Desembargador suspende quebra de sigilo bancário de lotérica que trocava cheques da Assembleia Legislativa
O desembargador João Guilherme Lages Mendes, do Tribunal de Justiça do Amapá (TJAP) recebeu o recurso em efeito suspensivo para sobrestar o cumprimento da decisão agravada até julgamento do mérito.

Paulo Silva
Da Editoria de Política
Julgando agravo de instrumento interposto pela Loteria Trevo da Sorte Ltda, contra decisão de juiz de primeira instância, o desembargador João Guilherme Lages Mendes, do Tribunal de Justiça do Amapá (TJAP) recebeu o recurso em efeito suspensivo para sobrestar o cumprimento da decisão agravada até julgamento do mérito.
A decisão do Juízo da 6ª Vara Cível e de Fazenda Pública da Comarca de Macapá, que atendia pedido do Ministério Público do Amapá (MP-AP), havia determinado a quebra do sigilo bancário de todas as contas correntes, contas de poupança, contas investimento e outros bens, direitos e valores mantidos em instituições financeiras de diversas pessoas físicas e jurídicas envolvendo a agência lotérica que funciona no centro de Macapá. A decisão do desembargador é desta segunda-feira (9/10).
A Trevo da Sorte virou alvo de ação do Ministério Público com a finalidade de apurar eventual prática de ato de improbidade administrativa, decorrente da emissão de cheques pela Assembleia Legislativa do Amapá (ALAP) no período de janeiro de 2012 a maio de 2017, destinados ao pagamento de diárias e de verbas rescisórias de contratos de trabalho.
De acordo com o MP, durante as investigações, apurou-se que centenas de cheques nominais foram depositados por servidores e ex-servidores da ALAP, na conta corrente 003277-4, agência 50658, da Caixa Econômica S/A, alcançando o montante de R$ 956.416,68, pertencentes à empresa lotérica, suscitando a existência de um esquema ilícito de desvio de dinheiro público.
O MP diz que, em razão de Marcell Houat Harb ser irmão do ex-deputado estadual e hoje conselheiro do Tribunal de Contas do Amapá Michel “JK” Houat Harb, existe grande possibilidade de haver um forte esquema de desvio de dinheiro público da Assembleia Legislativa, por meio da emissão de cheques de diárias e de pagamento de verbas rescisórias a servidores e ex-servidores da Assembleia, para, em seguida, serem depositados na conta bancária de empresa pertencente à família do então deputado Michel JK.
Para o advogado da lotérica, a decisão que determinou a quebra do sigilo bancário da empresa não atentou para requisitos do Código de Processo Civil (CPC) e garantias constitucionais bem como para as hipóteses de quebra de sigilo fiscal e bancário da Lei 105/2001, pois o sigilo só pode ser quebrado se houver elementos mínimos que indiquem a existência de autoria e de materialidade delitivas.
Afirmou que a quebra de sigilo é medida excepcional e que não existe nos autos justa causa para sua decretação. Prosseguiu destacando a ausência de fundamentação da decisão agravada. Arguiu, ainda, que não possui qualquer contrato ou convênio com a Assembleia Legislativa, nem tampouco recebeu, a qualquer título, benefício ou quantia. Ainda, ponderou que a lei de improbidade administrativa não faz qualquer menção quanto a desconto de cheque nominal ou conduta congênere, decorrente do direito do servidor, além de, também, não existir qualquer impedimento legal e/ou regulamentar para a realização do procedimento (desconto de cheque) pela casa lotérica, e que os cheques não pertenciam à Assembleia Legislativa, mas sim aos servidores titulares dos créditos neles inscritos, tratan do-se, assim, de fato absolutamente atípico, por ausência de interesse da administração.
Foi identificada a quantidade de 109 cheques emitidos no período de 20/12/2012 a 27/09/2016. Dentre os cheques emitidos pela Assembleia Legislativa e depositados na conta corrente da empresa lotérica, mediante cópia dos respectivos cheques, foi possível identificar os beneficiados diretos, ou seja, as pessoas em cujos nomes foram eles emitidos, inclusive com o registro do objeto de cada pagamento feito no verso das cártulas.
Para o desembargador, o juiz não se dedicou a justificar o porquê, no caso, a medida extremada de quebra do sigilo bancário faz-se necessária, haja vista que as informações contidas no relatório são suficientes e bastam por si só ao que pretende o MP. “Não se está aqui a afirmar a inadequação do pedido, até porque a jurisprudência mais recente do Superior Tribunal de Justiça (STJ) admite a decretação da quebra do sigilo, pelas instâncias ordinárias, em procedimentos que relatem indícios da prática de improbidade administrativa. O que se está a dizer é que, no caso concreto, não existe justificativa de quebrar o sigilo da empresa se não foi indicada razão suficiente para tanto”, registrou Lages.
A conclusão dele é de que o Ministério Público detém em sua posse elementos suficientes para a continuidade do inquérito civil, logo, mostra-se descabida a quebra de sigilo bancário da loteria.
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