Pe. Claudio Pighin

Do fundo do abismo, clamo a vós, Senhor!


“Do fundo do abismo, clamo a vós, Senhor; Senhor, ouvi minha oração.” É o início do salmo 129 das Sagradas Escrituras, muito conhecido pela tradição cristã. É um salmo penitencial, bem apreciado pela piedade popular. Palavras que iluminam o caminho dos fiéis para aumentar e reforçar a intimidade com Deus. É também muito usado pela liturgia fúnebre católica. Uma súplica para a vida que somente Deus pode garantir: “Que vossos ouvidos estejam atentos à voz de minha súplica. Se tiverdes em conta nossos pecados, Senhor, Senhor, quem poderá subsistir diante de vós? Mas em vós se encontra o perdão dos pecados, para que, reverentes, vos sirvamos.”

O salmista mostra que quem atrapalha essa intimidade com Deus são os pecados. Por isso, grita para Deus, pedindo perdão. E esta experiência da misericórdia do Senhor lhe permite de se chegar cada vez mais a Ele. Com esta proximidade, surge a questão do serviço e, por isso, a resposta do amor de Deus é retribuído com o serviço. É o amor divino que gera o temor. Nesse sentido, o fiel vai fazer de tudo para não se afastar dessa grande manifestação de existência misericordiosa de Deus. E assim prossegue o hino: “Ponho a minha esperança no Senhor. Minha alma tem confiança em sua palavra. Minha alma espera pelo Senhor, mais ansiosa do que os vigias pela manhã.”

O autor se coloca em primeira pessoa, insistindo na confiança e esperança no Senhor, fazendo alusão à imagem do vigia como exemplo de tudo isso. É essa tenacidade que o pecador convertido se apega: a sua libertação. E o autor do hino proclama assim: “Mais do que os vigias que aguardam a manhã, espere Israel pelo Senhor, porque junto ao Senhor se acha a misericórdia; encontra-se nele copiosa redenção. E ele mesmo há de remir Israel de todas as suas iniquidades.” Proclamação essa que envolve ‘todo Israel’ naquilo que se refere à culpa, à justiça e à redenção.

Como podemos constatar na primeira parte do salmo, o protagonista era o fiel e, no entanto, na parte final, o protagonista é o povo de Israel, o escolhido. Esta passagem do individual para o povo, mostra como a salvação se alcança ao nível comunitário, que hoje nós diríamos ‘eclesialmente’. A fé que o autor desse salmo descreve é a partir da redenção do povo de Israel da escravidão do Egito. Deus que resgata das circunstâncias históricas de opressão pelo faraó do Egito para conduzi-lo para uma terra de libertação. Esse mal histórico agora passa para a libertação do mal interior.

Assim sendo, constata-se como acontecem as virtudes divinas da misericórdia e da redenção. Poderíamos representar tudo isso com o exemplo de um pai quando resgata o filho perdido na escravidão e na miséria. A humanidade reconhece as suas próprias limitações cruéis e, portanto, se apega ao seu Deus para encontrar amor e libertação. O fiel, assim, faz a experiência que o mal pode ameaça-lo, mas não poderá vencê-lo, porque Deus é maior que o mal, os infernos humanos. Perspectivas de vida e não de morte.