Pe. Claudio Pighin

As calúnias ameaçam a humanidade


Dias atrás, eu encontrei um senhor que estava catando comida no lixo da calçada de um luxuoso condomínio. Ele aparentava uma idade avançada, estava de barba cumprida e toda desarrumada. Vestia roupa bem humilde e rasgada. O rosto dele marcado pelas rugas emanava uma tristeza tão lacerante que não pude ir adiante e quis me entreter com ele. Começamos a falar perguntando o nome um do outro. Discorremos sobre a vida e a dureza dela. De repente ele me perguntou: “Sabe por que me encontro desse jeito?” Eu respondi que não tinha a mínima ideia a respeito. Ele, então, continuou: “Pela calúnia! Isso mesmo, foi pela calúnia!”. Então, eu insisti: “Como isso?” Ele, prosseguindo, me contou de maneira bem resumida, com as lágrimas descendo pelo seu rosto engelhado, que armaram uma tremenda cilada e acabaram com ele tanto profissionalmente quanto humanamente. E, sobretudo, me lembro essas palavras que ressoaram na minha mente como um eco sem fim: “Eis aqui um cara com um nível escolar superior, mas que não possui mais nada, se não mendigando…” Tudo isso me deixou inquieto e questionando-me: Será que se pode chegar tanto assim? O que é capaz o ser humano? Destruir pessoas também pelas mentiras, pelas falsidades, que por traz de tudo isso não tem nada mais, senão um puro egoísmo! E quantos como esse senhor vivem essa triste e vergonhosa situação. Perante tudo isso não me dei paz e busquei nas Sagradas Escrituras uma resposta. Encontrei o Salmo 63 que fala exatamente sobre isso:

“Ouvi, Senhor, minha lastimosa voz. Do terror do inimigo protegei a minha vida, preservai-me da conspiração dos maus, livrai-me da multidão dos malfeitores. Eles aguçam suas línguas como espadas, desferem como flechas palavras envenenadas, para atirarem, do esconderijo, sobre o inocente, a fim de feri-lo de improviso, não temendo nada. Obstinam-se em seus maus desígnios, concertam, às ocultas, como armar seus laços, dizendo: Quem é que nos verá? Planejam crimes e ocultam os seus planos; insondáveis são o espírito e o coração de cada um deles. Mas Deus os atinge com as suas setas, eles são feridos de improviso. Sua própria língua lhes preparou a ruína. Meneiam a cabeça os que os vêem. Tomados de temor, proclamam ser obra de Deus, e reconhecem o que ele fez. Alegra-se o justo no Senhor e nele confia. E triunfam todos os retos de coração.”

Essa oração é uma resposta a uma vida atravessada pela calúnia e a todas as suas consequências. O sofrimento que ela causa. E esse autor do salmo, caluniado e perseguido, busca uma resposta no Templo, onde a justiça de Deus está acima daquela humana. Assim sendo, o fiel aqui se torna o representante de todos os fieis de Deus perseguidos. Os adversários são apresentados como um bando de pervertidos e desonestos que unidos armam ciladas para prender e prejudicar o justo. Uma conspiração bem maquinada para tirarem proveito. São brutais que usam a palavra como uma espada de dois gumes ou uma flecha envenenada. O salmo nos propõe um contraste bem evidente, de um lado as calúnias representadas pelas flechas perigosas e do outro a grande defesa de Deus com as suas flechas contundentes e certeiras.

Em um primeiro momento, estão aqui os inimigos do fiel numa cena bem rumorosa de guerra, símbolo do mal que existe no mundo que estão prontos para eliminar o inocente, o justo. O combate é caracterizado pela língua, e as palavras são as flechas. As palavras enganosas, pervertidas são parecidas às flechas envenenadas. As ciladas dos que caluniam são escondidas, não transparentes e perigosas e sempre prontas para golpear os justos. No entanto, o fiel ameaçado não tem outra confiança se não em Deus: é Ele o único seu defensor. Por isso se refugia na oração. É essa a sua grande arma de defesa. Tem a certeza que Deus toma a iniciativa em seu favor e, portanto, por quanto possam ser venenosas as ações dos caluniadores não poderão nunca prevalecer à intervenção de Deus em seu favor.

À justiça divina ninguém pode se opor, e por tudo isso o fiel louva o seu Senhor. O papa Francisco falou a respeito: “Nunca falar mal de outras pessoas. A doença das bisbilhotices, das murmurações e das críticas. Desta doença, já falei muitas vezes, mas nunca é demais. Trata-se de uma doença grave, que começa de forma simples, talvez por duas bisbilhotices apenas, e acaba por se apoderar da pessoa fazendo dela uma «semeadora de cizânia» (como satanás) e, em muitos casos, «homicida a sangue frio» da fama dos próprios colegas e confrades. É a doença das pessoas velhacas que, não tendo a coragem de dizer diretamente, falam pelas costas. São Paulo adverte-nos: «Fazei tudo sem murmurações nem discussões, para serdes irrepreensíveis e íntegros» (Flp 2, 14-15). Irmãos, livremo-nos do terrorismo das bisbilhotices!”