Nilson Montoril

Macapá, hostilidades e revanchismos – II


Na noite de 18 de setembro de 1898, tendo como local o Teatro Nossa Senhora da Paz, o Partido Republicano Paraense ofereceu um banquete a seus filiados, membros da imprensa e pessoas gradas da comunidade, para lançar a candidatura de Justo Leite Chermont ao governo do Estado do Pará. A idéia partiu do Dr. Paes de Carvalho e contou com a aceitação dos principais lideres da referida associação política, notadamente do maranhense Antônio José de Lemos, que então exercia o cargo de Intendente Municipal de Belém. Por volta das 23 horas do dia acima mencionado, quando o jantar já havia terminado, o Intendente fez uso da palavra afirmando que o senhor Justo Chermont seria o candidato do PRP no pleito que iria acontecer no dia 15 de novembro de 1900. A 22 de junho de 1899, Antonio lemos reelegeu-se intendente de Belém.
Nessa oportunidade, Justo Chermont exercia o cargo de Senador da República, no rio de janeiro e Augusto Montenegro era Deputado Federal. Próximo à eleição deu-se um que deixou os paraenses perplexos: Antônio Lemos ignorou Justo Chermont e lançou a candidatura de Augusto Montenegro. Ora, Justo Chermont sendo sócio de Lemos no Jornal “A Província do Pará” e em outras atividades comerciais parecia ser a pessoa mais credenciada para contar com o apoio do Intendente. Entretanto, Justo Chermont tinha personalidade forte e jamais se deixaria levar pelos arroubos autoritários de Lemos. Consta que o mote da atitude de Lemos foi a animosidade que ele mantinha com Pedro Chermont e o cumprimento de uma promessa que fizera ao Dr. Joaquim José Assis, seu protetor no jornal “A Província do Pará” para vingar-se de Justo Chermont, do qual o Dr. Assis era sogro.

O pedido de vingança teria sido feito no leito de morte do Dr. Assis porque Justo Chermont o prejudicou financeiramente. Entre os delegados municipais do PRP, figuravam Augusto Montenegro como representante de Macapá e João Gualberto da Costa por Mazagão Os dois municípios pertenciam ao Pará e a sede de Mazagão ainda era o atual Mazagão Velho. Ambos viviam em Belém e nunca visitaram os municípios que representavam. No dia 15 de setembro de 1890, em seção realizada as 19h30, 36 delegados de PRP votaram para escolher os candidatos do partido na eleição de 1900. Augusto Montenegro obteve 35 votos, Geminiano de Lyra Castro, 32 e Fulgêncio Simões 2. Consequentemente a chapa seria formada por Montenegro e Geminiano. Nessa época votava-se no titular e no vice. Em Macapá, o Intendente Theodoro Mendes manifestou-se por Geminiano como candidato a vice-governador e Justo Chermont para governador. Acontece que Justo Chermont integrava o Partido Federal, sua candidatura fora lançada no dia 21 de outubro de 1899 e divulgada no jornal “A República”. Seu companheiro de chapa era Firmo José da Costa Braga.

O pleito transcorreu num clima de muita violência, principalmente no interior do Estado do Pará, fato que levou muita gente a não comparecer às seções eleitorais. Muitos eleitores votaram no PRP com medo de sofrer represálias. Mesmo contando com o apoio político de Lauro Sodré, os candidatos do Partido Federal foram fragorosamente derrotados. Concluída a apuração, a 27 de janeiro de 1901, Augusto Montenegro obteve 35.525 votos e Justo Chermont não foi além de 8.431 votos. O candidato à vice pelo PRP, Geminiano Lyra teve mais votos do que Augusto Montenegro: 33.545.
O vice de Chermont, senhor Firmo Braga conseguiu 8.425. Os eleitos tomaram posse no dia 1º de fevereiro, no Congresso Legislativo Estadual, às 9h30. Passado o pleito tudo indicava que a normalidade política se estabeleceria no Pará. E teria ocorrido não fosse o sentimento de vingança que animava Cipriano José dos Santos, o mais exaltados dos membros do Partido Republicano do Pará. É-lhe atribuída a idéia de destituir do cargo de Intendente de Macapá, Tenente Coronel Manuel Theodoro Mendes. Para por em execução seu plano, Cipriano Santos valeu-se do Capitão da Guarda Nacional Aprígio Peres Nunes, que tinha uma propriedade na região das ilhas fronteiras a Macapá e que à época integrava a jurisdição administrativa desse município. Por influência de Cipriano Santos, o capitão Aprígio tinha sido nomeado Prefeito de Segurança (Delegado de Polícia) e deveria substituir o Coronel Coriolano Jucá. No dia 25 de março de 1901, a bordo de sua canoa a vela “Flor da Bondade”, Aprígio Nunes e 20 dos seus apaziguados desembarcaram em Macapá, fundeando a embarcação no Igarapé do Igapó, próximo a Fortaleza de São José. Veio com ele o Juiz de Direito Substituto, Manuel Buarque da Rocha Pedregulho, que viera substituir o Juiz de Direito Francisco Peregrino dos Santos Tocantins. Estranhando a presença de Nunes e tantos capangas, o negro Pedro Cecílio da Silva, vulgarmente conhecido como Pedro Lazarino, compareceu a uma reunião, à noite, na casa do novo juiz. Ficou sabendo que o movimento tinha como alvo seu compadre Theodoro Mendes. Questionado sobre sua presença na reunião, Pedro Lazarino disse que estava brigado com o Intendente. No desenrolar da reunião, Aprígio Nunes revelou seu plano: tirar da Intendência Theodoro Mendes, mesmo que assassinado. Assim que saiu da reunião, Lazarino foi à casa de Theodoro, mas ele achou que tudo não passava de invencionice. Ainda à noite, Lazarino manteve contato com o Capitão-mor Pompeu Aureliano de Moura e contou o que ouvira na casa de Aprígio. Imediatamente, Pompeu Aureliano recrutou um bom número de soldados da Guarda Nacional e os posicionou próximo ao local da reunião. Misturados no meio do povo sublevado por Lazarino, os soldados desalojaram o grupo de Aprígio Nunes, que respondeu com cerrado tiroteio a noite toda. Aprígio foi informado de que sua canoa tinha sido incendiada e deixou a cidade numa pequena “montaria”.O Juiz Manuel da Rocha Pedregulho, foi apanhado pelos defensores de Theodoro Mendes e colocado com suas filhas e esposa em um chiqueiro. Só não foi morto porque o Coronel Coriolano Jucá, Prefeito de Segurança determinou que os militares regressassem à Fortaleza e o povo se dispersasse. O Dr. Pedregulho e seus familiares foram colocados sob a proteção do Coronel Coriolano e alojados na casa da Professora Cora de Carvalho. No confronto morreram 2 soldados e dois populares.