José Sarney

O imbróglio das redes sociais


Há alguns anos, em discurso no Senado, abordei o tema dos dias de perplexidade e indagações que vivemos, em que existem mais perguntas no ar do que respostas a dar.Estamos não num mundo em transformação, mas num mundo já transformado.

Participei, como convidado da ONU, de uma conferência mundial, em Bilbao, sobre o impacto da Internet nos direitos à privacidade. Com a sociedade da comunicação que passamos a ter, depois da morte da sociedade industrial, nada mais tem a garantia do sigilo, e a palavra da moda é transparência.

Uma das consequências foi tornar-se mais atual a indagação de Pilatos a Jesus, que consta em todos os evangelhos sinóticos: “O que é a verdade?” É difícil não só responder à pergunta, mas encontrar seu objeto. Sobre qualquer coisa existem tantas versões na Internet que não se sabe qual a verdadeira. E são tantas as verdades que não se sabe mais onde está a verdade. O resultado de tudo isso é que nasceram duas expressões, as mais usadas no mundo no ano passado: fake news e pós-verdade. A primeira significa notícias falsas e a segunda fica mais difícil de definir, pois é uma mentira que se tornou verdade.

Dentro desse quadro, as redes sociais — em que não há centro, mas o controle, como se descobre agora, de empresas que manipulam os acessos e as opiniões — deitam e rolam, possibilitando a cada pessoa ter a sua verdade ou a sua mentira.

Daí a discussão mundial sobre isso e o fato de se procurar, em todo lugar, vacinas e bloqueios contra as fake news, além de legislações para evitá-las ou reprimi-las. O diabo é que, quando o remédio aparece, o estrago já está feito e não há como repará-lo. É um pouco daquilo que o Padre Vieira falava sobre a calúnia: que eram penas de galinha arrancadas e soltas ao vento — depois era impossível juntá-las.

Outra coisa que tive oportunidade de ressaltar nessa conferência de Bilbao foi a nova tendência, trazida pela Internet, da democracia direta, aquela que existia no mundo antigo,em que cada pessoa votava por sua palavra em praça pública. Assim, no dia em que cada pessoa tiver seu iphone e a tecnologia assegurar certas garantias necessárias ao voto, toda parafernália da eleição desaparecerá.

Mas a Internet mal-usada é mesmo o perigoso instrumento da calúnia, do insulto, da difamação, da denúncia vazia e das notícias falsas.

Lá no Maranhão, agora por outros meios, usa-se desse mal costume. Eu, pelo menos, sou uma vítima predileta, alvo de insultos, dia e noite, desde que entrei na política. E ainda dizem que fazem política nova, mas usam a mais velha, bolorenta e nociva de todas as políticas.