Nilson Montoril

AJURICABA


 

Em área onde surgiria, em maio de 1728, o povoado de Barcelos, residiam os índios Manaós, chefiados pelo cacique, Huiubeue, cuja sede era uma ilha. Tinha como braço forte o filho Ajuricaba e ambos eram peritos no uso dos arcos e das flexas. Tudo transcorria normalmente, quando chegaram à aldeia dois aventureiros, que se encontraram com o cacique e foram tratados amistosamente. Entretanto, os exploradores eram portadores de uma proposta que feriu o orgulho de Ajuricaba e outros maiorais da tribo, simplesmente, queriam recrutar índios para vendê-los como escravos.

 

Um ritual sagrado foi colocado em prática, ingestão da bebida “caxiri da paz” usado apenas para encontro com amigos. O jovem indígena censurou seu genitor com rispidez e abandonou a tribo, indo para o seu reduto confabular com seus liderados. O cacique Huiubeue ralhou feio com Ajuricaba e lhe retirou todas as suas prerrogativas no seio da comunidade onde era líder. A partir de 1720, à frente de um forte grupo de numerosos indígenas de sua etnia e de outras vertentes, valendo-se de emboscadas, os militantes de Ajuricaba passaram a atacar os portugueses estabelecidos em seus domínios. Os colonizadores lusitanos decidiram recorrer ao governador do Estado do Maranhão e do Grão Pará, general José Maria Gama, requerendo autorização para moverem lutas contra os indígenas rebelde. A Carta Régia foi expedida em nome de Belchior Mendes de Moraes, à frente de tropas legais. De Belém, seguiu com reforço militar João Pais do Amaral, em barcos artilhados. Durante oito anos. Ajuricaba espalhou terror na região. Chegou a contar com o apoio de contingentes proveniente do Suriname. Em 1727. Ajuricaba sentiu o travor da derrota.

 

Foi derrotado, acorrentado e embarcado em um navio que o conduziria à Belém, para ser julgado. Estima-se. que seu contingente bélico contasse com cerca de 1.300 guerreiros. Diante do poder de fogo dos portugueses isso nada representava. Ajuricaba ainda tentou uma sublevação a bordo, mas logo foi dominado.  Acabrunhado, Ajuricaba resolveu manter-se relativamente quieto e aguardar uma oportunidade para fugir à nado. A ideia de suicídio já dominava sua mente. Numa noite de violento temporal, que fustigava o trecho onde O Solimões e o Rio Negro se encontram, lançou-se às águas revoltas e desapareceu. Ele sabia que um índio autentico não teme a morte para lavar a sua honra. Havia passado a maior parte do trecho da viagem com os braços presos a correntes de ferro, para impedir que nadasse. Ele nasceu na aldeia Mariuá, numa área denominada “Barcele”, palavra proveniente do latim, que identifica um local baixo e sujeito a alagamentos; De Barcele, no Rio Solimões até o Rio Negro, a distância equivale a 450 km.

 

Nesta parte da História surge a lenda e ela nos diz, que os pulsos de Ajuricaba, atados com correntes foram liberados, para que ele participasse das faxinas. Isso permitiu que ele alcançasse o convés. Neste momento chovia torrencialmente e as águas dos tios estavam encrespadas. Em pé sobre o convés, as águas da chuva e dos dois rios atingiam em cheio o corpo de Ajuricaba. Empreendendo uma veloz carreira atirou-se no trecho onde o Solimões e o Rio Negro se encontram, mas suas águas não se misturam. Alguns instantes após o mergulho do índio, surgiu no meio do “encontro das águas” a figura fantástica de um Mauari, também conhecido como Socó Grande, tendo sobre suas assas poderosas o corpo do herói indígena, exibindo a prova da sua morte. Os portugueses acusaram Ajuricaba de ter sido colaborador dos ingleses, que também vagavam na região.

 

A versão é contestada pelo escritor lusitano Joaquim Nabuco, no livro “O Direito do Brasil”. As terras da Amazônia, nesta época pertenciam à Espanha. O “Encontro das Águas”, conforme a lenda deve ser entendido como a sinalização da morte de Ajuri caba. Ele nasceu em Mariuá (Barcele/Barcellos), cujo significado é “Grande Braço” e morreu afogado no rio Amazonas. Serenados os ânimos, o cacique Camandri foi autorizado a erguer nova aldeia em Mariuá, onde surgiu a Capitania de São José de Rio Negro, origem do Estado do Amazonas. Manaó, origem de Manaus passou a viger quando a capital do Amazonas foi transferida para o local onde se encontra a capital amazonense.