Dom Pedro Conti

Deixar para encontrar


Chegamos ao domingo do Círio. Estamos em festa e olhamos, alegres, à Maria, a jovem de Nazaré, a mulher do sim, a mãe de Jesus e, pelas palavras dele, também nossa mãe. A pequena imagem que levamos em procissão nos permite manifestar abertamente nosso afeto e gratidão. Sentimo-nos amparados como crianças no colo da mãe.

O evangelho de Marcos, deste domingo, fala-nos de uma pessoa que correu ao encontro de Jesus para lhe perguntar o que devia fazer para “ganhar” a vida eterna. Por causa da corrida, somos levados a pensar que fosse um jovem. Com o avanço da idade as pernas ficam mais pesadas e o fôlego mais curto. Além disso, a juventude é o tempo oportuno para as grandes decisões da vida. A cabeça dos jovens ferve de sonhos, projetos, ambições e esperanças. Todo jovem, sente que, agora, &eacut e; a sua vez de ocupar espaços e lugares e, assim, busca, ansiosamente, a possibilidade de manifestar aos demais as suas capacidades. A moça ou o rapaz, que persegue com determinação os seus objetivos, nos estudos e na profissão, faz a alegria e o orgulho dos seus pais. O jovem do evangelho era um desses, bem sucedido, bem colocado, uma pessoa de bem e de… “bens”. Materialmente falando, não carecia de nada. No entanto, sentia que àquela vida, sossegada e segura, talvez, invejada por todos, faltava alguma coisa. Tinha entendido que a sorte grande, o ter nascido num berço de ouro, não era para sempre. O dinheiro não comprava a vida eterna. Queria ter a garantia do bom e do melhor também no outro mundo. Acostumado a negociar, pensava que a vida eterna também tivesse o seu preço. Estava disposto a pagar, bastava que Jesus lhe falasse o quanto.

Estava enganado. A vida eterna não tem preço, porque não se compra e nem se vende. É um dom do Pai para os seus filhos, uma herança que o Pai entrega aos seus filhos com todo o coração e com toda a alegria. Ou, se preferem, um “direito” para os verdadeiros filhos e filhas dele, ou seja, para aqueles e aquelas que, nas suas vidas, tornaram reconhecíveis os traços amorosos do Pai de todos e, em especial, dos pobres e pequenos. De fato, quem sabe amar e servir, quem sabe fazer d a sua vida um dom para quem o encontrar se assemelha a Deus, já participa da vida plena, da vida divina, porque Deus é amor doação, não é um conjunto de normas a serem observadas ou um mercador de felicidade. O evangelista Marcos faz questão de salientar que Jesus olhou para aquele jovem “com amor” e lhe fez a única proposta possível para libertá-lo da prisão do egoísmo no qual os bens materiais o mantinham fechado. O chamou para segui-lo, leve e liberto, pronto para amar os não amados, os excluídos, os esquecidos, os sem nada. O jovem, porém, preferiu a felicidade triste dos bens visíveis ao desafio da felicidade plena garantida pelo Deus da fé e da esperança, amor sem limites, capaz de oferecer o único tesouro que os ladrões não podem roubar e a traça não consume.

Os jovens de hoje continuam sonhadores e cheios de projetos para o futuro, como sempre. Não podem desistir de planejar um mundo mais justo e fraterno, um mundo de paz, de vida feliz e segura, de saúde, água e ar limpos, um planeta verde e azul, sempre fascinante e encantador. É nessas questões que começa a missão e a responsabilidade dos mais velhos. Quantos adultos – pais e avôs – gastaram as suas vidas para juntar casas, campos, negócios, contas nos bancos e, assim, ensinaram aos seus f ilhos e netos que a vida verdadeira está somente aqui e que o resto, fé e utopia, é crendice e perda de tempo. A evangelização da juventude começa com a vivência do Evangelho por parte dos seus pais, pela educação e a experiência prática da solidariedade e da partilha. Quem não quer deixar nada e quer agarrar tudo, no final ficará de mãos e coração vazios. Não terá amado nem a Deus e nem ao próximo. Terá as feições do “príncipe deste mundo” e não do Pai de Jesus, aquele Pai que acolhe sempre de volta o filho errado e arrependido. Precisamos deixar o que vale menos para encontrar o que vale muito mais. A jovem Maria acreditou, ficou “cheia de graça”, foi feliz e bendita.