Política

Decisão que impõe aval do Congresso para afastamento de parlamentares vale também para o Amapá

Garantia da independência entre os Poderes e da imunidade parlamentar prevaleceram no julgamento da última quarta-feira (11).


Ramon Palhares
Correspondente em Brasília
 
Para analistas políticos, sessão do Senado que vai decidir sobre afastamento de Aécio Neves (PSDB/MG) será tumultuada, porque o senador mineiro precisa do voto de 41 dos 81 senadores para voltar à atividade parlamentar e já se articula nos bastidores para que a votação seja secreta com o objetivo de não expor os parlamentares à insatisfação popular faltando menos de um ano para as eleições.
 A decisão do Pleno do Supremo Tribunal Federal (STF) de que o afastamento de deputados e senadores do mandato, a prisão e a imposição de medidas cautelares devem ser submetidos às Casas Legislativas às quais pertencem ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5526 na última quarta-feira (11) beneficia diretamente os deputados estaduais de todo o país, inclusive do Amapá, porque ratifica o artigo 53 da Constituição Federal e dispositivo das constituições dos estados que garante a independência entre os Poderes e a imunidade parlamentar. Na Constituição do Amapá esse princípio está previsto no Art. 96, parágrafos 1º ao 5º.
Três ministros (Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello) votaram inicialmente no sentido de que tanto medidas cautelares de afastamento do mandato quanto recolhimento noturno não podem ser aplicadas a parlamentares, mas foram minorias e em seguida eles cederam, concordando que a suspensão do mandato deve ser submetida às Casas Legislativas em 24 horas, mas medidas cautelares só podem ser revistas se inviabilizarem o exercício da atividade parlamentar.
Os ministros Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski também votaram neste sentido, isto é, que o afastamento e o recolhimento de parlamentares durante a noite só podem ser impostos em caso de crime inafiançável ou “em situações de superlativa excepcionalidade”. O placar ficou empatado (5 a 5) e coube à presidente do STF Cármen Lúcia proferir o voto de minerva. Ela concordou que a suspensão do mandato deve ser submetida ao Legislativo. O STF tomou essa decisão numa ação movida em maio de 2016 pelos partidos PP, PSC e Solidariedade, argumentando que a Câmara e o Senado devem deliberar sobre a suspensão do mandato de parlamentares em contraponto à decisão do Supremo de suspender o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) que na época era o presidente da Câmara.
De acordo com o entendimento dos ministros a decisão sobre a imposição de medidas será do próprio STF, caso a caso, mas, essas medidas só serão submetidas à decisão final do Legislativo se inviabilizar o exercício do mandato. Nesse caso, deputados ou senadores deliberarão por maioria sobre a aplicação ou não das sanções, que podem ser: afastamento do mandato, recolhimento noturno domiciliar, proibição de contato com determinadas pessoas, restringir visitas a determinados lugares e de deixar o país.
 
Previsão de confronto
No dia 26 de setembro a 1ª Turma do Tribunal aplicou a mesma medida ao senador Aécio Neves (PSDB-MG) e determinou o seu recolhimento domiciliar noturno no inquérito em que o parlamentar é investigado por causa das delações premiadas de executivos da JBS. Agora caberá ao plenário do Senado decidir se mantém ou derruba o afastamento de Aécio. A votação está prevista para ocorrer na sessão que ocorrerá na próxima terça-feira (17).
No entendimento de analistas políticos ouvidos pela reportagem do Diário do Amapá em Brasília a sessão será tumultuada, inclusive com possibilidade de confronto com o STF, porque a decisão do Supremo teve como pano de fundo a garantia da independência entre os Poderes e da imunidade parlamentar. Eles argumentam, entretanto, que a medida cautelar de recolhimento domiciliar noturno imposta ao senador mineiro, além de inviabilizar a sua atividade parlamentar porque grande parte das sessões do Congresso Nacional se prolonga madrugada adentro, também é uma interferência direta do Judiciário no Legislativo.
Outro ponto de atrito previsto entre os senadores é o fato de que, como Aécio Neves precisa do voto de 41 dos 81 senadores para voltar ao Senado, parlamentares se articulam nos bastidores para que a votação seja secreta com o objetivo de não expor os parlamentares à insatisfação popular faltando menos de um ano para as eleições. Esse embate, inclusive, já começou, porque um grupo liderado pelo senador Randolfe Rodrigues (REDE) ameaça recorrer ao Supremo para que a votação seja aberta, o que acirrar ainda mais a relação entre o Judiciário e o Legislativo.
 
Operação Lava Jato sob risco
O senador Randolfe Rodrigues (REDE) critica duramente a decisão do STF porque, segundo ele, como é para o Legislativo que escoa a grande maioria das denúncias, essa decisão também fere de morte a Operação Lava Jato, porque autores de crimes podem passam a ficar protegidos pelo manto do corporativismo. Ao comentar a declaração do senador Cristóvão Buarques (PPS-DF) de que a decisão do STF “foi acertada e até republicana”, mas que ele teme as suas conseqüências “por estar se criando um espírito de corpo no Congresso Nacional” pela volta do senador Aécio Neves (PSDB-MG) ao Senado na sessão prevista para a próxima terça-feira, o senador do Amapá disse que não concorda com esse entendimento.
“Eu respeito muito o Cristóvão, assim como também eu respeito essa opinião dele, mas divirjo frontalmente dela, porque esse resultado apertado do Pleno do Supremo escancarou as portas da possibilidade da impunidade no Brasil. (Ao dar o voto de desempate), a presidente Cármen Lúcia claramente tentou fazer algo incompatível, isto é, a mediação do voto do relator Edson Fachin e a opinião contrária de outros cinco ministros; seria a mesma coisa que tentar compatibilizar água e óleo no mesmo copo, porque são incompatíveis, não se misturam. Essa decisão abre uma perspectiva terrível para a impunidade no Brasil, porque abre dos tipos de cidadãos, os comuns, que estão abaixo da lei e alguns privilegiados, que passam a ficar acima da lei. É uma decisão que escancara a porta da impunidade e, no caso da Lava Jato compromete totalmente a Operação, porque a quase totalidade das investigações chegam ao Congresso”.
Apesar da grande base parlamentar do Palácio do Planalto, Randolfe demonstra otimismo com a possibilidade de rejeição da segunda denúncia contra o presidente Michel Temer (PMDB) e a desautorização pelo senado das medidas cautelares impostas ao senador Aécio Neves (PSDB): “A situação de ambos é muito difícil. O Aécio precisa de 41 votos para se livrar das medidas cautelares e retornar ao Senado, isso a menos de um ano da eleição, e o parlamentar tem que pensar muito bem antes de expor negativamente suspendendo uma decisão do Supremo, que com base em provas diagnosticou que senador atuou para obstruir investigação. Eu advogo a manutenção dessas medidas, porque se uma Turma do Supremo a partir de denúncia da Procuradoria Geral da República (PGR) identificou que ele obstruiu a investigação qual a razoabilidade para suspendermos essa decisão? No caso do Temer o jogo não está terminado porque os instrumentos que ele tinha para comprar votos na primeira denúncia não tem mais agora; se a fonte não secou está mais vazia, tanto que está havendo dissidências na base política do governo, com vários parlamentares se manifestando favoráveis ao afastamento; se tivéssemos um pouco de pressão nas ruas eu tenho certeza que haveria eco na Câmara, mas lamentavelmente não está havendo”.
 
O que dizem a Constituição Federal e a Constituição do Amapá
A suspensão das funções parlamentares é uma das medidas previstas no Código de Processo Penal (CPP) que substituem a prisão preventiva (decretada antes do julgamento sobre a culpa da pessoa e usada, em geral, a fim de evitar que ela use o cargo para atrapalhar investigações em andamento).
No julgamento desta quarta-feira prevaleceu a tese em favor da “independência entre os poderes” e da “imunidade parlamentar”. Esses princípios da Constituição buscam evitar interferência indevida do Judiciário sobre o Legislativo e proteger deputados e senadores, pela condição de representantes políticos eleitos, que automaticamente arremetem aos dispositivos das constituições dos estados.
Com redação dada pela Emenda Constitucional nº 35, de 2001, a Constituição Federal determina:
“Art. 53. Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.
§ 1º Os Deputados e Senadores, desde a expedição do diploma, serão submetidos a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 35, de 2001)
§ 2º Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão.
§ 3º Recebida a denúncia contra o Senador ou Deputado, por crime ocorrido após a diplomação, o Supremo Tribunal Federal dará ciência à Casa respectiva, que, por iniciativa de partido político nela representado e pelo voto da maioria de seus membros, poderá, até a decisão final, sustar o andamento da ação.
§ 4º O pedido de sustação será apreciado pela Casa respectiva no prazo improrrogável de quarenta e cinco dias do seu recebimento pela Mesa Diretora.
§ 5º A sustação do processo suspende a prescrição, enquanto durar o mandato”.
 
Essa mesma previsão legal está prevista no Art. 96 da Constituição do Estado do Amapá, com redação dada pela Emenda Constitucional nº 35, de 21.03.2006:
“Art. 96. Os Deputados são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.
§ 1º Os Deputados, desde a expedição do diploma, serão submetidos a julgamento perante o Tribunal de Justiça do Estado do Amapá.
§ 2º Desde a expedição do Diploma, os Deputados não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Assembleia Legislativa, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão.
§ 3º Recebida a denúncia contra Deputado, por crime ocorrido após a diplomação, o Tribunal de Justiça dará ciência à Assembleia Legislativa, que, por iniciativa de partido político nela representado e pelo voto da maioria de seus membros, poderá, até a decisão final, sustar o andamento da ação.
§ 4º O pedido de sustação será apreciado pela Assembleia Legislativa no prazo improrrogável de quarenta e cinco dias do seu recebimento pela Mesa Diretora.
§ 5º A sustação do processo suspende a prescrição enquanto durar o mandato.

Deixe seu comentário


Publicidade