José Sarney

Valei-nos, Nossa Senhora


Numa tradição que vem de nossa colonização, o Brasil é um país profundamente religioso. Digo país pois, embora este seja laico, a fé domina nossa vida civil com suas festas e manifestações. A discriminação religiosa é proibida, mas ela só existe entre nós como uma anomalia, a regra é a de coexistência e convivência — e, ainda, de sincretismo. Não só na Bahia o candomblé — aqui no Maranhão “Mina” — e as religiões de origem africana dominam as festas de largo, em geral em comunhão com as celebrações católicas.

O País, esta semana, celebrou Nossa Senhora Aparecida. É nossa padroeira e nossa protetora. Há 400 anos ela foi encontrada, por pescadores que queriam agradar ao Conde de Assumar durante sua passagem por Guaratinguetá: pediam a intercessão de Nossa Mãe para que trouxesse os peixes raros, e eles surgiram, mas depois das redes encontrarem o corpo e a cabeça da imagem sagrada.

A devoção estabeleceu-se e foi — e é — forte. Com o tempo a Capela da Santa foi substituída pela Igreja da Aparecida, que foi rodeada de uma cidade, virou Basílica e coexiste com a grande Basílica de Nossa Senhora da Conceição Aparecida, onde a Virgem Maria é reverenciada em sua pequena imagem por todos nós.

Muita gente ali vai em peregrinação. Os milagres são coisa de todo dia. A fé é palpável, quase podemos tocar, certamente podemos ver nos olhares e nos gestos. Quando a religião católica ainda não era separada do Estado, a Princesa Isabel, que não tinha filhos, e queria tê-los, fez a romaria e uma promessa, que voltou, 20 anos depois, para cumprir: dar-lhe uma coroa de ouro, com que foi coroada, por ordem do Papa Pio X.

Os papas lhe foram fiéis.

Pio XI a proclamou Padroeira e Rainha do Brasil. Paulo VI, Bento XVI e Francisco lhe ofertaram suas três Rosas de Ouro — como têm Nossa Senhora de Fátima, de Guadalupe, de Loreto. João Paulo II consagrou sua Basílica Maior.

Mas temos festa ligadas a muitas outras imagens, como a de Nossa Senhora de Nazaré, também achada, em 1700, num rio, o Igarapé Murututu, perto de Belém do Pará. Como em Portugal, na Vila de Nazaré, sua festa é no dia 8 de setembro. O Círio de Nazaré, em que a imagem é levada de sua Basílica para a Catedral, é uma festa gigantesca — dizem que a maior do Brasil —, com o ritual da corda e a tradição das representações em miriti, nosso buriti.

No Paraná a imagem encontrada foi a de Nossa Senhora do Rosário, Nossa Senhora do Rocio, também imagem antiga, bicentenária, de grande devoção popular.

Nós também temos nossa festa ligada a uma imagem achada na água, no nosso caso no mar. Só que, em vez de ser da Mãe de Jesus, foi a de São José, que, em Ribamar, como nosso padroeiro, nos acolhe a todos com atenção paterna. Ali também fizemos uma grande igreja — que completou este ano 100 anos de sua inauguração. Construímos uma devoção forte e a tradição de celebrá-lo no começo de setembro.

Vivemos dias de crueldade e egoísmo. Tanta coisa ruim acontecendo. O melhor para enfrentar isso é a fé. Valei-nos, Nossa Senhora da Conceição Aparecida!