José Sarney

Um futuro que chegou


Desde moço tive a cabeça no futuro. Sempre queria me atualizar, olhar para frente e não ter lanterna na popa. Assim, começando a ter gosto pela literatura, não me conformava com um país mergulhado no parnasianismo e aonde não chegara a Semana da Arte Moderna de 22.

Fundamos um grupo de escritores e pintores. Começamos a fazer poesia contestatária das formas antigas e organizamos o Salão de Dezembro no Teatro Arthur Azevedo, chocando com as novas formas.

Foi aí que chegou de Portugal Bandeira Tribuzzi, como ele mesmo dizia, “trazendo Fernando Pessoa na bagagem” e passou a nos atualizar. Conhecemos José Régio, Miguel Torga, Antonio Machado e Garcia Lorca.

Depois meti-me na política, e pensamos em mudar o Maranhão. Tribuzzi fez a parte econômica; nós, a militância política. Governador, pensei não só nas obras, mas nas novas ideias. Trouxemos o primeiro computador. Criamos a Sudema, cópia da Sudene. Com uma equipe de gente nova, implantamos o planejamento, coisa nunca pensada no Maranhão, mandamos os irmãos Lobato e Anselmo ao Japão para ver e estudar as novas tecnologias da educação. Pobres, fizemos um circuito fechado de TV para multiplicar o número de professores (seis mil alunos). Criamos o Projeto João de Barro, até hoje objeto de estudo e tese universitária. Fizemos a primeira televisão educativa do Brasil, que chamávamos de Didática. Criamos cinco faculdades e a UFMA, com a ajuda do Presidente Castelo, e passamos de 745 alunos para cinco mil. Implantamos 74 ginásios Bandeirantes no interior.

Quando recebi o título de doutor honoris causa na Universidade de Pequim, disse que todos os saberes da humanidade eram o resultado da acumulação que vinha da Idade da Pedra à desintegração do átomo. Portanto, o saber devia ser universal e patrimônio da humanidade, jamais objeto de comércio.

Agora chegamos à inteligência artificial, que projeta um futuro inimaginável, com a perspectiva de substituir o homem. As guerras não serão mais de balas e bombas, mas cibernéticas. Não teremos países grandes ou pequenos, mas sim os que dominam ou não dominam tecnologias. Na ponta do iceberg está a guerra comercial entre China e Estados Unidos, para saber quem dominará a tecnologia do 5G.

Assim, o mundo acelera para a velocidade da luz. Tudo se transforma, tudo avança. E o homem? Yuval Harari diz que os empregos desaparecerão em diversas áreas, inclusive na medicina. As máquinas farão diagnósticos e tratamentos.

Não sei se será melhor ou pior. O certo é que o homem que eu sou — e somos — vai desaparecer, como desapareceram os de Neandertal.

A humanidade cresce. Os empregos vão embora. O Brasil está vivendo a tragédia dos 42 milhões de desempregados ou subempregados, sem contar o que acontecerá quando o desaparecimento de empregos do futuro, que será estrutural, se somar a nossa miséria conjuntural.

O Padre Vieira dizia que tinha saudades do futuro; eu também. Mas com essas perspectivas, fico em dúvida: terei saudades do futuro ou do passado?

E agora a mídia publica: entramos no negativo. O Brasil está fazendo como rabo de cavalo, crescendo para baixo.