Política

Juiz indefere acordo de Kaká Barbosa com o MP para devolver mais de R$2,2 milhões

O processo é decorrente da Operação Eclésia e apura crime de apropriação indébita de mais de R$ 2 milhões


Paulo Silva
Editoria de Política

O juiz André Gonçalves de Menezes, da 4ª Vara Cível e de Fazenda Pública de Macapá, indeferiu o pedido de homologação de acordo formulado entre o deputado estadual Kaká Barbosa (PR), presidente da Assembleia Legislativa do Amapá (Alap), e o Ministério Público estadual.

“Tendo em conta que o acusado (deputado Kaká Barbosa) oferece bem imóvel em garantia a acordo cuja propriedade é registrada em nome de terceiras pessoas; que o pedido formulado pelo próprio Ministério Público do Amapá (MP-AP) suscita dúvida, inclusive, quanto à origem lícita dos valores que seriam utilizados para adimplir o pacto em caso de homologação; tendo em vista a vultosa quantia – mais de R$ 2,2 milhões – cuja apropriação foi confessada nos autos, indefiro o pedido”, diz o magistrado na decisão.

O juiz, que no primeiro momento chegou a homologar o acordo, determinou a expedição de ofício ao Ministério Público Federal (MPF) e à Receita Federal do Brasil (SRF) para que tomem conhecimento dos fatos narrados no processo e adotem as providências que entenderem pertinentes. No ofício encaminhado devem ser anexadas cópias integrais do processo administrativo que culminou com a realização do acordo de colaboração do acusado (Kaká Barbosa), da petição inicial do processo e da decisão.

O processo, decorrente da Operação Eclésia, trata de pedido de homologação de acordo em improbidade administrativa formulado pelo Ministério Público do Amapá e o réu José Carlos Carvalho Barbosa (Kaká Barbosa).

Nos autos da Ação Penal Originária 698 de 2015, o MP denunciou Kaká Barbosa (e outros acusados) por diversos ilícitos criminais. No processo um dos crimes imputados ao réu é associação criminosa (art. 288 do CP). No acordo entabulado entre ele e o Ministério Público não existe a identificação dos demais infratores e tampouco esclarecimento das infrações criminosas por ele praticadas.

De acordo com o juiz, no caso dos autos não existe a identificação dos demais envolvidos na infração. Não existe também a obtenção célere de informações e documentos que comprovem o ilícito sob apuração, afinal, nos autos, apuram-se atos dolosos de improbidade administrativa, porém, o acusado, com a concordância do MP, confessa ter praticado atos culposos. “Não posso, portanto, dizer que houve contribuição para apuração dos ilícitos apurados”.

“Em nenhuma linha deste “acordo” o acusado admite a participação dos ilícitos e coopera plena e permanentemente para a solução do caso. Ao contrário, confessa (e não colabora) a prática de ilícito culposo enquanto os fatos apurados neste processo versam sobre ilícitos (e crimes) dolosos. Não temos, portanto, acordo de leniência nestes autos”, registrou o juiz.

André Gonçalves registra que o MP, assim como os demais órgãos públicos, deve obediência ao princípio da legalidade, somente podendo praticar atos quando autorizados em lei. Segundo ele, ficou demonstrado, de forma latente, que o “acordo” trazido pelo MP não se enquadra em nenhuma das hipóteses legais. Apesar de tentar fazer parecer que existe colaboração, como se nota da redação da cláusula III do acordo “Da colaboração do proponente”, não existe qualquer contribuição do mesmo para elucidar os fatos apurados nos autos.

O mencionado “acordo” busca tratar confissão como se colaboração premiada fosse. Por óbvio que o réu, ao celebrar colaboração, confessa fatos que lhe são desfavoráveis e contribui com o estado para solução das investigações, diz trecho da decisão.

Suspeita sobre os recursos

– De acordo com os fatos narrados, José Carlos Carvalho “Kaká” Barbosa teria auferido vantagem financeira indevida, porquanto recebeu o ressarcimento de valores, embora não tenha realizado os respectivos gastos. O MP afirmou que houve prejuízo ao erário, na medida em que foi pago dinheiro público sem a contraprestação do serviço; além de restar evidenciada a violação aos princípios da Administração Pública já que a conduta atentou contra a moral, violando o dever de honestidade, legalidade e lealdade à Assembleia Legislativa do Amapá.

A confissão não vincula o magistrado, que a examinará como qualquer outro meio de prova, dando-lhe o valor que, no caso, entender adequado (art. 371 do CPC).

“Em verdade, entendo que a comprovação da origem lícita dos recursos utilizados para pagamento deste acordo, caso o mesmo fosse homologado, deveria ser pressuposto e não consequência da sua assinatura. Pensar o contrário seria permitir, por hipótese, que o acusado realize o pagamento de um acordo com recursos de origem ilícita, fato que não se pode permitir”, finalizou o juiz ao indeferir o acordo.

Entenda o caso

As provas dos autos principais do processo apuraram o valor original recebido indevidamente por Kaká Barbosa em R$1.056.538,33. Corrigido, esse valor subiu para R$ 2.254.196,72.

De acordo com o MP, não há dúvida que restou absolutamente comprovado nos autos, as condutas ilícitas, na integralidade, perpetradas pelo réu Kaká Barbosa, juntamente com os demais réus, consistente em se utilizar de notas fiscais falsas, fabricadas e inserção de dados falsos com as únicas finalidades de justificar os gastos com as verbas indenizatórias do exercício parlamentar, se locupletar e dissimular sua utilização do montante à época de R$ 1.269.700,65, de acordo com as cópias dos cheques e demais documentos.

Na proposta de acordo, o deputado Kaká Barbosa reconhece que cometeu o ato de improbidade administrativa, conforme constam nos autos da ação civil pública, assumindo que recebeu o valor descrito, e o compromisso de restituir 12 parcelas mensais de R$100 mil e 96 parcelas de R$10 mil, a serem pagas no prazo estipulado nos termos do acordo.

Além da sanção de ressarcimento ao erário, Kaká também foi multado em uma parcela de R$ 21.541,96; e outras 39 parcelas no valor de R$5 mil cada. O valor da multa seria depositado no Fundo de Combate à Improbidade Administrativa criado pela Lei estadual 2.196/2017.

Consta dos autos, a vinculação em garantia de um terreno medindo 5.510 metros quadrados, avaliado em R$ 2 milhões, onde funciona uma marmoraria de propriedade de Kaká Barbosa.


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