Wellington Silva

O pesado ônus ao ignorar a pesquisa


Ao que tudo indica, pesquisas nos Estados Unidos, Europa e em outros países já estão adiantadas para se chegar a uma vacina que possa efetivamente imunizar a humanidade contra o Covid-19, já anunciando para breve os testes em um grupo de 500 pessoas.

E parece que o Brasil está bem na foto no ranking mundial quesito combate ao Covid-19. Isso evidentemente se deve ao trabalho do ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, e sua equipe técnica, assim como de governadores, prefeitos e equipes técnicas estadual e municipal.

Agora, infelizmente, anos atrás governos jogaram fora a possibilidade de avançar na produção de vacina para conter a Sars (síndrome respiratória aguda severa) e a Mers-Cov, a síndrome respiratória do Oriente Médio. Tudo começou em 2002, quando a Sars se espalhou em 29 países, infectou mais de 8 mil pessoas e matou cerca de 800. Após estudos, ficou comprovado que o patógeno causador da doença era um coronavírus que se originou em um animal e depois se espalhou entre humanos na Província chinesa de Guangzhou.

Em várias regiões do planeta, havia grande expectativa para saber quando uma vacina estaria pronta para combater a Sars. Na época, diversos cientistas da Ásia, Estados Unidos e Europa começaram a trabalhar febrilmente nessa busca, estudo que obviamente demandou tempo. Após a epidemia da Síndrome Respiratória Aguda ter sido controlada, vários protótipos surgiram, muitos prontos para testes clínicos. Diversos cientistas enfatizaram a urgência de produção de uma vacina contra esses patógenos, como prevenção. Infelizmente, não foram ouvidos, e os programas de financiamento ficaram abandonados.

Em 2016, uma equipe de cientistas em Houston, Estados Unidos, já tinha uma vacina pronta contra um coronavírus.

Maria Elena Bottazzi, Codiretora da Escola Nacional de Medicina Tropical da Faculdade de Medicina Baylor, e do Centro de Desenvolvimento de Vacinas do Hospital Infantil do Texas, revela o seguinte:

“Terminamos os testes e passamos a criação de um processo de produção em escala piloto para a vacina.Fomos aos Institutos Nacionais de Saúde dos EUA e perguntamos: ‘O que fazemos para transferir rapidamente a vacina para a clínica?’ E eles nos disseram: ‘Olha, agora não estamos mais interessados’.

E enfatiza Bottazzi:

“Nós já teríamos um exemplo de como esses tipos de vacinas se comportam e, embora os vírus não sejam exatamente os mesmos, eles vêm da mesma classe”.

Mas esse não foi o único caso!

Dezenas de cientistas, em todo o mundo, tiveram de interromper seus estudos devido à falta de interesse e de fundos para continuar pesquisando os coronavírus, Brasil incluso na lista.

Susan Weiss, professora de microbiologia da Universidade da Pensilvânia, em declaração à BBC News Mundo, disse que“quando a epidemia de Sars terminou, depois de oito meses pessoas, governos e empresas farmacêuticas imediatamente perderam o interesse no estudo dos coronavírus. A Sars afetou a Ásia, com alguns casos em Toronto (Canadá), mas não chegou à Europa. Então, surgiu o Mers, o segundo corona vírus virulento, e ficou quase inteiramente confinado ao Oriente Médio”.

Para especialistas a Sars e a Mers foram dois avisos de fundamental importância sobre os graves perigos dos coronavírus, alertas que lamentavelmente governos não deram ouvidos.

Jason Schwartz, professor da Escola de Saúde Pública da Universidade Yale, é bem claro e vai logo direto ao ponto à revista americana The Atlantic:

“A preparação para esta pandemia deveria ter começado logo após o surto de Sars em 2002.Se não tivessem abandonado o programa de pesquisa de vacina para Sars teríamos muito mais bases prontas para trabalhar neste novo vírus intimamente relacionado ao anterior”.

Peter Kolchinsky, virologista e diretor da empresa de biotecnologia RA Capital explica que “o financiamento acabou porque não havia mercado para a vacina. A realidade é que, quando existe mercado, existe solução. “Hoje temos centenas de vacinas para coronavírus, mas são todas para animais: porcos, galinhas, vacas etc.Elas são vacinas para prevenir doenças que podem custar milhões de dólares à indústria avícola e pecuária. Pensava-se que os surtos de coronavírus em humanos poderiam ser controlados mais facilmente.O problema é que, para qualquer empresa, é uma péssima proposta comercial desenvolver um produto que, de acordo com as probabilidades, não será usado em décadas ou talvez nunca”, salienta.

Atualmente Maria Elena Bottazzi e sua equipe continuam trabalhando na atualização da vacina Sars de 2016 e em uma nova para a Covid-19.Ela e seus colegas buscam mais financiamento para suas pesquisas.

CONCLUSÃO: Se em 2002 tivesse ocorrido financiamento mundial para a vacina contra a Sars com toda certeza haveria elementos suficientes de informações científicas para a vacina contra o Covid-19 uma vez que os coronavírus estudados possuem aquilo que popularmente chamam de “parentesco” viral. E de pensar que a pesquisadora Maria Elena Bottazzi precisava apenas de três ou quatro milhões de dólares para efetivar a vacina.