da sociedade macapaense, entre eles a Igreja Católica, notadamente o Padre Jorge Basile, redator do Jornal “A Voz Católica”, semanário que tecia duras, mas justas criticas aos elementos que agiam de forma truculenta em nome da Revolução de 31 de Março. Tenente Uadih Charone era, então, o Diretor da DSG e comandanta da GT. Ele argumentou com o Dr. Sabóia, que precisaria dispor de tempo para dialogar com as pessoas tidas como contrárias á revolução, algumas que ele isentava de qualquer hostilidade ao regime vigente no país.

A situação ficou mais tensa quando o governador em exercício mandou que o tenente prendesse o Padre Jorge. Charone disse que não cumpriria a determinação e não aceitaria sua exoneração. Comunicou que se alojaria na Fortaleza até o retorno do governador Terêncio. O Dr. Sabóia e seus bajuladores transformaram uma situação fácil de ser resolvida em um caso de segurança nacional. Ao saberem que o tenente Charone estava auto-recluso na Fortaleza, Delegados de Polícia, Instrutores e soldados da Guarda Territorial adotaram a mesma medida. Telegramas alarmantes foram passados ao governador Terêncio, ao Comando Militar da Amazônia, 8ª Região Militar, Ministros da Guerra e Justiça, além do Conselho de Segurança Nacional. Imediatamente, o Comando do 26º Batalhão dos Caçadores recebeu ordens para preparar um contingente bem armado, confiando à direção a um capitão linha dura. Ás 18h15min horas pousava na pista do Aeroporto Internacional de Macapá, um avião C 47 da Força Aérea Brasileira trazendo soldados bem apetrechados sob o comando do capitão Francisco Moacyr Meier Fontenelle. Do aeroporto os militares seguiram para o centro da cidade fazendo parada na Praça Barão do Rio Branco, onde dois Grupos de Combate desceram do caminhão e isolaram a área em que está edificada a residência governamental.

O capitão e os demais soldados rumaram para a Fortaleza. O Tenente Charone integrava o corpo docente da Escola Técnica de Comércio do Amapá-ETCA sendo bem relacionado com seus alunos. Os estudantes clamaram que a União dos Estudantes dos Cursos Secundaristas do Amapá-UECSA fosse prestar solidariedade ao tenente Charone e acompanhar a atuação dos militares vindos de Belém. O presidente UECSA era José Figueiredo de Souza, o Savino, que acabou detido. Em seguida, Fontenelle determinou que os estudantes e curiosos fossem dispersos. A intervenção do tenente Charone foi fundamental para evitar maiores problemas. Ás 21 horas, quando tudo estava tranqüilo, o Doutor, Orlando Sabóia se auto-nomeou Diretor da DSG e Comandante da GT. Ao mesmo tempo acumulava quatro cargos públicos, mantendo-se na titularidade dos mesmos até que Terêncio Porto voltasse. A partir da posse de Fontenelle, dezenas de pessoas foram presas, acusadas de nutrir simpatia ou pertencerem ao movimento comunista. Sua forma intempestiva e exacerbada de agir teve seqüência no decorrer da gestão do governador Luiz Mendes da Silva, devidamente instigado pelo Secretário Geral Roberto Rocha Souza. Em janeiro de 1970, quando já era major e atuava no Rio de Janeiro,Fontenelle participou do grupo que interrogou e torturou Mário Alves no DOI-CODI. Fontenelle é tido como um dos praticantes dos piores tipos de torturas. Era exímio utilizador de pau-de-arara, choque, espancamento e simulação de fuzilamento. Figura com amplas descrições no Tomo V dos volumes I e II e no Tomo II,volume III do “Projeto Brasil Nunca Mais”.