Nilson Montoril

Fantasiosa história de cobra grande


Narrativas fantasiosas costumam ser feitas por certos órgãos da imprensa. Não é um procedimento raro, principalmente quando determinados jornais divulgam noticias mirabolantes. Na ânsia de aumentar a venda de exemplares, repórteres e redatores não têm o mínimo cuidado de verificar se o fato em destaque realmente aconteceu. Um exemplo disso é a noticia que transcrevo: “Em fevereiro do corrente ano, conforme noticiara a imprensa do país, uma cobra gigantesca do Amazonas ataca o forte de Tabatinga, no Território do Amapá. O Forte, que estava guarnecido e perfeitamente aparelhado para repelir qualquer possível agressão exterior, não sofreu o menor dano, sendo o monstro anfíbio abatido com balaços de metralhadora P-50 instantaneamente.

O gigantesco ofídio media, apenas, 40 metros de comprimento, com 80 centímetros de altura e pesava cerca de 6 toneladas! O cachê, que acima estampamos, apresenta o “Sucurijú Gigante, já sem vida, logo após o inédito ataque à fortificação”. A reportagem cometeu um erro crasso ao localizar o Forte de Tabatinga no Território Federal do Amapá, haja vista que Tabatinga é um município do Estado do Amazonas, situado há mais de mil quilômetros de Manaus, localizado à margem esquerda do rio Solimões, na fronteira do Brasil com o Peru e a Colômbia. Na área onde surgiu Tabatinga, o Capitão-general Fernando da Costa de Ataíde Teive, Governador do Estado do Pará e Maranhão mandou, no ano de 1766, instalar o Forte de São Francisco Xavier, destinado à inspeção das canoas que se destinavam à povoação espanhola de San Pablo de Loreto, no Peru.
O negocio era tão lucrativo, que a Companhia de Comércio do Pará e Maranhão ali implantou uma filial.A partir de 1776, o forte ganhou maior importância devido ao incremento das atividades comerciais na região, Nesta época já havia sido criada a Capitania de São José do Rio Negro, cuja sede foi a antiga aldeia de Mariuá, governada pelo Coronel Joaquim de Melo e Povoa.

O Forte de São Francisco Xavier não resistiu por muito tempo,mas sua ruína não se deu à conta de ataque de Anaconda e sim devido a forte correnteza do rio Solimões.Atualmente, o Exército Brasileiro marca sua fundamental presença em Tabatinga. Curiosamente, no folclore local há uma lenda referente a uma cobra grande parida por uma indígena virgem.A moça morava com os pais em lugar isolado e se dedicava aos trabalhos domésticos.O pai morreu quando ela ainda era criança. Ao atingir a puberdade, a garota começou a sentir acentuado desconforto vendo aumentar sua barriga. Sua mãe ficou perplexa ao ver, na hora do parto, que, em vez de uma criança, uma serpente deslizou entre suas mãos. Mesmo assustada recolheu a neta, colocando-a no fundo de uma cuia, dando-lhe alimentos. Certo dia, não encontrou a neta no terreiro, deduzindo que a mesma havia seguido seu destino. Tal ofídio passou a viver em um lago, relativamente distante de Tabatinga, onde atacava quem se atrevesse a invadir seu domínio. Outro erro cometido pelo autor da matéria em negrito, que transcrevi diz respeito a não citação do ano do ataque da cobra.

O jornalista apenas evidencia que o fato ocorreu “em fevereiro do corrente ano”. Mais adiante, ao revelar dados do animal indicou que a Sucurijú tinha 80 centímetros de altura. Deveria ter escrito 80 centímetros de diâmetro. O verdadeiro autor da matéria jornalística era desinformado à beça. Talvez nem tivesse ouvido falar sobre a Fortaleza São José de Macapá, edificada à margem esquerda do canal norte rio Amazonas, bem perto de o grande caudal desembocar no Oceano Atlântico.

As evidencias me levam a crer que o suposto ataque da cobra aconteceu em meados da década de 1940. Só houve uma ocorrência interessante passada na área externa da Fortaleza de Macapá, correspondente abate de uma onça pintada que por ali transitava. Ela costumava aparecer no Elesbão, provavelmente para comer restos de porcos mortos em um curro. Certo dia a onça apareceu e o alarme foi dado. Usando um fuzil Mauser e posicionado no Baluarte São Pedro, o Guarda Territorial Oton ceifou a vida do felino.