Política Nacional

Bolsonaro vira réu por falar que Rosário não merecia ser estuprada

Deputado disse que ela é ‘feia’; ele responderá por apologia ao crime e injúria.
Defesa nega incitação de outros a estuprar; relator vê desprezo por vítimas.


O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta terça-feira (21) abrir duas ações penais contra o deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ). Com a decisão, o deputado se torna réu na Corte pela suposta prática de apologia ao crime e por injúria.

Em 2014, Bolsonaro afirmou, na Câmara e em entrevista a jornal, que a deputada Maria do Rosário (PT-RS) não merecia ser estuprada porque ele a considera “muito feia” e porque ela “não faz” seu “tipo”.

Ao analisar denúncia da Procuradoria Geral da República (PGR) e queixa da própria deputada, a Primeira Turma da Corte entendeu, por quatro votos a um, que além de incitar a prática do estupro, Bolsonaro ofendeu a honra da colega. Somente o ministro Marco Aurélio Mello foi contra a abertura das ações penais. Os ministros Luiz Fux, Edson Fachin, Rosa Weber e Luiz Roberto Barroso votaram favor de que Bolsonaro se torne réu.

A declaração de Bolsonaro que motivou a denúncia foi feita após discurso de Maria do Rosário em defesa das vítimas da ditadura militar (1964-1985). Bolsonaro, que é militar da reserva, subiu à tribuna da Câmara para criticar a fala da deputada.

Quando Maria do Rosário deixava o plenário, Bolsonaro falou: “Fica aí, Maria do Rosário, fica. Há poucos dias, tu me chamou de estuprador, […] e eu falei que não ia estuprar você porque você não merece. Fica aqui pra ouvir”, disse o parlamentar, repetindo o que havia dito a ela em 2003, em discussão na Câmara. 

Defesa

Na defesa, a advogada de Bolsonaro, Lígia Regina de Oliveira Martan, invocou a chamada “imunidade parlamentar”, que protege deputados e senadores por opiniões, palavras e votos. Além disso, afirmou que ele não incentivou outras pessoas a estuprar.

“Ele é conhecido por projetos de lei que tendem a aumentar as penas de crimes e para que condenado por crime sexual deve ser submetido a castração química para obter benefícios. É uma mentira insinuar que o deputado tenha incitado a prática de qualquer crime”, ressaltou a advogada. 

Ao rebater a acusação de que Bolsonaro incentiva, com suas falas, a prática de estupro, a advogada disse que o deputado não poderia ser responsabilizado, por exemplo, pelo estupro coletivo do Rio de Janeiro, ocorrido recentemente. “Ele não participou do crime. Não há como dizer que o número de estupros no Brasil aumentou após as declarações”, afirmou.

A decisão desta terça-feira de abrir a ação penal não significa uma condenação pelos crimes, mas sim que Bolsonaro passa a ser considerado formalmente acusado no caso. Só ao final do processo, e após novas chances de defesa, a Primeira Turma poderá ou não considerá-lo culpado. 

Após a decisão do Supremo, Bolsonaro afirmou na Câmara que a afirmação dele foi um “ato-reflexo” e que a sociedade precisa ser informada sobre a verdade dos fatos. “Vou ser realmente julgado pelo Supremo Tribunal Federal, basicamente, por apologia ao estupro.Foi uma retorsão o que eu falei para ela [deputada], foi um ato-reflexo. As desculpas que eu peço é para a sociedade, que foi desinformada sobre a verdade dos fatos”, disse Bolsonaro. 

Voto do relator

Relator do caso, o ministro Luiz Fux argumentou que as falas de Bolsonaro representam desprezo pelas vítimas de estupro, no sentido de que teriam sido violentadas porque mereceriam. Em seu voto, ele também citou frases de apoiadores do deputado publicadas em redes sociais afirmando que estuprariam a deputada. 

“A manifestação teve o potencial de incitar homens a vulnerar a fragilidade de outras mulheres […]. ‘Se ela merecesse, eu estupraria’. É o que está dito em suas palavras implicitamente. Então, deve haver merecimento para ser vítima de estupro. As palavras do parlamentar podem ser interpretadas no sentido de que uma mulher não merece ser estuprada se é feia. Estaria em posição de avaliar quando a mulher mereceria ser estuprada. Atribui às vítimas merecimento do sofrimento que lhe seja infligido”, afirmou. 

Acompanharam Fux os ministros Edson Fachin, Rosa Weber e Luís Roberto Barroso.

Único ministro a divergir, Marco Aurélio Mello lembrou que a fala de Bolsonaro foi dada em resposta a Maria do Rosário, que o chamou de estuprador, quando ele defendia penas maiores para condenados por violência sexual. 

“Precisamos considerar o contexto, que inicialmente se apontou que Bolsonaro seria um estuprador. E ele tão somente se defendeu. Se defendeu estarrecido de ser enquadrado como tal e acrescentou que não a estupraria. […] O que tivemos aqui foi arroubo de retórica”, afirmou.


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