Nilson Montoril

Marcelo Cândia, um bom samaritano


No dia 25 de Janeiro de 1961, ocasião em se comemorava o 17º ano de instalação do Território Federal do Amapá, a Prelazia de Macapá lançava a pedra fundamental de um grande hospital a 3 km de distância do Marco Zero do Equador. Na oportunidade, Dom Aristides Piróvano, Bispo Prelado de Macapá, esclareceu que a importante obra decorria do propósito do Dr. Marcelo Cândia, químico, biólogo e industrial italiano em edificá-la no setentrião brasileiro. Dom Aristides Piróvano disse também que a área de atuação do hospital abrangeria os limites do Território do Amapá, as ilhas situadas na parte lacustre da Ilha do Marajó e outros recantos da Região Amazônica. Ele sabia que, historicamente, Macapá sempre foi um importante ponto de apoio à população carente de recursos residente no Estado do Pará e vizinha à capital do Amapá. O Dr. Marcelo Cândia, velho amigo de Dom Aristides, que estava a seu lado, afirmou estar seguindo os ensinamentos de Jesus Cristo: “curai os doentes”, dando tudo de si aos mais pobres. Não era a primeira vez que o ilustre industrial visitava Macapá. Em 1957, estivera na capital amapaense a convite de Dom Aristides para constatar que a situação do povo local merecia a atenção de religiosos caridosos. Marcelo Cândia fez um documentário cinematográfico focalizando o Amapá da década de 1950 e o levou para mostrá-lo na Itália. Isso permitiu que ele sensibilizasse católicos bem aquinhoados financeiramente, os quais adotaram a idéia de ergue um hospital no Norte do Brasil. Marcelo Cândia nasceu em Nápoles, na Itália, em 1915. Ainda era jovem quando seus pais mudaram-se para Milão. Desde a juventude deixou evidente sua preocupação com os pobres, os humildes e os desamparados. Nas visitas de cunho humanitário realizadas na Ásia e África ficou chocado com a situação de miséria plena em que viviam milhões de seres humanos. Cursou a faculdade de ciências químicas, assumindo a direção da indústria que seu pai possuía assim que concluiu os estudos superiores. Ao término da segunda guerra mundial fundou a “Associação de Leigos Auxiliares das Missões”, cujo propósito era angariar e enviar remédios e auxílios aos Missionários em diversas partes do globo. As atividades da ALAM eram divulgadas através da revista “A Missão”, que ele fundou, especialista em assuntos sobre o Terceiro Mundo. Também organizou cursos breves de medicina e cirurgia para Missionários, na Faculdade de Medicina. Em 1965, vendeu a indústria química que possuía e transferiu-se para o Brasil. Radicou-se inicialmente em São Paulo, vindo a Macapá com regular freqüência para levar adiante deu grande desejo. Os terrenos onde surgiria o hospital, cuja denominação inicial seria Santo Antônio, correspondiam a uma área de aproximadamente 90.000 metros quadrados, limitada pelas avenidas FAB/Cora de Carvalho e ruas Rio de Janeiro/Paraná, estas mais pareciam picadas abertas por caminhões, quase toda murada e cercada. Em maio de 1971, quando aconteceu a inauguração do hospital, a área construída alcançava 6.500 metros quadrados. O projeto foi elaborado na Itália, por engenheiros que já haviam construído obra similar na África e examinado pela Sociedade Anônima Snam-Progetti de Milão, que projetou gratuitamente em todos os detalhes, a construção de esgotos, instalações sanitárias, elétricas, linhas telefônicas e tudo que seria necessário em uma zona com difícil assistência técnica.

 

O hospital sonhado por Marcelo Cândia foi reconhecido como instituição filantrópica pelo Ministério da Educação e registrada no Conselho Nacional através do processo nº 239.372 em 3 de fevereiro de 1969. Na forma de seu estatuto, a entidade chama-se Hospital São Camilo e São Luis, visando principalmente ao atendimento da população carente de sua área de atuação, livre de discriminação religiosa, social ou econômica de seus assistidos. Os setores de atividades médico-social programados para o nosocômio eram: Assistência médico-sanitária na capital e interior; Proteção à maternidade e infância; Educação da População; Atuação como centro de estudos de medicina; Centro de Pesquisas de Moléstias Tropicais e Parasitárias; Preparação de pessoal de serviço auxiliar habilitado. Para conseguir tocar a obra a Prelazia de Macapá recebeu numerosas doações de entidades filantrópicas e paises: Misereor de Aachen (Cr$ 750.000,00), Benevolentia de Amsterdan, através da Fondation Auxilium, Fribuorg, Suíça (Cr$ 100.00,00), Governo Holandês, através da Assistência Técnica Internacional do Ministério de Negócios Estrangeiros (Cr4 275.000,00 e materiais), Caritas Internacional e Caritas do Brasil, em doações deparadas de materiais, Oxfam (materiais destinados a lavanderia),Governo Brasileiro por doações do Ministério do Interior,da Saúde e da Educação, Catholic Rekief Services, de Nova York. Também contribuíram numerosas entidades particulares do Brasil e do exterior. Vale ressaltar que, em 1969, segundo o Anuário Estatístico do Território Federal do Amapá, a unidade federada tinha uma população de 120.000 habitantes. Cerca de 50.000 pessoas residiam em Macapá. Registrava-se na época um alto índice de mortalidade geral por doença endêmica, má nutrição, más condições de higiene, falta de assistência médica e elevado índice de natalidade, calculado em 9%. Dentre residências existentes na cidade de Macapá apenas 1025 estavam ligadas à rede pública de abastecimento de água e 421 ligadas à rede de esgoto. O quadro de pessoas do Governo do Amapá comportava 3.230 servidores.