Dom Pedro Conti

“Ainda hoje estarás comigo no paraíso”


Neste final de semana, o papa Francisco fechará a Porta Santa na Basílica de São Pedro e encerrará, assim, o Jubileu Extraordinário da Misericórdia, iniciado no dia 8 de dezembro de 2015. O mesmo acontecerá em todas as dioceses do mundo. Não será diferente em Macapá. Será neste sábado, 19 de novembro, junto aos nossos irmãos e irmãs das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) reunidos no Encontrão anual. Penso poder dizer que trabalhamos bastante nesse tempo de graça. Abrimos muitas Portas Santas, rezamos e refletimos sobre a Misericórdia do Pai manifestada com as palavras e os gestos de Jesus, com a sua compaixão e a sua vida doada na cruz.

Na Festa de São José, lembramos o “pão de cada dia”, junto ao “Pão da Eucaristia”, mas também o pão da união das famílias, da acolhida dos pobres, da partilha solidária. A primeira experiência da misericórdia e do perdão deve acontecer em nossas casas. No Congresso Eucarístico, as paróquias todas colocaram as Obras de Misericórdia Corporais e Espirituais nas faixas e nas camisetas. Cantamos a Eucaristia “Pão da unidade, alimento da missão”. Nos orientaram as palavras de Jesus na Última Ceia, após ter lavado os pés dos discípulos, “Dei-vos o exemplo” e a despedida do mestre da Lei seguidas à parábola do Bom Samaritano: “Vai e faze a mesma coisa”. No Círio, chamamos Maria de Rainha e Mãe de Misericórdia. Não faltaram retiros, momentos de espiritualidade e, sobretudo, ocasiões para experimentar o perdão do Pai, através do Sacramento da Reconciliação ou Penitência, que ainda chamamos de “confissão”. Para quem soube aproveitar, ficarão boas lembranças. Tudo foi bonito: evangelização, gestos e eventos. Devemos agradecer ao Pai misericordioso e ao papa Francisco por esse tempo de bênçãos. É neste momento, porém, que devemos nos perguntar o que ficará para a nossa vida de cristãos. A nossa memória é curta e parece que sempre precisamos de algo diferente, algo que pareça novo para lembrar algo bem antigo e que nunca de veríamos ter esquecido. Não foi o papa Francisco que inventou a misericórdia de Deus, fomos nós que, talvez, a tínhamos deixada de lado.

Não foi assim para o evangelista Lucas que, ainda no final do seu evangelho, coloca palavras de bondade e misericórdia na boca de Jesus na cruz, prometendo ao ladrão arrependido o perdão e a acolhida no céu. Essa é a página do evangelho de Lucas que encontramos neste domingo da solenidade de Cristo Rei com a qual, também, concluímos o ano litúrgico. Já refletimos, muitas vezes, que o trono de Jesus é a cruz e que a sua coroa é de espinhos. Os grandes das nações “dominam sobre elas e os que exercem o poder se fazem chamar de benfeitores”. Para Jesus, ao contrário, o maior é aquele que serve a todos. Foi o que ele fe z em toda a sua vida terrena: “Eu estou no meio de vós como aquele que serve” (Mt 22,27).

Todo cristão é chamado a servir. Talvez possa ser este o recado deste Ano Santo extraordinário: sermos servidores da Misericórdia, testemunhas vivas da bondade, da compaixão do perdão do Pai. “Misericordiosos como o Pai” foi o lema deste Jubileu. Vivemos numa sociedade complexa, onde sobram violência, corrupção, desinteresse e ganância e faltam acolhida, honestidade, solidariedade e generosidade. Se não queremos desperdiçar o que aprendemos no Ano Santo da Misericórdia precisamos viver a bondade. Papa Francisco pede às dioceses algum sinal, algum gesto que faça essa memória. Veremos o que será possível fazer p ara nós como Igreja local, mas todos poderemos fazer, pessoalmente, algum gesto simples de perdão e reconciliação. Talvez algo desejado e adiado há muito tempo. Também com o Senhor será sempre possível nos reconciliarmos. A porta do seu coração nunca será fechada. Se depois conhecemos alguma situação de pobreza e desemprego e uma ajuda real está ao nosso alcance, por que não aproveitar ainda deste tempo de compaixão? “Hoje” disse Jesus mais uma vez lá na cruz. O “hoje” dos servos da misericórdia que não deixam para amanhã o bem que podem fazer agora. Um hoje, um já, que pode valer o paraíso para sempre.