O Brasil já avançou imensamente na transição energética
A menos de seis meses para a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, o presidente da COP30, o diplomata brasileiro André Corrêa do Lago, falou com exclusividade à CNN sobre a expectativa para o evento

Cléber Barbosa
Da Redação
Embaixador, vamos começar então com a questão de Bonn, que é considerada uma espécie de mini COP. Muitas negociações acontecem em Bonn, na Alemanha, onde fica a sede do organismo da ONU que controla mudanças climáticas. Foi o primeiro teste da presidência brasileira da COP. Qual é o balanço que o senhor faz dessa reunião?André Corrêa do Lago – Olha, o balanço foi bom, e a realidade é que havia uma enorme expectativa porque a gente veio com muitas ideias novas, com uma equipe muito boa, e nós não sabemos muito bem como como seria a reação, porque, como você disse, é uma prévia da COP, mas é também a primeira reunião oficial depois da COP de Baku. E na COP de Baku, como você sabe, vários países ficaram com um certo gosto amargo, sobretudo na área de financiamento. Então, a gente não sabia muito bem como os países reagiriam, e o Brasil propôs um caminho, inclusive, de avançar nos documentos que a gente teria que negociar também em Belém. Podemos dizer que foi boa a reunião, porque a gente conseguiu avançar em vários documentos que estavam meio emperrados e que já vão chegar em Belém já bastante adiantados.
Quais esses documentos em que houve progresso?
André Lago – A Olha, tem dois temas muito caros aos países em desenvolvimento que estavam sendo tratados. Como você sabe, as negociações de mudança do clima são basicamente separadas entre mitigação e adaptação. Então, mitigação é quando você reduz as emissões, e a adaptação é quando você incorpora as mudanças do clima que já estão acontecendo na sua vida. Eu acho que um exemplo, infelizmente, que nós tivemos no ano passado foi Porto Alegre. Porto Alegre poderia ter sido menos grave se a gente tivesse feito investimentos de adaptação, sabendo que vão aumentar as chuvas, sabendo da intensidade. Isso aconteceu também na Espanha, aconteceu em vários países do mundo. E aí nós tivemos também um caso muito claro que só a mitigação resolve, que é o caso dos rios sem água na Amazônia. Não há nada que você possa fazer para se adaptar a isso, né? Então, realmente é reduzir as emissões para reduzir a intensidade da mudança do clima.
Um dos grandes debates é como nós vamos fazer o mundo desenvolvido, que é o principal poluidor, o principal responsável pelas mudanças climáticas historicamente, assumir a conta que eles precisam pagar e chegar a US$ 1,3 trilhão?
André Lago – Teve uma decisão em Baku que foi de pedir para que o presidente da COP29, Mukhtar Babayev, e eu, presidente da COP 30, nós devemos apresentar um mapa do caminho para chegar a esse US$ 1,3 trilhão. Só que esse mapa do caminho vai ser uma proposta nossa, dos dois, com base em várias propostas que nós estamos recebendo de países, de organizações, de bancos de desenvolvimento. Nós estamos juntando muitas ideias de como esse dinheiro poderia vir. Mas grande de parte desse desses recursos vão vir como investimento. Mas qual é a ironia? É que os países em desenvolvimento não só não recebem dinheiro público, como também são considerados de alto risco, e, portanto, também não recebem dinheiro privado. Então, esses ajustes com o apoio de bancos de desenvolvimento, com apoio de várias instituições que existem, têm que ser estruturados de maneira mais eficiente, mas também de maneira muito mais rápida, porque a ciência nos mostra que há uma urgência climática, e a gente não tem tempo de passar 20 anos bolando um sistema financeiro que funciona. Ou seja, tem que fazer o mais rápido possível.
Qual é a sua expectativa especificamente em Belém do que pode sair acordado entre todos os países com relação ao petróleo?
André Lago – Pois é, as COPs tem várias dimensões, né? Então alguns resultados vão ser da reunião dos chefes de Estado. Outros resultados vão ser da negociação formal entre os países. E outros resultados vão vir da agenda de ação, que é toda essa programação que a gente tem na COP em que você envolve os atores que não negociam. São os governos de Estado, as prefeituras, a sociedade civil, investimento privado, tecnologia, todo esse sistema. Então, eu acho que a gente pode ter resultados em várias dessas áreas, inclusive de como nós vamos poder estimular que diferentes soluções sejam encontradas, porque cada país tem um desafio diferente. Há países que cuja economia inteira depende de combustíveis fósseis.
O Brasil já avançou imensamente na sua transição. Nós somos o país que todo mundo admira por ser uma economia tão grande que tem 90% da eletricidade renovável. Mas há países que ainda dependem da eletricidade em 90% de carvão, por exemplo. Cada país tem uma situação diferente. E eu acho que isso é uma coisa muito importante, a COP trazer soluções.
Perfil
André Lago – André Corrêa do Lago é um diplomata brasileiro, atualmente secretário de Clima, Energia e Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores e presidente da COP30
BREVE BIOGRAFIA
-Conselheiro do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI). Diplomata desde 1983. É Secretário do Clima, Energia e Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores. Foi Embaixador na Índia (2019-2023) e no Japão (2013-2018). Na área de arquitetura é autor, curador e membro de júri. Há três anos, é membro do júri do prêmio Pritzker. Também é membro do júri do concurso do IMS de SP e do júri para nova sede do IMPA (matemática) no Rio.
– Trabalhou em diversas áreas no Ministério das Relações Exteriores, principalmente na área ambiental. Foi negociador chefe do Brasil para Mudançado Clima e Desenvolvimento Sustentável, inclusive na Rio+20. Como diplomata, serviu na Missão junto à União Europeia em Bruxelas (2005-2008) e nas Embaixadas em Buenos Aires (1999-2001), Washington, DC (1996-1999), Praga (1988-1991) e Madri (1986-1988).
– É co-curador e co-autor com Lauro Cavalcanti da obra “Ainda Moderno?”. É formado em Economia pela UFRJ.
NA COP 30
– Defende a ideia de “mutirão global” para cumprir o GST (Global Stocktake) como uma NDC Global (Contribuição Globalmente Determinada).
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