Política

Afonso Guimarães fala sobre leis de acordo e fundo de combate à improbidade administrativa e à corrupção

ENTREVISTA COM O PROMOTOR DE JUSTIÇA AFONSO GUIMARÃES, TITULAR DA PROMOTORIA DE DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO AMAPÁ


 Em entrevista exclusiva concedida ao programa Togas&Becas (DiárioFM 90.9) na manhã deste sábado (06), ancorado pelo advogado Helder Carneiro, o titular da Promotoria de Defesa do Patrimônio Público (Prodemap) do Ministério Público do Amapá (MP-AP), promotor de justiça Afonso Guimarães falou sobre o Projeto de Lei que institui o Fundo de Combate à Improbidade Administrativa e à Corrupção (Fundiac), de iniciativa do MP, aprovado recentemente pela Assembleia Legislativa (Alap) e que aguarda sanção do governador Waldez Góes. Ele explicou que o fundo será constituído de dotações orçamentárias e de créditos adicionais suplementares provenientes de multas decorrentes de acordos firmados com investigados ou processados pela prática de atos de improbidade administrativa, ou de multas diversas fixadas pela Justiça, além de doações de pessoas físicas ou jurídicas. Esses recursos, segundo o promotor, também poderão ser acessados por outras instituições que atuam no âmbito de combate à corrupção, como a delegacia fazendária.
 
– Na prática, como e por quem esse fundo vai ser gerido?
O Funciac será gerido pelo Conselho Superior do Ministério Público do Estado, constituído pelos procuradores de justiça e presidido pelo procurador geral, que estabelecerá suas diretrizes e prioridades, além de aprovar os planos de aplicação e projetos para a realização das despesas no combate à corrupção e à improbidade administrativa. A criação desse fundo surgiu da necessidade de captação de mais recursos para apoiar o Ministério Público e outras instituições que trabalham no combate à corrupção e à improbidade administrativa, fazendo o aparelhamento necessário com tecnologia da informação, inclusive na área de perícia, com treinamentos e cursos de capacitação, aumentando, assim, a capacidade financeira do Ministério Público nessa área.
 
– O Estado tem competência para legislar sobre o tema, inclusive no que diz respeito à criação desse fundo?
Sim, porque se trata de um fundo local, e todos os entes da federação têm capacidade para legislar sobre a criação de qualquer fundo que entender, desde claro, com base lei; não há nenhuma vedação quanto à capacidade legislativa do estado.
 
– Quando a Lei entrará em vigor?
O procurador geral do Ministério Público está empenhado pessoalmente no assunto, e aguarda a sua tramitação. Como os deputados estaduais já aprovaram, agora só dependende da sanção governamental.
 
– Como e onde esses recursos serão aplicados, objetivamente?
Um dos seus artigos do projeto de lei prevê que o fundo tem finalidade de apoiar e custear ações, projetos e inciativas na área de combate à corrupção. Os recursos serão exclusivamente para esse fim; só que cada projeto, cada iniciativa será analisada pelo Conselho Superior do Ministério Público, e caberá ao colegiado deliberar sobre cada projeto e editais. Os recursos ficarão numa conta vinculada ao Ministério Público, mas também apoiarão e custearão projetos e atividades de quaisquer instituições públicas que trabalham no combate à improbidade administrativa e à corrupção, como a delegacia fazendária e órgãos que atuam na área de perícia, por exemplo.
 
– É de domínio público que depois da propositura da ação são muitas as dificuldades para o seu prosseguimento. O senhor acredita que através de acordos de delação premiada haverá mais celeridade nas investigações e na tramitação de processos?
Certamente, porque atualmente a tendência do Ministério Público brasileiro é estabelecer diretrizes, orientações e recomendações para que seus integrantes trabalhem de maneira proativa, tentando evitar que se concretize ilícitos para depois entrar com a investigação; o ideal é se antecipar a isso; o foco do trabalho vai nessa direção, porque é possível pactuar acordo visando o ressarcimento dos cofres públicos; o objetivo é evitar o que ainda acontece muito, isto é, se entra com ação de improbidade, passam anos e anos e no final, apesar da sentença favorável não se consegue trazer os recursos de volta para os cofres públicos exatamente por causa da demora na tramitação da ação. Nós queremos nos antecipar a isso, abreviar esse tempo…
 
– Advogados que atuam na área criminal sempre encontraram muitas dificuldades para a homologação de propostas de delação. Agora vai melhorar?
Vai, com certeza. A gente observa que a legislação da colaboração premiada melhorou muito; essa legislação é antiga, mas foi regulamentada só em 2013; só que agora a lei mais recente trouxe um procedimento de como se deve proceder para se concretizar acordo de colaboração; por outro lado, a Lei de Improbidade, de 1992, ficou parada no tempo e não se modernizou;e ainda tem o seu artigo 17, paragrafo 1º, que veda acordo de delação na improbidade administrativa, que agora não tem mais harmonia com a lei penal, porque não é possível que uma determinada pessoa reduza sua pena com delação e até mesmo perdão judicial em crimes hediondos, mas haja essa vedação na improbidade administrativa. Nesse caso a Lei fica manca.
 
– Como funciona o acordo de colaboração premiada?
Quando se trata de condenação por prática de corrupção e improbidade administrativa há várias sanções penais, como a inelegibilidade, a proibição de contratar com o Poder Público, o ressarcimento do que foi subtraído dos cofres públicos e multa; a novidade no Amapá é que resolvemos regulamentar a questão, mas acordos estão sendo feitos no Brasil inteiro.
 
– Essas penas são conjuntas ou isoladas?
É importante destacar que temos que deixar uma liberdadr psra negociar juridicamente alguma coisa. O ressarcimento é inegociável, porque o infrator tem que ressarcir o que foi subtraído, mas as demais penas serão negociadas de acordo com cada caso concreto. A Resolução do Ministério Público diz que o acordo será feito necessariamente com o ressarcimento e mais uma das penalidades previstas na Lei; dependendo do caso, negocia-se a multa, a inelegibilidade, a perda da função pública ou a vedação de negociar com o Poder Público; uma dessas penas, portanto, será cumulada com o ressarcimento.
 
– A sociedade se inquieta porque, para os leigos, a pessoa rouba dinheiro público, faz acordo com o Ministério Público e depois tudo fica do mesmo jeito…
Não, não, é diferente. Jamais o Ministério Público defenderia a ideia de transformar ato de improbidade, de roubar dinheiro publico numa profissão, ou como se fosse um financiamento. A Lei diz que tem que devolver o dinheiro roubado, mas o juiz pode determinar várias penas. O que vai haver na delação premiada é a negociação dessas penas; na esfera penal também tem reflexos, como no peculato, por exemplo; para que o acordo aconteça existem algumas diretrizes e exigências básicas, como colaborar com os procedimentos de investigação ou processo judicial. Para existir acordo é preciso devolver o dinheiro roubado e colaborar, contar como foi e apontar os demais partícipes, senão não tem acordo. Não haverá nenhuma consequência negativa por causa de acordos; pelo contrário, nós queremos e é através de acordos que vamos recuperar o patrimônio público.
 
– Se não tivesse acordo de delação não teríamos como temos hoje um grande número de empresários e políticos presos…
Claro, são institutos que revolucionaram. Como eu já disse antes, e reforço agora, a delação premiada não é coisa nova; acontece que somente em 2013 ela foi regulamentada, e apenas recentemente se chegou aos grandes figurões da República; antes só se fazia delação com pequenos criminosos, e por isso não aparece na televisão, a imprensa não divulgava; mas acontece com alguém que tem poder aquisitivo imenso, poder politico fantástico, aí sim, isso aparece. A sociedade está vendo que a delação é um instituto fantástico, que veio ajudar para que as instituições possam avançar nas investigações, como também veio para atender o interesse daquela parte que cometeu ilícito, permitindo que o infrator possa colaborar e se adequar a um comportamento ético. A delação veio em beneficio de todo mundo, principalmente da sociedade.
 
– Antes a sociedade cobrava muito o fato de que as prisões aconteciam, mas o dinheiro sumia, isto é, não voltava para os cofres públicos…
Esse é o fundamento principal da ação proativa: Trazer de volta o dinheiro subtraído. A investigação não é fácil nessa área porque quando o sujeito entra numa casa e rouba aparelho de TV, botija de gás ou um celular num ponto de ônibus a vítima é a primeira a investigar e ajuda muito a polícia, inclusive às vezes apontando quem cometeu o roubo; já no crime de corrupção a vítima é silenciosa, não fala; por isso temos que contar com a Inteligência, dos meios adequados para elucidar o crime; com a delação premiada, entretanto, se consegue avançar muito.

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