Dom Pedro Conti

Os fofoqueiros


Junto aos fofoqueiros, qualquer homem é destinado ao pior de qualquer coisa que faça. Se é pobre, ele é um mau administrador. Se é rico, é porque roubou ou teve sorte. Se está na política, o faz só por interesse. Se está fora disso, é porque não tem coragem de assumir qualquer cargo. Se não faz caridade, é avarento; se é generoso, o faz para aparecer. Se participa da Igreja, é só fachada. Se não es tá em nenhum grupo religioso, não tem moral, não teme a Deus. Se manifesta comoção, é um molenga. Se modera os seus sentimentos, não tem sangue nas veias. Se morre jovem, tinha um grande futuro pela frente. Se chega à velhice, errou muita coisa, devia ter feito diferente. E assim por adiante. Fofocar sobre a vida alheia sempre será a atividade mais popular em qualquer lugar do mundo. Ninguém escapa. Não podia ser diferente com Jesus; mais ainda quando ele falava e agia de maneira tão nova e surpreendente. Dizia, nada menos, que tinha descido do céu!

A página do evangelho deste domingo é mais um trecho do capítulo 6 de João e se inicia com as murmurações do povo a respeito da origem familiar de Jesus. Essa dúvida é legítima; quem nos garante que ele disse, e continua dizendo, a verdade? Será mesmo o Filho de Deus Pai? Ou será o filho natural de Maria e José? Foi mesmo o Divino Pai Eterno que o enviou entre nós? Essas dúvidas nunca poderão ser resolvidas com explicações simplesmente humanas e racionais. Com efeito, se estivéssemos falando de coisas ao alcance dos nossos métodos de indagação e pesquisa, antes ou depois, daríamos conta das respostas. Mas estamos refletindo sobre uma outra realidade completamente diferente. Precisamos admitir que, quando buscamos compreender as coisas de Deus, os métodos e os critérios não poderão ser somente aqueles da nossa inteligência e das nossas ciências. O que nós sabemos mesmo de Deus? Quando pretendemos falar dele, balbuciamos como crianças que imaginam o que nunca viram e experimentaram.

Quem sabe bem de Deus é o próprio Deus. Não serão verdades contra a nossa inteligência. Deus não quer nos fazer de bobos incapazes de compreendê-las, mas serão tão grandes que, simplesmente, estarão sempre além das nossas capacidades. Nós cristãos acreditamos que Deus não quis ficar longe de nós e nem ficar escondido. Jesus diz que ele mesmo, Deus Pai, deve ser escutado, porque será ele a ensinar aos disc&i acute;pulos como e em quem acreditar (Jo 6,44-45). Somente pela luz da fé, nós podemos enxergar um pouco das maravilhas de Deus. Para o evangelista João, a missão do Filho foi, justamente, a de revelar o Pai (Jo 1,18). Nós, criaturas, podemos conhecer algo de Deus somente se nos deixarmos conduzir por ele mesmo. “Quando se completou o tempo previsto” (Gl 4,4), Deus Pai não quis mais se servir de “mediadores”. Eles falavam daquilo que não tinham visto. Agora, “só aquele que vem junto de Deus viu o Pai” e pode falar dele e por ele. Pode explicar, tornar visível como Deus é, o que pensa e quer de nós, seus filhos. Esta é a insuperável novidade da fé cristã e, ao mesmo tempo, a nossa dificuldade. Por isso, a fé sempre será um dom do próprio Deus. Um dom que podemos pedir e agradecer muito se dermos conta de acolhê -lo.

Para o evangelista João, porém, tem mais ainda para ser entendido e acolhido. O que tem a ver a “revelação” do Pai por parte do Filho presente na carne humana de Jesus com comida, pão que desce do céu, pão da vida, promessa de uma vida plena, além das limitações da natureza e do tempo que passa? O que Jesus veio manifestar não foram e nunca serão somente “verdades” ou “doutrinas”. Algo s&oac ute; para a nossa inteligência. Elas servem para explicar um pouco a indizível grandeza de Deus. É o alimento, que o próprio Jesus nos dá, que é ele, feito pão, carne, vida, doada na cruz, que nos permite entrar na comunhão plena com Deus e nos faz participar do seu amor infinito. A Eucaristia é o penhor de Vida Eterna que Jesus nos deixou, laço tão vital e amoroso que nem a morte poderá romper. A fé nos faz confiar em Deus e o silêncio nos conduz à contemplação. As palavras humanas nunca explicam tudo. O melhor não precisa de palavras. Palavras a mais podem ser murmuração ou…fofocas inúteis.