Dom Pedro Conti

Por que corre?


O Mestre olhava da sua janela para a praça do mercado e viu um dos seus alunos, um tal de Haikel, que cami nhava rapidamente, todo atarefado. Chamou-o e o convidou para conversar com ele.
– Haikel, você viu o céu esta manhã?
– Não, Mestre.
– E a rua, Haikel? A rua, você a viu hoje pela manhã?
– Sim, Mestre.
– E a está vendo ainda?
– Sim, Mestre, a vejo ainda.
– Me diga o que está vendo.
– Pessoas, cavalos, carroças, mercadores que se agitam, camponeses que vão e vêm, eis o que estou vendo.
– Haikel, Haikel – o repreendeu amorosamente o Mestre – daqui a cinquenta anos, daqui a duas ve zes cinquenta anos, ainda haverá uma rua como esta e outro mercado semelhante a este. Outras carroças trarão outros mercadores para comprar e vender outros cavalos. Mas eu não estarei mais aqui, você não estará mais aqui. Então, eu lhe pergunto, Haikel: por que corre tanto se não tem tempo nem de olhar para o céu?

Com este domingo, retomamos o tempo litúrgico chamado “Comum”. Iremos até o Tempo de Ad vento. Também nos acompanhará o evangelho de Lucas. Jesus, antes de tomar “a firme decisão de partir para Jerusalém” (Lc 9,51), onde enfrentará os adversários e sofrerá a paixão e a morte, faz duas perguntas aos discípulos. Primeiro quer saber quem o povo diz que ele é e, depois de ter ouvido as respostas, diz: – E vós, quem dizeis que eu sou? A resposta de Pedro é acertada: “O Cristo de Deus”. Só que o “ungido” (Cristo) da cabeça de Pedro, talvez, não era bem o que, de fato, Jesus era. Por isso, ele começa a falar de sofrimentos, da rejeição, da morte e da ressurreição. Tudo ainda era muito novo e difícil de ser compreendido pelos apóstolos. Só para eles? Ou, depois de tantos anos, também para nós hoje? De fato, reconhecer quem é Jesus, de verdade, é se mpre algo desafiador. Para todos, tem uma primeira vez na qual ouvimos falar dele. De muitas formas e por pessoas diferentes. Alguns podem falar bem e mostrar entusiasmo com Jesus, outros podem nos dizer, simplesmente, que é bobagem, lorota de poucos iludidos, coisa de tempos que já se foram. Alguns parecem honestos e sinceros, outros nos dão a impressão de usar o nome dele só para melhorar de vida e conseguir os seus interesses.

A pessoa de Jesus continua a dar um sentido à vida de muitos e a ser uma provocação para tod os aqueles e aquelas que não se satisfazem com respostas superficiais ou, simplesmente, seguem as modas ou o que consideram o pensamento da maioria. Jesus nunca se preocupou com isso; ele continua a querer saber quem ele é para todos e, sobretudo, para cada um. Ele não faz isso para nos incomodar, mas, ao contrário, para nos ajudar a não perder o horizonte da vida. Com efeito, o questionamento sobre Jesus vai junto com as demais grandes perguntas da vida: quem somos? de onde viemos? para onde vamos? Qual o sentido da vida, da morte, do amar e do sofrer? Quem, afinal, conhece o bem e o mal? Existe um caminho certo para a felicidade? Nenhum ser humano, que não queira deixar passar a vida à sua frente, escapa destas questões. A ninguém basta saber se Deus existe ou não, ou se aquieta com alguma resposta já pronta. O desafio é encontrar a nossa resposta, pessoal, única como único &e acute; cada um de nós, e irrepetível é o caminho que trilhamos na nossa existência, no tempo desta vida que passa. No fundo, “a cruz” que cada um carrega vem da incerteza e das limitações de sermos criaturas. Jesus não veio para impor doutrinas, leis ou normas. Simplesmente veio para nos dizer para não termos medo, que “o desconhecido” está ao nosso alcance e que Deus é Amor, é um Pai bondoso e amorosos, que a vida é um dom que deve ser vivido para amar e sermos amados, para sermos felizes e fazermos felizes os irmãos, que encontramos pelos caminhos da existência. O grande sentido da vida não está no sucesso individual, mas no bem que sabemos semear e cultivar. Já acontecia antes de Jesus, mas com ele, de uma maneira única e definitiva, o céu se tornou muito mais perto. Com ele, o horizonte da nossa vida vai além da s estrelas e das galáxias, alcança a eternidade, alcança Deus. Vale a pena parar, levantar mais os nossos olhos. Das ruas para os céus. Só para conhecer e amar mais o Nosso Pai.