Política

Promotor diz que edital do concurso para a Polícia Civil também poderá ser questionado

Paulo Celso Ramos ajuizou ação civil pública contra concurso da PM por falta de reserva de cotas raciais e deficientes físicos. GEA afirma que soldado militar combatente requer ações perigosas e que adequação representaria risco à segurança dos candidatos


Entrevistado com exclusividade neste sábado no programa Togas&Becas (DiárioFM 90.9), apresentado pelo advogado Helder Carneiro, coadjuvado pelos também advogados Wagner Gomes e Evaldy Mota, o promotor de justiça Paulo Celso Ramos, titular da Promotoria de Direitos Constitucionais afirmou que falta de reserva de cotas em concurso desrespeita a sociedade e advertiu: Se o edital do concurso da Polícia Civil não tiver essa previsão legal, também será alvo de ação civil pública.

O promotor ajuizou nessa sexta-feira (28) ação civil pública pedindo a suspensão do concurso da Polícia Militar (PM-AP) porque o edital não prevê reserva de cotas raciais e para deficientes físicos. Através de Nota, a Procuradoria Geral do Estado (PGE-AP) argumenta que o edital foi elaborado com base no Estatuto da PM e na Constituição Estadual, alegando que a função de soldado militar combatente requer ações ostensivas extremamente perigosas, o que impossibilita a adequação do cargo e representaria risco à segurança dos candidatos com deficiência visual, auditiva ou física.

No início da entrevista Paulo Celso Ramos reclamou de algumas pessoas que, no entendimento dele, por desconhecerem o objetivo do pedido de suspensão do concurso da Polícia Militar do Amapá (PM-AP) têm achincalhado o seu nome nas redes sociais. Ele explica que não é contra a realização do concurso pública, mas, sim, defende o estrito cumprimento da legislação para permitir o acesso pleno da sociedade ao certame.

“O pedido de suspensão do concurso gerou muita polêmica, com muitas pessoas se manifestando a favor e outras contra, inclusive alguns partindo para o campo pessoal, inclusive até me chamaram de jumento, mas quero esclarecer que o Ministério Público tem atuado de forma extremamente responsável ao contrário de muitas criticas; antes de ajuizarmos uma ação nós fazemos todos os levantamentos legais; eu mesmo procuro ter esse cuidado, porque não é só a instituição Ministério Público que está em jogo, como também o meu próprio nome, que foi construído ao longo de mais de 20 anos como promotor de justiça e de 15 anos como professor titular de Direito Constitucional na Unifap, o que me dá embasamento jurídico”.

Questionado sobre a razão do pedido de suspensão quando o certame está em curso, quando poderia ter tomado essa providência antes para evitar prejuízos aos concorrentes, Paulo Celso justificou: “A Promotoria recebeu várias reclamações da sociedade com pedido de providências, e eu não poderia ficar inerte; mas não foi no apagar das luzes; eu estava de férias, retornei na quinta e na sexta-feita eu já estava com a ação protocolada. O objeto da ação não é impedir o concurso principalmente porque esses concursos para a área de segurança foram motivados por ações nossas (do MP); nós temos também atribuição na área de segurança pública; tenho cobrado do estado esse reforço, que só pode ser feito através de concurso; somos o primeiro a querer o concurso, mas não podemos nos calar diante dessa flagrante irregularidade; nossa intenção é apenas suspender o concurso para o estado fazer a readequação legalmente imposta com a inclusão das reservas, e depois reabrir para novas inscrições, com o estado alterando o seu cronograma; eu poderia pedir a nulidade depois de sua realização, mas pensando na economia que pode ser gerada com isso, o correto é consertar agora, no sentido de apenas suspender o concurso para dar oportunidade a essas pessoas que têm o direito de participar do concurso”.

Previsão legal para reserva de cotas no Amapá

Lembrado pela bancada do programa de que o Supremo Tribunal Federal (STF) já decidiu que cota racial só vale para órgãos federais, o que via de consequência a ação civil pública poderia ser indeferida, Paulo Celso contestou: “Realmente houve essa decisão do STF, inclusive também salientou que os demais entes federativos estariam isentos dessa aplicação, mas não é o caso do Amapá porque o estado tem legislação própria que prevê a reserva da cota racial, que é a Lei 1.959, de 4 de dezembro 2015, de autoria da deputada Cristina Almeida, sancionada pelo governador onde reserva 20% de vagas para negros. Eu não estou criando nada. Essa lei está em vigor. Não estou criando nada, mas sim lutando por um direito que foi criado”.

O apresentador do programa revelou ao promotor que ouviu o comentário de alguém dizendo que um cego não poderia trocar tiros com bandidos, daí a impossibilidade de ser policial militar. Paulo Celso retrucou: “Ora, quando se fala em deficiente logo vem a imagem do deficiente visual, do cadeirante, mas deficiente não é só deficiente visual ou cadeirante; são vários os tipos de deficiência; e o acesso ao concurso tem que ser irrestrito, dentro da cota legal, para depois ser aferida se há incompatibilidade ou não para a função; o problema é que confundem acesso com ingresso”.

Perguntado por um ouvinte sobre a diferença entre ‘acesso’ e ‘ingresso’, o promotor de justiça explicou: “A Constituição Federal é clara, os deficientes físicos e, de acordo com a lei em vigor no Amapá, os negros têm um percentual de vagas reservadas; o acesso é irrestrito, tem que garantir a participação de todos no concurso; já o ingresso é outra coisa, é quando vai ter oportunidade de dizer se a deficiência é compatível ou não com o cargo, e sendo poderá o candidato pode ser eliminado; o estatuto militar diz que a aptidão será avaliada através do estágio probatório; então é situação bem distinta; não podemos deixar que essas parcelas fiquem de fora até porque deficiente não significa incapacidade; essa discussão é importante por trazer algo de extrema importância porque enquanto sociedade ainda somos preconceituosos, fazemos discriminação; se está certo ou errado é questão de posicionamento”.

GEA diz que não previsão de cotas é Constitucional

Através de Nota, o Governo do Amapá (GEA) através da Procuradoria Geral do Estado (PGE) afirma que o edital “foi construído de acordo com o que preconiza o Estatuto da Polícia Militar do

Amapá e a Constituição Estadual”, pontuando que a “natureza da ocupação a qual o edital se destina, soldado militar combatente, requer ações ostensivas extremamente perigosas, o que impossibilita a adequação do cargo e representaria risco à segurança dos candidatos com deficiência visual, auditiva ou física”.

A Nota alega que no Brasil o único precedente que trata de vagas para pessoas com deficiência na área policial é do Supremo Tribunal Federal (STF) para os concursos da Polícia Federal (PF), mas pondera que “a decisão do pedido de suspensão não foi aceita, mas, somente, para a adequação do edital para prever quais deficiências são compatíveis com os cargos da PF”.

Quanto à previsão da cota racial, segundo a Nota, “no Estado do Amapá, ainda não existe regulação que assegure a destinação de vagas por cota racial. Quanto à lei federal que trata do assunto, o STF decidiu que esta lei não pode ser utilizada pelos Estados”.


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