Nilson Montoril

A estrada de ferro que enferrujou


No inicio das atividades da Indústria e Comércio de Minérios S.A.- ICOMI, em Serra do Navio, o Rio Amapari era a via fluvial usada por quem, partindo de Porto Platon, pretendia alcançar aquela região onde estavam as jazidas de manganês. Antes da chegada da mineradora, faiscadores de ouro e pequenos comerciantes usavam a citada rota. O registro da existência do minério de manganês tinha sido realizado pelo geólogo Josalfredo Borges, em 1934. Em 1946, quando os trabalhos de instalação do governo do Território Federal do Amapá, do qual era o governador, o capitão Janary Gentil Nunes conclamou os cidadãos que atuavam em áreas de exploração mineral, a fornecer ao executivo, amostras de pedras com características de minerais. Um dos freqüentes usuários do rio Amapari, Mário Cruz, dono de uma ubá impulsionada por motor de popa archimedes de 12 HP, que mantinha em sua casa, na cidade de Belém, algumas pedras escuras, as quais ele imaginava serem ferro, transportou-as para Macapá e as apresentou à Divisão de Produção e Pesquisa.

O geólogo alemão Frits Louis Archerman, que prestava serviços ao governo territorial, logo identificou como manganês. Outras amostras confirmaram a existência de ferro, tantalita, estanho e cassiterita. Mediante concessão do governo brasileiro, a ICOMI deu inicio a implantação de uma soberba infra-estrutura operacional para extrair e vender o manganês. A logística da empresa também foi magistral no tratamento de seus funcionários. Tudo que a ICOMI precisou levar para Serra do Navio saia do Porto de Santana, por via rodoviária até Porto Platon. A seqüência da viagem ocorria com o uso de pequenas embarcações, que também traziam amostras de minérios. Posteriormente, a empresa usou uma balsa de ferro e nela transportou as primeiras toneladas de manganês, da vila Santa Terezinha para Porto Platon. Em caçambas, o minério foi transferido para a área onde surgiria o píer e o cais da companhia, em Santana. Isso continuou acontecendo até entrar em operação a Estrada de Ferro do Amapá.
A construção foi iniciada em janeiro de 1954 e inaugurada em 5/1/1957. “Para a construção de suas instalações no Amapá, a ICOMI obteve um crédito no Eximbank, de Washington, de US4 67.500.000,00(sessenta e sete milhões e quinhentos mil dólares), a juros de 4-1/2%(quatro e meio por cento), para financiamento das importações de materiais e pagamento das despesas de construção no Brasil. Deste total,posto à disposição da empresa, foram dispendidos apenas, em números redondos, 55 milhões de dólares”. A extensão da linha principal é de 193,594 km, acrescido de 12,832 km das linhas correspondentes aos pátios de manobras e desvios, perfazendo o total de 206,426 km. Cada quilômetros tem 1.765 dormentes. Em toda a extensão da linha há cerca de 368.679 dormentes. Na fase mais operosa da ICOMI, deslizaram sobre os trilhos da Estrada de Ferro do Amapá nove locomotivas: três GM Diesel Elétricas, modelo 1200 SW , uma modelo 1500 SW e quatro GE C 30-7. A empresa dispunha de 80 vagões para transporte de minérios com capacidade de 70 toneladas cada. Em 1997, a ICOMI encerrou suas atividades com a exploração de manganês. Em 1998, retirou-se do Amapá. Os bens que ela deixou, na forma do contrato de concessão que lhe foi feito pelo Governo Federal, eles passaram a pertencer ao Governo do Estado do Amapá. Foi quando a desdita se abateu sobre a ferrovia.

A gestão estadual não conseguiu manter as composições operando com a mesma competência revelada pela ICOMI. Surgiram três empresas, que também se revelaram tremendos fiascos: MMX(2006), Anglo American (2008) e a Zanim (2013). Esta última ainda foi contemplada da concessão da Estrada de Ferro, mas não deu conta do recado. Segundo registros disponíveis nas redes sociais dão conta de que, no dia 15 de dezembro de 2014, o trem de carga circulou pela última vez, entre Serra do Navio e o Porto de Santana. No ano posterior foi a vez do trem puxando vagões com passageiros. A partir de então, toda a estrutura existente nos 206,426 quilômetros vem sendo saqueada. Em 2017, através de um relatório, a SETRAP afirma, que as áreas de segurança perto dos trilhos estão sendo invadida. As ocorrências foram registradas na Polícia, mas nada de prático poderá acontecer sem a intervenção judicial. Muita coisa já foi surrupiada e levada para fora do Estado.