Política

Helder Ferreira defende voto contrário ao impeachment e diz que OAB foi “precipitada”

Conselheiro federal da OAB do Amapá lamenta que instituição tenha negado prazo à defesa de Temer para exercer o contraditório e diz que decisão da OAB atendeu o clamor das ruas e desrespeitou o princípio da legalidade


Em entrevista exclusiva concedida na manhã deste sábado (27) ao programa Togas&Becas (DiárioFM 90.9) apresentado pelo advogado Helder Carneiro, coadjuvado pelos também advogados Wagner Gomes e Evaldy Mota, o conselheiro federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Helder Ferreira, defendeu o voto contrário da bancada do Amapá ao pedido de abertura de impeachment contra o presidente Michel Temer (PMDB); a decisão da instituição, na opinião dele, foi “açodada, precipitada, porque foi influenciada pelo clamor da população, que pede o afastamento de Temer do Palácio do Planalto, e desrespeitou o princípio da legalidade, ao negar à defesa do Presidente da República o direito constitucional do exercício da ampla defesa e do contraditório”.

Quanto à grande repercussão nacional do voto da bancada do Amapá no Conselho Federal, que foi o único estado que se posicionou contra a medida, Helder Ferreira garante que esse voto “de divergência” foi dado à luz da legislação e “dignificou a decisão da OAB nacional, porque mostrou que a divergência é salutar para a democracia”. Ele destacou que a maioria dos juristas brasileiros tem o mesmo entendimento dos conselheiros do Amapá; segundo ele, o pedido de abertura do processo de impeachment também desagradou grande parte dos conselheiros federais, que tiveram os votos vencidos nas bancadas, o que motivou, inclusive, a renúncia de um conselheiro federal de São Paulo.

“Vários juristas de grande expressão nacional já se manifestaram contra a decisão da OAB, que na minha opinião pessoal foi açodada, precipitada; entre esse juristas estão, por exemplo, nomes da envergadura de Dalmo Dallari e Yves Gandra, defendendo que teria que inicialmente se apurar a verdade, a validade das gravações entre o delator Joesley Batista, da JBS e o presidente Temer, porque peritos contratados pelo jornal Folha de São Paulo constataram que há cerca de 50 edições naquela gravação”, comentou.

De acordo com o conselheiro federal, o voto do Amapá não foi contrário ao impeachment, mas, sim, contra o que chamou de “cerceamento do direito de defesa” de Temer: “Quero esclarecer que a posição do Conselho Federal, favorável ao processo de impeachment foi da maioria do Conselho; com relação ao Amapá, por exemplo, houve consenso entre os três conselheiros, e eu disse isso quando falei em nome da bancada, no sentido da necessidade de se conceder prazo à defesa; em várias outras bancadas ocorreram divergências internas, mas como são três conselheiros e dois se manifestam de uma forma, essa decisão representa a opinião da bancada”.

Helder Ferreira também comentou o discurso do conselheiro federal Charles Bordallo ao final das discussões: “Esse entendimento das bancadas é inquestionável, apesar de que na bancada do Amapá houve consenso, tanto que ao final das discussões o doutor Charles fez questão de corroborar a nossa posição, deixando claro ser contrário aos termos da delação premiada (dos donos da JBS) e pediu que o STF (Supremo Tribunal Federal) ultimasse providencias legais para rever o acordo de delação premiada; além disso, vários juristas de expressão nacional vêm se manifestando a favor do entendimento da bancada do Amapá, e a decisão da OAB levou, inclusive, à renúncia de um conselheiro federal de São Paulo”, resumiu.

Erros e acertos
Questionado por um ouvinte, também advogado, que se identificou como Joaquim, se apenas a bancada do Amapá acertou e as demais erraram, Helder Ferreira minimizou: “Na realidade, tomo mundo acertou, porque como já dizia Nelson Rodrigues, toda unanimidade é burra. Eu não acho que o Amapá errou; muito pelo contrário, porque dignificou a decisão do Conselho Federal, mas eu defendo que a OAB deveria conceder um prazo de no mínimo 72 horas para que a prova (gravação de Temer com Joesley Batista) fosse periciada, oportunizando, assim, o direito de ampla defesa e contraditório”.

Outro advogado, por telefone, que se identificou como Carlos, perguntou a Helder se, nesse caso, ao “deixar de lado a legalidade”, o Conselho Federal decidiu com base no clamor das ruas, o conselheiro admitiu: “Acho que sim, mas é preciso deixar bem claro que a voz da OAB não pode ser a voz da população, mas sim da Constituição; isso (influência popular) é muito perigoso para a democracia; a decisão do pedido de impeachment da então presidente Dilma, por exemplo, foi discutida durante dois meses; a defesa dela, através do José Eduardo Cardozo (então advogado geral da União) teve oportunidade ampla de defender a então presidente; ele exerceu o direito de defesa e do contraditório; por isso nós não concordamos com o procedimento adotado com relação ao pedido de impeachment do Michel Temer da forma como foi feito, na minha opinião açodada, apressada, porque a OAB tem que ter muita prudência para poder decidir à luz da legalidade e com base nas provas; e se de repente agora as provas forem anuladas? Questiono isso porque o que levou a essa decisão foi a gravação (de conversa entre o presidente e o delator)”.

Conversa prévia com Paulo Campelo
Sobre a entrevista que o presidente da OAB/AP, Paulo Campelo, concedeu no mesmo dia em que o Conselho Federal decidiu pelo pedido de impeachment ao programa Togas&Becas, Helder Ferreira afirmou que a tendência dos conselheiros do Amapá era pela aprovação do pedido de abertura do processo, mas negou que havia acerto prévio entre o Conselho Seccional e os conselheiros federais nesse sentido; ele admitiu que a tendência da bancada do Amapá, até então, era pela aprovação do pedido, mas a decisão foi mudada diante do pedido de concessão de prazo feito pela defesa de Temer, que na opinião dele, seria obrigação legal da OAB:

– O presidente Paulo Campello não errou, não; nós realmente conversamos por volta das 17h30 da sexta-feira, antes da viagem a Brasília, e estávamos, sim, dispostos a votar pelo pedido de abertura do processo de impeachment; no entanto, quando chegamos a Brasília, pouco antes da Sessão, a Folha de São Paulo divulgou que uma perícia encomendada pelo jornal constatou que houve cerca de 50 edições na gravação da conversa do Joesley Batista com o presidente Temer; na ocasião vários conselheiros questionaram sobre a legalidade de deliberarmos pela abertura do impeachment se havia dúvida com relação à autenticidade da gravação; diante desse impasse, nós fomos para o Plenário, discutimos o assunto, e entendemos que, como a manifestação da OAB ganha ressonância, nós não poderíamos nos manifestar de forma açodada, apressada, e argumentamos que a OAB deveria ter mais cautela para decidir, principalmente porque estávamos a menos de três dias dos fatos (divulgação da gravação), que ocorreram na quarta-feira, exatamente 69 horas depois dos fatos, e as provas foram disponibilizadas no dia seguinte, às 9 horas da quinta-feira, constituídas de milhares de folhas de degravação do áudio, tempo insuficiente para um exame técnico – pontuou.

Para Helder Ferreira, a deliberação pelo pedido de abertura do processo de impeachment deveria ser precedido de exame técnico da prova: “Quando a Sessão (do Conselho Federal) começou, o presidente Temer telefonou ao Lamachia (Claudio, presidente da OAB Nacional), pedindo a ele que oportunizasse ao seu advogado fazer a defesa no Plenário, o que aconteceu; ele (o advogado) entrou com uma Preliminar, só, e alegou que o ministro Édson Fachin (do STF) estava mandando a gravação à Polícia Federal, para que fosse periciada, providência essa, aliás, que o STF deveria ter adotado antes de qualquer coisa, antes da homologação da delação (dos donos da JBS)”.

Diante desse fato novo, ainda de acordo com Helder, a bancada do Amapá decidiu pelo voto contrário ao pedido de impeachment naquele momento, para que o presidente Temer pudesse exercer o direito de defesa e contraditório: “Em seguida começamos a discutir, e nós do Amapá, abrimos divergência, pedindo prazo para que a defesa se manifestasse; ora, a OAB, que luta sempre por direitos, pelo exercício da ampla defesa e contraditório teria que reconhecer esse direito da defesa do Temer, concedendo um prazo mínimo de 72 horas, o que foi, inclusive, também, sugerido pelo diretor adjunto e pelo secretário geral da OAB; como não houve concordância de se conceder esse prazo, apoiados por outros conselheiros, que só não votaram a favor porque suas respectivas bancadas já haviam deliberado, por maioria, pelo pedido de abertura do processo, mas por coerência, decidimos manter a nossa postura para não haver contradição, e votamos contrariamente ao pedido não porque somos contra o impeachment, pelo contrário, nós somos a favor do impeachment pelo tudo, pelo conjunto da obra; entretanto, e isso é importante ressaltar, nós fomos contra, sim, a não garantia do direito de defesa e contraditório”.

Na opinião de Campello, não haverá abertura de processo de impeachment contra Michel Temer: “Com toda a sinceridade eu digo que não haverá processo de impeachment, porque o TSE vai julgar a ação que pede a cassação da chapa Dilma-Temer no dia 6 de junho e, se a chapa for cassada, haverá eleição indireta; há também a possibilidade de desmembramento da chapa e, se isso ocorrer, e caso o Temer se fortaleça dificilmente o Rodrigo Maia (presidente da Câmara dos Deputados), que é amigo do presidente, vai abrir o processo de impeachment”.

Lobby do Palácio do Planalto
Indagado se houve lobby de pessoas ligadas ao Palácio do Planalto para que os conselheiros do Amapá votassem contra o pedido de abertura do processo de impeachment, Helder Ferreira negou: “Em nenhum momento alguém ligado ao Temer fez lobby, e eu jamais aceitaria ser influenciado por quem quer que seja, tanto que o próprio presidente da OAB, o doutor Claudio Lamachia não pediu; um colega (de outro estado) pediu para desistirmos da divergência, mas não abrimos mão por termos convicção de que o Conselho Federal deveria dar mais um tempo para que tivéssemos condições de maneira mais legitima e segura para deliberarmos sobre o pedido”.

Quanto a uma prévia deliberação do Conselho Seccional do Amapá no sentido de aprovar o pedido, Helder Ferreira também negou: “O Conselho Seccional não chegou a deliberar; na realidade não houve tempo, foi tudo muito rápido; porém, se o Conselho Seccional tivesse decidido nesse sentido, por mais que discordássemos, nós obviamente deveríamos acompanhar; o que houve foi uma conversa informal prévia entre conselheiros; eu mesmo e  o Alessandro (Brito, também conselheiro federal) conversamos com o presidente Paulo Campelo e manifestamos que votaríamos a favor (do pedido), mas na hora houve o pedido para dar prazo para a defesa do Temer apresentar prova, principalmente a pericial, e entendemos que a OAB deveria obedecer as regras mínimas constitucionais, pelo menos a do contraditório e ampla defesa”.

“Afronta à Constituição”
No entendimento de Helder Ferreira, o clamor das ruas pedindo eleições diretas é ilegal: “Eleições diretas agora seria uma afronta à Constituição Federal; isso está sendo muito discutido no âmbito da OAB e há uma polemica muito grande; há a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) em trâmite no Congresso Nacional nesse sentido, mas nós entendemos que a solução dos nossos problemas nacionais tem que passar pela Constituição; e aprovar essa PEC agora é casuísmo; tem muitos a favor, outros contra; mas aprovar essa PEC seria muito perigoso, porque daqui a um ano haverá eleição direta para Presidente, com um prazo muito exíguo para um pleito para um mandato tampão, com a necessidade de tempo para preparação das chapas, registros de candidaturas, propagando gratuita, enfim, trata-se de um processo longo, e sou contra isso; tem que obedecer a Constituição, com a realização de eleição indireta dentro do Congresso Nacional; é a regra; juridicamente, por exemplo, não se pode mudar a legislação penal toda vez ocorre um fato criminal; tudo tem que ser dentro do devido processo legal legislativo”, comparou.

Também questionado se há necessidade de laudo pericial para abertura de processo em se tratando de apuração de crime de responsabilidade, Helder Ferreira lembrou que, nesse caso, tem que se apontar a tipificação penal da conduta do presidente:

– Antes de ser decisão política, essa decisão tem que ser jurídica, isto é, tem que haver tipificação da conduta do presidente Temer para caracterizar o crime de responsabilidade; no caso da então presidente Dilma houve essa tipificação, mais especificamente com base na Lei de Responsabilidade Fiscal; eu não sou a favor de Dilma ou Temer, mas sim da legalidade; e essa tipificação, no caso do Temer, não foi caracterizada; a delação (da JBS) tem que ser revista; a sociedade não concorda com os termos dessa delação, inclusive, conforme a imprensa nacional divulgou amplamente, o ministro Gilmar Mendes já pediu que o Pleno (do STF) decida sobre essa delação; essa foi a nossa razão para a OAB não entrar no mérito, isto é, se houve ou não crime de responsabilidade – finalizou.


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