Nilson Montoril

Torre da Vigia do Rio Curiaú


Em 1740, o Governador do Maranhão e Grão Pará, Capitão General João de Abreu Castelo Branco, deferiu uma proposta do Capitão Antônio Gonçalves para que construísse as suas expensas, uma fortificação na foz do Rio Curiaú, querendo apenas ser o seu comandante e superintendente dos serviços de fortificação do Grão Pará, com posto vitalício. Como o deferimento implicava em despesas para a Coroa Portuguesa, o governador submeteu a questão à apreciação do Rei D. João V. Através da Carta Régia de 9 de março de 1740,o monarca não acatou a proposta e alegou que a Coroa não poderia correr o risco de ver repetir-se o erro de Francisco de Melo Falcão,que no século XVII se obrigara a construir quatro fortalezas no interior da colônia, executando as obras com imperfeições, utilizando material de má qualidade e sem bom acabamento.

Em Macapá já existia um reduto fortificado erguido em 1738, que se manteve operando regularmente. A obra sonhada pelo Capitão Antônio Gonçalves foi construída em 1761, na foz do rio Curiaú, sobre um estrado de madeira, com a finalidade de fiscalizar um extenso trecho do rio Amazonas, que não era avistado do reduto fortificado da Vila de Macapá. Qualquer aventureiro, que navegasse no sentido da nascente do grande caudal, o faria protegido pela mata e só seria notado quando sua embarcação alcançasse a enseada próxima a Macapá. Em 1761, ainda não havia sido edificada a Fortaleza de São José e a área sobre a qual ela está assentada era ocupada por um Forte de Faxina, construído em três meses, entre o final de abril e o dia 31 de julho de 1761, pelo engenheiro Gaspar João Geraldo Gronfelds, época em que o Grão Pará era governado pelo Capitão General Manuel Bernardo de Melo e Castro.

A função primordial da Torre de Vigia do Curiaú consistia em avisar a guarnição de Macapá sobre a aproximação de qualquer embarcação pela margem esquerda do Amazonas. O aviso seria dado pelo disparo de um tiro de canhão, como acontecia em outras vilas e cidades do Brasil. A prática durou até o final do ano de 1761, por ser julgada alarmista. Ao ouvir o som do disparo, o aventureiro retrocedia e não podiam ser perseguidos, haja vista que, na Vigia do Curiaú não havia barco artilhado.

Os canhões foram retirados e transportados para o Forte de Faxina. Outros procedimentos foram adotados. Durante o dia, uma bandeira seria hasteada. À noite, os soldados da Torre de Vigia soltariam foguetes. Sempre que a guarnição da Torre de Vigia desse um sinal, durante o dia ou à noite, um mensageiro saia à cavalo com destino a Macapá e outro cobria o percurso fluvial na canoa. O contato terrestre entre o Forte de Faxina e a Torre de Vigia do Curiaú era feito através de uma estrada vicinal,por onde,freqüentemente cavalgavam soldados que procediam incursões no arredor norte da Vila de Macapá. Os militares também caçavam escravos fugidos. O percurso por terra se estendia até o local onde despontou a fazenda de criação de gado do Alferes Manuel Antônio de Miranda, hoje identificada como Curiaú de Dentro. Curiaú é um vocábulo indígena, que significa o “comedouro dos curiás”, uma espécie de patos pequenos.

O vocábulo curuá também designa um pato com as mesmas características. Para completar o circuito, os soldados utilizavam um batelão, manejando remos e varejões. A Vigia compreendia uma casa para o corpo da guarda e uma guarita, edificada em cima de um banco de areia, numa distância de 70 braças, equivalente a 150 metros da margem. A ligação entre os dois pontos era favorecida por uma ponte de madeira. Da vigia observava-se longo trecho do Rio Amazonas, que não se vislumbrava do Forte de Faxina, em Macapá.

O comando da Vigia estava entregue a um cabo de esquadra, que tinha sob ordens alguns soldados. As instruções para emissão de avisos à Macapá foram baixadas pelo Coronel Nuno da Cunha Ataíde Verona, comandante da Praça de Macapá, a 26/10/1762. A resposta do aviso ocorreria, de dia, com o hasteamento de uma bandeira e à noite, com um tiro de canhão. Tanto a casa da guarnição, quanto a guarita das sentinelas, ficavam sobre palafitas, com altura suficiente que impedisse serem atingidas pela maré. A Vigia foi mantida em operação até 1908, quando o governo brasileiro resolveu desativar a Fortaleza de São José.Esse relato deixa bem claro o quanto é fantasiosa a propagação de que o Curiaú abrigou um quilombo.