Cidades

Garimpeiros reclamam de discriminação e pedem mais respeito das instituições

No dia em que homenageia a categoria, profissionais reivindicam garantia à legalidade para trabalhar no Amapá, que tem a 3ª maior concentração de riquezas minerais do país


Hoje, 21 de julho, é o Dia Nacional do Garimpeiro. No Amapá, entretanto, que é o 3º estado brasileiro de concentração de recursos minerais a categoria não tem muito a comemorar. O presidente da Cooperativa de Garimpeiros (Coemap), Francisco Nogueira, o Chico Nogueira, que é um dos pioneiros na exploração contemporânea de ouro do estado, afirmou na manhã desta sexta-feira (21) no programa LuizMeloEntrevista (DiárioFM 90.9) que, apesar da grande contribuição do setor para a economia os pequenos garimpeiros ainda são discriminados e “olhados como bandidos” por parte dos órgãos de regulamentação da exploração do minério.

“Nós realmente não temos muito a comemorar por causa do tratamento cruel e desumano que recebemos por parte de quem tem a obrigação de priorizar o nosso trabalho, de facilitar o acesso à legalidade, e por isso em alusão à data estamos fazendo uma grande programação a partir das 18h no Centro de Convenções João Batista de Azevedo Picanço, na Avenida FAB, que terá a participação maciça dos garimpeiros, seus familiares, de setores representativos da sociedade e, espero, de autoridades do governo, principalmente dos órgãos responsáveis pela regulamentação da produção mineral”, conclamou.

De acordo com Chico Nogueira, os pequenos garimpeiros precisam de apoio para exercer suas atividades com dignidade: “O pequeno garimpeiro no Amapá está precisando muito de apoio das autoridades, principalmente no que diz respeito aos licenciamentos ambientais, porque nós temos condições de ajudar o Amapá a sair da crise nesse momento de turbulência na economia brasileira; a garimpagem é uma saída, e se tivermos esse apoio, se formos olhados com mais respeito, é claro, sem deixar de se apoiar as grandes mineradoras, poderemos contribuir de forma muito impactante para melhorar vida das pessoas que moram aqui; mas infelizmente o garimpeiro de pequeno porte enfrenta diversas dificuldades para se legalizar, e grande parte das áreas garimpáveis não está acessível porque foram e são requeridas por especuladores, que poderia estar servindo aos garimpeiros e ao Amapá, produzindo riquezas”.

Perguntado sobre que espécie mineral incide em maior quantidade no estado, Chico Nogueira respondeu que a maior concentração é de ouro, cassiterita e tantalita, que ocorre em pelo menos 10 dos 16 municípios amapaenses, mas disse que há outros minérios em abundância, cuja exploração, entretanto, é dificultada: “Temos muitas áreas que possuem diamantes, porém a exploração é mais difícil; a garimpagem do ouro tem o acesso mais facilitado e gera riquezas mais rapidamente. Essa exploração, no entanto, poderia ser em maior quantidade, gerando divisas para o estado, mas infelizmente as grandes mineradoras são as mais beneficiadas, e acabam levando nossas riquezas para outros países, o que, aliás, sempre ocorreu, com a usurpação do nosso minério ocorrendo desde os primórdios da nossa colonização”.
 
Otimismo
Apesar das dificuldades, o presidente da Coemap se diz otimista para o futuro, mas lembra que é fundamental o apoio do governo para a exploração: “Além de 10 municípios que comprovadamente possuem minérios em abundância, temos a Renka (Reserva Nacional de Cobre) que será extinta, faltando apenas o presidente da República assinar o decreto que libera a mineração na região, que abrange o Amapá e o Pará, e que possui a maior reserva mineral do mundo; pra que se tenha ideia do desperdício, a atividade garimpeira lá é muito intensa, mesmo com a proibição, resultando na saída ilegal do minério desses estados e do Brasil sem o pagamento de um só centavo de impostos; por isso é preciso facilitar o acesso dos pequenos garimpeiros à legalidade, porque o garimpeiro precisa ser olhado pelas instituições como se olha uma preciosidade, sendo necessário que a sociedade passe a identificar a joia que é o garimpeiro”.

Questionado sobre quem mais levou ouro do Amapá, Chico Nogueira não quis arriscar, mas garantiu que a evasão clandestina é muito grande: “Não posso dizer, não tenho como avaliar, mas muitas pessoas de fora do país já levaram muito ouro daqui; a gente continua aceitando, a gente respeita as grandes mineradoras, não quero entrar no mérito das empresas, mas é preciso garantir os direitos dos garimpeiros para que possamos trabalhar na legalidade, porque sem o preconceito que sofremos poderemos ajudar o Amapá a superar as muitas dificuldades financeiras que enfrenta”.
Nas contas do presidente da Coemap o Amapá possui atualmente mais de 10 mil garimpeiros em atividades, a maioria trabalhando de forma clandestina: “Em todo o estado temos seguramente bem mais de 10 mil garimpeiros; só no Lourenço (Distrito do município de Calçoene) são cerca de 6 mil homens trabalhando; infelizmente, porém, apenas um pequeno percentual trabalha de forma legal justamente por causa das dificuldades que os órgãos impõem para o licenciamento, sem levarem em conta que nós, os garimpeiros de pequeno porte, também podemos pagar impostos como as empresas fazem, mas com o diferencial que, além dos impostos, o dinheiro da venda do ouro circula aqui mesmo no Amapá, ao contrário das grandes empresas que levam junto com o ouro o dinheiro de sua venda para outros países”.
“Prospecção centrífuga”
Acionado por telefone pela bancada do programa, o geólogo Antônio Feijão, um dos mais conceituados especialistas na área de mineração do país, elogiou o trabalho que vem sendo realizado por Chico Nogueira e reconheceu as dificuldades enfrentadas pelos pequenos garimpeiros para exercerem as suas atividades, destacando que, apesar de serem eles os primeiros que chegam às áreas de garimpos, abrindo o caminho para as grandes mineradoras, não são reconhecidos e respeitados.

“São muitos os homens que já passaram por aqui, alguns já foram, outros permanecem, como o Chico Nogueira, o Raimundo do Vale e o Zé Arara, para citar só alguns; é o pequeno garimpeiro que acha minério, e por isso se tornou uma espécie de ‘cão caçador’ de minérios em favor das grandes mineradores, tanto que eu criei a expressão técnica ‘prospecção centrífuga’; aqui infelizmente há uma inversão de valores muito acentuada, acabando por se legitimar um procedimento desumano, ao contrário dos Estados Unidos, por exemplo, em que o dono do minério é quem o acha, quem o detém; já no Brasil, os pequenos garimpeiros, que sempre emprestaram a própria vida para aumentar o país, para expandir as fronteiras da Amazônia são criminalizados”, protestou.

Ex-deputado federal pelo Amapá, Antônio Feijão não poupa críticas aos órgãos responsáveis pelo licenciamento da atividade garimpeira: “Eu denunciei a Bethlem (grande mineradora norte-americana que explora minérios no Amapá) que pegou 5 toneladas de ouro de forma usurpatória no Amapá; eu denunciei na Polícia Federal, no Ministério Público, na Procissão de Nazaré, na Marcha para Jesus (brincou), enfim, denunciei pra todos os órgãos responsáveis, mas não aconteceu nada; depois foram lá no Antônio Lins (garimpeiro), pegaram 18 kg de ouro e fizeram o maior escarcéu; tratam o garimpeiro como bandido!”.

Para Antônio Feijão, as dificuldades impostas pelos órgãos responsáveis inviabilizam a atividade: “Há que se criar um equilíbrio porque sem os garimpeiros não teríamos domínio mineral. Eu ajudei em 2002 a criar a lei que descriminalizou o transporte, bastando que a pessoa apresente o título da lavra garimpeira, mas o problema maior é a dificuldade impostas para a concessão de licenças, tanto que é mais fácil você montar uma loja do céu no inferno do que garimpeiro ter a PLG (Permissão de Lavra Garimpeira”, lamentou o especialista.

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