Pe. Claudio Pighin

A alma do ser humano (2ª parte)


Semana passada, vimos os fundamentos bíblicos sobre a alma. Agora quero fazer algumas considerações sobre a concepção da alma na teologia cristã dos primeiros séculos. No início da era cristã, dava-se muito mais atenção à religião e à ética do que hoje. A teologia cristã sustentou a unidade entre o corpo e a alma. Quem mais se destacou nessa unidade do ser humano? Com certeza, temos os doutores da Escola de Antioquia. Entre eles, temos Justino, do segundo século depois de Cristo. Ele afirmava, de maneira categórica, que o ser humano é racional e composto tanto de alma e como de corpo, fazendo uma só coisa. Sempre do segundo século, temos Atenágoras que defende a imortalidade da alma e diz que o corpo humano é adaptado a ela no momento da criação. Deus, segundo esse autor, criou a alma e o corpo unidos. Também o testemunho de Ireneu de Lião (130-202) confirma que o ser humano completo é feito de corpo e alma.

Outro autor, Gregório de Nice (335-395), diz o seguinte: “Nem é alma antes do corpo, nem é o corpo antes da alma, mas um só é o princípio de ambos, segundo uma lógica fundada na vontade de Deus” (Hominis opificio). Santo Ambrósio (354-430) falou que o ser humano acha na sua alma a totalidade completa da essência humana. Santo Agostinho também mantem unidos corpo e alma. Intelecto e corpo fazem uma só coisa do ser humano, sem diferença nenhuma. Porém, a alma é uma substância racional que ‘governa’ o corpo, ou também o ser humano é uma alma racional que usa um corpo mortal.

A experiência sensível, no final, não é própria do corpo, mas da alma através do corpo. Assim sendo, Santo Agostinho mostra a capital importância da alma na vida humana. No período patrístico, o Magistério da Igreja confirmou a comum origem divina do corpo e alma, fazendo parte do plano divino sobre a criação. Ficou claro que a alma é criada por Deus de maneira direta. A unidade do corpo e da alma, segundo o Magistério da Igreja, faz parte da unicidade do ato criativo de Deus, “criador de todas as coisas, visíveis e invisíveis”. Na idade média, Boaventura (1217-1274) diz que a imagem e a semelhança de Deus, assim como a imortalidade humana, pertencem em primeiro lugar à alma: o corpo, que pertence por sua natureza ao mundo animal, participa da imortalidade da alma.

No grande Tomás de Aquino (1225-1274), ‘a alma, como o corpo, pertence à ordem da substância, mas qual substância incompleta’. A plenitude, a integralidade pertence ao ser vivente inteiro, como união e síntese dos dois princípios constitutivos de alma e corpo. Encontramos na Suma Teológica, parte primeira, onde São Tomás demonstra a incorporeidade da alma e a sua união com o corpo: “O princípio intelectual que se chama mente ou intelecto tem uma atividade pela qual o corpo não participa. Agora não pode operar por si senão aquilo que subsiste por si (…). Portanto, a alma humana, que se chama também intelecto ou mente, é algo de incorpóreo e de subsistente”.

Com Tomás de Aquino, temos uma ‘unificação da essência da atividade humana’. Para o teólogo, a alma é, sim, uma substância, mas é composta não de forma e matéria, mas de uma essência, isto é, aquela de ser uma forma espiritual, e de um ato de ser que lhe provem diretamente do ato criativo de Deus. Além do mais, visto que a alma não tem nenhuma materialidade na própria estrutura, ela é simples e incorruptível. Enfim, o Concilio Lateranense V do ano 1513 diz que não existe uma só alma universal, comum a todos os seres humanos e unida acidentalmente e temporaneamente a cada um deles, mas é confirmada a tese de Tomás de Aquino que a alma tem a forma de corpo e que é imortal. Concluindo, nesta segunda parte do artigo, podemos reconhecer a importância da alma como plenitude do ser vivente. No próximo artigo darei continuidade sobre a alma humana na filosofia moderna.