Dom Pedro Conti

Aprendendo com as mulheres


O exército de Alexandre, o Grande, preparava-se para tomar uma cidade da África, mas as portas se abriram, sem resistência. A população era quase toda feminina, já que os homens haviam morrido nos combates contra o conquistador. No banquete da vitória, Alexandre pediu que lhe trouxessem pão. Uma das mulheres trouxe uma bandeja de ouro, coberta de pedras preciosas, com um pedacinho de pão ao centro.

– Não posso comer pedras preciosas e ouro; o que pedi foi pão! – bradou o soberano. E a mulher respondeu:

– Alexandre, não tem pão em seu reino? Precisava vir buscá-lo tão longe?

Alexandre continuou suas conquistas, mas, antes de partir dali, mandou gravar numa pedra: “Eu, Alexandre, vim até a África para aprender com estas mulheres”.

A partir deste domingo começamos a ler o capítulo 6 do Evangelho de João. Aparentemente, o assunto será sempre o mesmo: Jesus se apresenta como o Pão da Vida, descido do céu. No entanto, a cada trecho que iremos ler, daremos um passo para frente. Assim é o Evangelho de João; mais vamos nos adentrando nele, mais novos horizontes se abrem. O capítulo inicia com um “sinal”: cinco pães e dois peixes satisfazem a fome de, “aproximadamente”, cinco mil homens. Não adianta imaginar de qual misterioso forno vieram os pães e em qual mar celestial foi apanhado tanto peixe. O que vale para o evangelista &eacu te; que “todos ficaram satisfeitos” (6,12) e que foram recolhidos doze cestos com as sobras dos cinco pães, “deixadas pelos que haviam comido” (6,13). O recado do sinal, portanto, deve estar no pouco que se torna muito, na satisfação do povo e nas sobras juntadas para que “nada se perca”. O sucesso também não interessa a Jesus. Ele escolhe continuar a ser “o profeta”; não quer ser um rei aclamado por interesseiros de barriga cheia. Jesus se retira, sozinho, para o monte.

No cap. 4 do seu evangelho, durante o diálogo com a samaritana, João apresentou Jesus como a Água Viva. No cap. 6, um pouco mais a frente, Jesus será o Pão Vivo. Todas imagens simbólicas para nos ajudar a acreditar em Jesus. Ele não quer nos dar somente coisas materiais, pão ou bem-estar. Ele quer dar a si mesmo. Quer que, recebendo os seus dons, não esqueçamos o doador. Água e pão são bens necessários para a vida. Sem água e sem alimento, morremos. Tem, porém, grandes diferenças. A água já existe em nosso planeta, é gratuita e ninguém a fabrica. O pã o não. É fruto da terra, é dom de Deus. Mas também do trabalho humano. O pão não se faz sozinho. Desde a semeadura no campo até a massa levedada assada no forno, é o resultado de muitas colaborações. Esse envolvimento humano faz parte do sinal. Jesus será apresentado como o Filho, enviado do Pai, mas precisa ser reconhecido e acolhido pelas pessoas que o encontram. Quem acolhe Jesus fica “satisfeito”, como acontece após qualquer fadiga humana que produza mais vida, mais alegria, mais partilha e fraternidade. No pão repartido, dado e recebido, tem algo a mais do simples comer. Tem uma “sobra” de sentido no gesto de comer juntos “o fruto da terra e do trabalho humano” que somente pode vir da gratuidade do encontro, da amizade e do valor de sermos família-grupo-comunidade. Somos humanos. Nos alimentamos também com o sentido que damos ao no sso agir, trabalhar, servir e amar. Precisamos encher a nossa vida de sorrisos, abraços, cantos e danças. Se não fosse assim, seriamos como os animais de engorda, cada um vidrado no seu prato, brigando para defender o que é seu. Quantos de nós passam a vida assim. Incapazes de levantar o olhar acima dos seus interesses e privilégios. Barrigas e cofres cheios, mas vidas vazias de paz e de bondade. O que parece inútil, a sobra, o que não é mais só comida, é essencial. É a alegria de estarmos juntos que faz de qualquer refeição um banquete.

Poderosos e dominadores, como Alexandre Magno, poderão roubar pratos cheios de ouro e de riqueza, mas o pão da acolhida e da fraternidade sempre será pouco. Porque não se compra e nem se conquista com a força. Só é farto quando é doado livremente, oferecido e partilhado com generosidade. Vale demais para ser jogado fora.