Ministro destaca a importância da cultura na economia e diz que prioridade do Minc é popularizar acesso à Lei Rouanet
“A leitura é vital para a formação de indivíduos, para termos pessoas mais capazes, mais sensíveis e com repertório maior”

Em entrevista exclusiva concedida na manhã desta segunda-feira (02) à bancada do programa LuizMeloEntrevista (DiárioFM 90,9), o ministro da Cultura Sérgio Sá Leitão falou sobre o Circuito Cultura Gera Futuro e destacou os incentivos da Lei Rouanet (MinC), que patrocina produções culturais e artísticas com doações de até 6% feitas por empresas e pessoas físicas e do fomento ao audiovisual. Na entrevista, que também teve a participação do deputado federal Vinícius Gurgel (PR), Sá Leitão se mostrou receptivo às propostas de reforma do Teatro das Bacabeiras e à construção de Salas de Cinema em Santana e Laranjal do Jarí.
Luiz Melo: O senhor chegou de madrugada a Macapá e dá a primeira entrevista presencial no Amapá neste programa para o lançamento Circuito Cultura Gera Futuro. Qual é o objetivo desse programa?
Sérgio Sá Leitão: Objetivo é, de um lado, capacitar artistas e produtores para que possam usar melhor os instrumentos de fomento do Ministério da Cultura, que têm várias linhas, começando pela Lei Rouanet, e estamos dando o pontapé inicial no Amapá, fundos para o setorial do audiovisual, temos a Lei do Audiovisual, enfim, uma série de fomentos à cultura para serem utilizados. Nós constatamos que o Amapá foi um dos três estados onde não houve acesso de recursos via Lei Rouanet para projetos culturais em 2017, e nossa idéia é capacitar artistas e produtores culturais para acessarem esses recursos.
Luiz Melo: Não se pode esquecer que andaram também usando indevidamente dinheiro da Lei Rouanet, como em casamentos, bailes…
Sérgio Sá Leitão: Sem dúvida. Eu acho que houve por parte do Ministério da Cultura, em gestões passadas, uma certa negligência, falta de cuidado em relação ao rigor que todos nós devemos ter com o dinheiro publico; mas se considerarmos que a Lei Rouanet já viabilizou a realização de cerca de 51 mil projetos culturais, com R$ 16,5 bilhões aplicados na cultura ao longo de 27 anos, o que tivemos de desvio foi uma pequena parte, uma parte ínfima. E é importante destacar que aquela operação da Polícia Federal, a chamada “Operação Boca Livre, que desbaratou aquela quadrilha que desviava recurso, decorreu justamente do trabalho do Ministério da Cultura quando assumiu as rédeas e passou a tratar de forma republicana e responsável a Lei Rouanet.
Luiz Melo: Logo no início do governo Temer chegou-se a aventar a extinção do Ministério da Cultura e houve forte reação dos artistas, inclusive o senhor era a favor…
Sérgio Sá Leitão: O que eu dizia na época é que o importante na minha visão é a relevância que da política cultural. A minha tese pessoal é que faz mais sentido fomentar políticas e destinar recursos para a área, aproximando mais os municípios, fazer com que o governo federal proporcione de fato o equilíbrio regional, pois há muito desequilíbrio econômico, que o Ministério da Cultura seja do Brasil inteiro, que chegue a todas as regiões, às periferias, não apenas aos centros.
Luiz Melo: Um estudo do Instituto Pró-Livro aponta que 90 milhões de brasileiros não costumam ler. A socialização da leitura com palestras nas escolas estimulando a leitura não seria uma boa arrancada para começar a mudar essa realidade?
Sérgio Sá Leitão: Sem duvida. A leitura é vital para a formação de indivíduos, para termos pessoas mais capazes, mais sensíveis e com repertório maior. É um tema compartilhado com Ministério da Educação, temos várias iniciativas em comum, como o Prêmio Viva Leitura. Mas estudos têm mostrado que cada vez mais há brasileiros lendo, que consumo de livros a cada ano é maior, os brasileiros estão lendo mais. Tivemos por exemplo um incremento de 6% no consumo de livros; e eu não estou falando de livros didáticos, mas em romances, não-ficção, em 2017 em relação a 2016. Nós temos feito um bom trabalho em parceria com o MEC nessa área, que precisamos incrementar cada vez mais.
Luiz Melo: Como o senhor falou em ficção, o PT abriu uma guerra com a Netflix por causa da série “O Mecanismo”, que tem tudo a ver com a Lava Jato, porque mistura ficção e não- ficção. O senhor avalia isso como boicote à plataforma cultural do país?
Sérgio Sá Leitão: O que na realidade eles passaram a fazer, e conseguiram, foi incrementar o marketing da série, despertando curiosidade nas pessoas. A série é muito bem produzida, muito atual, com um tema importantíssimo para o país, que é o combate à corrupção, além de ser uma produção artística de grande nível. Eu recomendo que todo mundo assista; vejo com muito bons olhos a Netflix estar fazendo esse investimento na produção de conteúdos brasileiros. Além dessa, temos outras seis séries nacionais sendo produzidas pela Netflix e a ideia deles é chegar a dez séries por ano em 2020, com recursos financeiros da própria empresa. É um investimento muito significativo que tende a contribuir para o desenvolvimento do audiovisual brasileiro.
Vinícius Gurgel: por que há tanta disparidade na distribuição de recursos da Lei Rounet, que privilegia o Sudeste com quase 80% e apenas 20% contemplam as demais regiões?
Sérgio Sá Leitão: O que acontece é que a Lei Rouanet se baseia na capacidade de contribuição das empresas e pessoas físicas e a Região Sudeste tem um grau de concentração econômica mais significativa, tem mais contribuintes…

Vinícius Gurgel: Mas o que ocorre muito é que empresas exploram na Região Norte, como a Vale do Rio Doce, mas a contribuição para a Lei Rouanet vai para outra regiões…
Sérgio Sá Leitão: Estamos capacitando artistas e produtores culturais para usarem mais a lei e também sensibilizar as empresas a investirem localmente. Achei interessante esse caso citado, isto é, a empresa atuar numa região e usar a lei em outro estado onde está sua sede. Mas nós temos conversado muito com as empresas sobre a necessidade de investirem via Lei Rouanet em projetos nas áreas onde elas atuam. É um processo de convencimento que deve ter a participação das bancadas, governadores e prefeitos, para sensibilizar as empresas e pessoas físicas a investirem localmente. Temos que fazer esse esforço conjunto para diminuir essa concentração de recursos.
Vinicius Gurgel: Fala-se muito da Lei Rouanet, mas pouca gente sabe como funciona. O senhor poderia esclarecer melhor como são captados os recursos?
Sérgio Sá Leitão: A ideia seminário Cultura Gera Futuro é justamente essa, de fazer um detalhamento da lei, e técnicos do Ministério ficam a disposição para esclarecer todas as dúvidas. Os recursos para investimentos em projetos culturais e artísticos são provenientes da contribuição de até 6% do Imposto de Renda de pessoas físicas e de empresas.
Luiz Melo: Por que o senhor comparou Brasília com o seriado “Ilha da Fantasia?
Sérgio Sá Leitão: Porque em Brasília as condições econômicas e sociais são muito distintas do país, às vezes se tem sensação que é uma cidade de Primeiro Mundo, isso no Plano Piloto, não nas Satélites; dá uma visão que está tudo bem no país, mas a realidade do restante do país é diferente. Por isso eu defendo que ministros e membros do governo circulem nos estados para tratar da realidade de cada estado, para entender o sofrimento e a dor do povo para realizar um trabalho ainda melhor para superar as adversidades.
Luiz Melo: Por que o senhor cunhou a frase “não tem bandidos de estimação” quando Dilma estava no governo?
Sérgio Sá Leitão: Porque assistimos no último governo o maior escândalo de corrupção da nossa historia, que deu origem ao Petrolão e à Lava Jato, por exemplo, além de uma gestão desastrosa na economia que levou o Brasil à maior recessão da historia. Eu defendo que pessoas que cometem crimes, erros, têm que ser julgadas e punidas, independentemente de partido e visão ideológica.
Luiz Melo: Qual na sua visão que deve ser o perfil do futuro presidente?
Sérgio Sá Leitão: Que seja um democrata com firme compromisso com a Constituição Federal, com o estado de direito, uma pessoa séria, honesta, dedicada e sensível aos problemas do povo brasileiro; que seja também um liberal, que entenda o da iniciativa privada, respeite o papel da iniciativa privada e se proponha a fazer as reformas que o Brasil precisa; algumas reformas foram feitas pelo presidente Michel Temer, mas há outras, inclusive a reforma do Estado, que é absolutamente necessária, porque é preciso reduzir o Estado, que hoje é muito grande, o que gera um ambiente propício à corrupção. Menos Estado é mais desenvolvimento, mais protagonismo da iniciativa privada e da sociedade civil.
Luiz Melo: Por que restauração de patrimônio histórico leva anos a fio? Em alguns casos viram obras eternamente emperradas e acabam desabando. No Amapá nós temos a Serra do Navio, tombada em 2010 e até hoje não recuperaram nada, iniciaram a restauração do cinema e parou…
Sérgio Sá Leitão: Nós demos um passo gigantesco para corrigir esse problema. Quando entrei no Ministério, em julho do ano passado, eu fiz um diagnóstico e nossa prioridade é resolver esses problemas do passado, liberando recursos para a retomada de projetos paralisados, para dar andamento às obras. Infelizmente a mentalidade no Brasil é sempre começar novas obras e deixar pra trás as que foram iniciadas, mas nossa prioridade é retomar o que foi iniciado. No ano passado nós aplicamos R$ 193 milhões na recuperação de patrimônios. Mas é preciso entender que a demora ocorre porque a restauração tem que ser feita com muito cuidado e rigor. Para restaurar obras antigas tem que usar o mesmo material e o rigor usado na construção. A prioridade é terminar o que está sendo feito, para próxima gestão iniciar novas obras.
Luiz Melo: Aproveito para pedir ao senhor que também dê prioridade a Serra do Navio, uma cidade encravada no meio da floresta, por sua importância histórica para a Região…
Sérgio Sá Leitão: Com certeza!
Vinicius Gurgel: Laranjal do Jarí, município com mais de 50 mil habitantes, não possui um teatro. Também peço ao senhor para dar olhada sobre os teatros no Amapá. O Teatro das Bacabeiras, em Macapá, é muito bonito, mas está numa situação degradante. Além disso, falta para nós Salas de Cinema, que só temos na Capital. Santana, com mais de 130 mil habitantes não tem nenhuma.
Sérgio Sá Leitão: Estamos fazendo grande um grande investimento na construção do Teatro de Santana, que está em fase de conclusão, ao custo total de R$ 6 milhões que foram alocados por meio de uma emenda parlamentar do senador Davi. E relação aos cinemas nós temos agora uma linha dentro do programa de fomento do audiovisual mais flexível, justamente para a construção de cinemas em todo o país. Fico à sua disposição para conversamos e viabilizar esses projetos; tem grande possibilidade de avançarmos nesse sentido.
Luiz Melo: Qual é o papel do Estado em relação à cultura?
Sérgio Sá Leitão: Fomentar, estimular e proteger quando é necessário, mas não é o papel do Estado produzir, que cabe à sociedade civil. Artistas e produtores é que devem fazer a cultura brasileira. É importante destacar que a cultura tem muita relevância para o desenvolvimento econômico, tanto que responde por 2,64% do PIB (Produto Interno Bruto), está entre as 10 maiores atividades econômicas do país, com mais de 1 milhão de empregos, mais de 200 mil empresas e instituições; mais de 10 bilhões e meio de reais na arrecadação de impostos diretos. Atividades culturais e criativas impactam diretamente na geração de emprego e renda, inclusão, geração de valor agregado, arrecadação de impostos, são vocações do povo brasileiro. Por isso temos que entender a cultura também como economia, a política cultural como política de promoção do desenvolvimento econômico. Isso ganha mais relevância porque é um dos vetores do desenvolvimento do país.
Paulo Silva: Como vai funcionar o Núcleo de Produção Digital Equinócio?
Sérgio Sá Leitão: O Núcleo reúne uma série de equipamentos necessários à produção audiovisual, como câmeras, microfones, ilhas de edição e kit de exibição. Por meio desse Núcleo as pessoas vão poder produzir e difundir conteúdos culturais por meio de uma plataforma na internet. Em Macapá o Núcleo foi construído no edifício do Sebrae, com recursos do próprio Ministério da Cultural e está à disposição da população de Macapá como ferramenta para a produção de conteúdos culturais.
Luiz Melo: As redes sociais ajudam mais do que prejudicam?
Sérgio Sá Leitão: As redes sociais simplesmente amplificam. Você não pode culpar as redes sociais pelos problemas que acontecem dentro dela; você não pode culpar uma faca, que é comprada para cortar frutas, por serem usadas para matar uma pessoa. O que as redes sociais fazem é acelerar e amplificar, o que significa que devemos ter mais cuidado no uso de uma faca afiada, para ficar na mesma analogia. Precisamos ter mais cuidado com o uso das redes sociais, mais responsáveis no que dizemos e compartilhamos. Sem esquecer que é graças às redes sociais que nos damos conta de coisas que já existiam e eram invisíveis.
Luiz Melo: Na verdade nós estamos nos preocupando demais com nossa privacidade. Acho que estamos exagerando, apenas precisamos ter mais cuidado…
Sérgio Sá Leitão: Minha política pessoal é: se não quero que alguma coisa seja vista pelos outros, eu não faço.
Deixe seu comentário
Publicidade

