Entrevista

“Nós estamos num trabalho de manter viva a memória do doutor Antunes”

Executivos são tidos como pessoas frias, pragmáticos por resultados, mas este senhor com mais de 80 anos veio a Macapá para se emocionar. Trata-se de Américo Muniz, ex-braço direito de Augusto Antunes, fundador da mineradora Icomi e de um império empresarial chamado Grupo Caemi. Ele mantém os laços de amizade com ex colegas de trabalho no Amapá e fala do esforço de ex funcionários e parceiros de Antunes para manter viva a memória e o legado de um dos principais empresários brasileiros em toda a história. Muniz fala do filme biográfico sobre Augusto Antunes, uma joia que reúne imagens raras do Amapá dos anos 40, 50, 60 e 70. Acompanhe.


Diário do Amapá – A sua volta ao Amapá depois de muitos anos foi para o lançamento do filme biográfico sobre o fundador da Icomi S.A. o empresário Augusto Antunes. O que ficou depois daquela mobilização pela memória dele?
Américo Muniz – Foi uma experiência, e eu já tenho muitos anos de vida, uma experiência ímpar na minha vida, pois eu sempre gostei demais da Icomi e sempre tive uma admiração muito grande pelo doutor Antunes e fiquei estupefato, digamos assim, com o amor que esse povo do Amapá dedica ao doutor Antunes, porque de uma forma ou de outra alguém é neto ou bisneto, ou filho, ou trabalhou na Icomi e todos tem um respeito muito grande pela figura do doutor Antunes.

Diário – E sobre o que agregou a tudo isso a participação da Assembleia Legislativa, que criou uma data comemorativa e uma comenda com o nome de Antunes isso superou as suas expectativas?
Américo – Ficou muito além das expectativas, porque nós estamos num trabalho de manter viva a memória do doutor Antunes. Já houve um livro e agora houve um documentário, então essa instituição do Dia do Manganês e a criação da Comenda agregaram coisa que a gente nunca esperava que fosse acontecer essa manutenção da memória do doutor Antunes.

Diário – Foi nesse sentido que um grupo de ex-funcionários, ex-executivos, enfim, mas assistidos pela fundação Caemi decidiu criar o documentário?
Américo – Foi nesse sentido. Nós criamos o livro e o documentário. Agora está enriquecido com o Dia do Manganês e com a Comenda. Temos ainda uma outra ideia em mente que é a criação de um prêmio de mineração Augusto Antunes que a gente está desenvolvendo com o Ibram [Instituto Brasileiro de Mineração] e aí seria a nível nacional ou para estudantes de nível superior. A gente tem esperança de que isso aconteça ainda, porém o que já aconteceu aqui, com a Assembleia Legislativa, que é um dos Poderes do Estado foi impressionante.

Diário – Do contato pessoal que o senhor tinha com Augusto Antunes o que era mais preponderante?
Américo – A seriedade dele em tudo o que ele fazia. Eu disse no meu discurso na Assembleia que a gente aprendeu com ele a respeitar a lei e ai de quem não respeitasse a lei na nossa empresa. Ele sempre dizia: “Enquanto a lei for lei tem que ser respeitada. A gente pode até lutar para mudar a lei, mas enquanto ela for lei ninguém pode desrespeitar”. Foram ensinamentos que ficou para a nossa vida toda.

Diário – A gente sabe que ele era um empresário muito bem sucedido, um homem à frente de seu tempo, mas em particular com relação a Icomi e o Amapá, o senhor diria que ele tinha um envolvimento também afetivo com esse projeto?
Américo – Ele tinha toda ligação sentimental. Porque foi aqui que começou tudo. Ele começou em Minas Gerais, mas foi aqui no Amapá, Serra do Navio, manganês que deu início a, vamos dizer assim, eu não gosto de falar essa palavra, mas enfim, deu início ao império dele. E ele tinha um carinho muito especial pelo Amapá, tanto que ele tentou de todos os jeitos o desenvolvimento do Amapá através do IRDA, através da COPRAM, através da AMCEL, através da CODEPA, enfim, através de várias iniciativas ainda no Território e depois no Estado para desenvolver o Amapá.

Diário – Já que o senhor falou e muitos jornalistas se referem às empresas dele como um império, para que todos possam entender o tamanho desse conglomerado de empresas elas representavam o que exatamente?
Américo – Olha, a dimensão eu não saberia dizer, mas eu posso dizer que nesse grupo de empresas do Grupo Caemi tinha a Icomi, com mineração de manganês, tinha a MBR, uma empresa também muito importante também em mineração de ferro de Minas Gerais, tinha também a Aços Anhanguera, de aços especiais, tinha a Swift-Armour onde eu fui diretor, que foi uma empresa adquirida já funcionando, tinha a AMCEL, tinha a CAEMI Cummis, com motores e por aí adiante. Houve com a Anglo American iniciativas em Goiás para pesquisas de diamantes, houve uma pesquisa forte de ouro na Bahia, em Jacobina,então o Grupo Caemi era realmente muito diversificado.

Diário – Bem, a única filha dele viva é dona Beatriz, então coube aos netos a missão de tocar os negócios e a gente tem notícia de que as empresas do Grupo Caemi já não existem, foram vendidas, é isso?
Américo – Ele foi incorporado pela Vale do Rio Doce.

Diário – E a Fundação Caemi, outra iniciativa considerada de vanguarda de Augusto Antunes, para garantir uma qualidade de vida a seus empregados na aposentadoria, ela ainda permanece pagando a complementação dos beneficiários?
Américo – A Fundação Caemi vai acabar proximamente, mas o Plano de Suplementação de Aposentadoria e Pensão foi passado para a Bradesco Vida e previdência. Hoje todos nós que fomos aposentados pela Fundação Caemi estamos recebendo nossos benefícios pela Bradesco Vida e Previdência, que é uma entidade aberta e que tem uma duração prevista muito maior que qualquer empresa privada, foi uma negociação. O plano foi clonado exatamente como era e a Bradesco Vida e Previdência vem mantendo isso religiosamente. O pagamento era feito no penúltimo dia do mês e continua sendo assim, havia duas correções anuais do benefício, em março e em setembro, o que também continua sendo feito. O plano foi realmente uma sorte para nós que tenha sido negociado tão bem com a Bradesco Vida e Previdência.

Diário – O senhor chegou a declarar aqui durante sua estada de que ainda havia uma coisa a ser feita, com a construção ou organização de um museu, do manganês ou de Augusto Antunes. O que o senhor pensa em termos de formatar isso, como as pessoas poderiam dar contribuições, fazer doações, afinal há tanto acervo disperso por aí, com bens materiais como uma velha lanterna dos guarda-freios da velha Estrada de Ferro que o senhor guarda com carinho lá no Rio…
Américo – [Risos] Olha, isso não será uma iniciativa nossa porque a criação de um museu me parece mais uma atribuição do poder público. Acho que caberia no Amapá um museu do manganês ou um museu da mineração, onde a gente conseguisse juntar tudo o que ainda existe e ainda não está destruído dos primórdios da empresa, da história do manganês e da história desse estado, porque o estado virou estado graças ao desenvolvimento que aconteceu a partir do manganês. E tudo que nós temos lá na Associação nós criamos um espaço para a Caemi, pois como a nossa Associação é uma associação que tende a zero, um grupo fechado que a cada ano vai envelhecendo cada vez mais, a gente poderia destinar para o museu,como contribuição, e tenho certeza de que todos aqueles empregados que tem alguma recordação da Icomi e do seu começo, gostariam de deixar isso no museu.

Diário – Por falar nisso quem são essas pessoas e qual é a faixa etária delas?
Américo – São quase 800 associados, temos 36 com mais de 90 anos, 180 entre 80 e 89, eu estou nesse meio aí [mais risos]; temos quatrocentos e poucos entre 70 e 79 anos e outros com menos idade, crianças ainda…

Diário – E se reúnem periodicamente?
Américo – A gente sempre tem alguns grupos que se reúnem, pois a Sede da Associação a gente chama de “ponto de encontro”, então sempre que alguém vai ao Rio sempre a gente recebe lá, gosta muito, tira fotos, sai no jornalzinho que publicamos a cada quatro meses.

Diário – Obrigado pela entrevista.
Américo – Obrigado a você.

 

Perfil..

Entrevistado. Américo Muniz Goulart Simas, 80, é natural de Açoures (Portugal), chegou ao Brasil em 1940, com os pais que migraram para o Rio de Janeiro, o pai mecânico e a mãe costureira. Estudou no tradicional Colégio Pedro II e depois se bacharelou em Direito pela Universidade Cândido Mendes. Começou a trabalhar aos 14 anos na Construtora Humberto Menescal, uma das construtoras do Estádio Maracanã; Fez especializações em Gerência Geral, Recrutamento e Seleção, Vilas em Áreas Remotas, todos pela PUC-Rio. Depois num intervalo de um emprego e outro, em 1963, casou-se com dona Idamar e teve um casal de filhos. Trabalhou na Indústria Química CIBA até ser aprovado em processo seletivo para vir para a Icomi, no Amapá.


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