Pe. Claudio Pighin

A alma do ser humano (4ª parte)


Nos últimos séculos, diversos teólogos católicos e protestantes quiseram dar uma interpretação inovativa a respeito da alma, para dialogar com a ciência. Na realidade, essas duas formas de saber, teologia e ciência, sempre tentaram se aproximar, embora tivessem, ao longo dos tempos, conflitos e harmonias. Principalmente nos últimos tempos, teologia e ciência se caracterizaram pelo diálogo como necessidade de compreender melhor a realidade. Assim foi com a alma. Um dos mais notáveis teólogos foi, sem dúvida, Karl Rahner (1904-1984). Sacerdote jesuíta, ele participou como teólogo do Concílio Vaticano II e criou a famosa revista Concilium.

Rahner quis, em poucas palavras, ir ao encontro da ciência, dizendo que a origem da vida pertence a Deus através da criação e a geração segue a ordem da evolução. Nesse sentido, Deus é o fundamento real e transcendental do processo evolutivo do mundo. Ele age, portanto, a partir da nossa realidade limitada para eleva-la, potencia-la e, assim, ter a capacidade de ir além das próprias forças. Segundo Rahner, o poder de Deus é que constitui os seres humanos como pessoas, isto é, além de uma concepção simplesmente corpórea. De fato, hoje em dia, temos dificuldades de entender essa verdade sobre a pessoa, devido ao fato de que estamos demasiadamente concentrados, quase exclusivamente, na dimensão corpórea.

O magistério da Igreja Católica a respeito da alma pode ser resumido com o texto do documento da Congregação pela Doutrina da Fé: “A Igreja afirma a sobrevivência e a subsistência depois da morte de um elemento espiritual, dotado de consciência e de vontade, de tal modo que o ‘eu humano’ subsista. Para designar esse elemento, a Igreja emprega a palavra ‘alma’, consagrada pelo uso que dela fazem a Sagrada Escritura e a Tradição. Sem ignorar que este termo é tomado na Bíblia em diversos significados, ela julga, não obstante isso, que não existe qualquer razão séria para rejeitá-lo e considera mesmo ser absolutamente indispensável um instrumento verbal para suster a fé dos cristãos”.

Todos os estudos e reflexões sobre a alma ao longo da história do ser humano levam a um princípio unificante, a um centro espiritual da sua vida. É verdade, se os primeiros séculos cristãos focalizaram na unidade psicossomática da pessoa, demonstrando de maneira bem evidente que corpo e alma são unidos, os séculos sucessivos favoreceram a separação entre corpo e alma, influenciados pela concepção dualística helenista. O magistério da Igreja nos mostra, claramente, que a alma da pessoa é criada por Deus sem alguma mediação. Para melhor compreender isso, temos o documento do Concilio Vaticano II, Gaudium et spes, a Igreja no mundo contemporâneo, que nos explica a essência da natureza do ser humano.

Diz o texto: “O homem, ser uno, composto de corpo e alma, sintetiza em si mesmo, pela sua natureza corporal, os elementos do mundo material, os quais, por meio dele, atingem a sua máxima elevação e louvam livremente o Criador. Não pode, portanto, desprezar a vida corporal; deve, pelo contrário, considerar o seu corpo como bom e digno de respeito, pois foi criado por Deus e há-de ressuscitar no último dia… Ao reconhecer, pois, em si uma alma espiritual e imortal, não se ilude com uma enganosa criação imaginativa, mero resultado de condições físicas e sociais; atinge, pelo contrário, a verdade profunda das coisas.”

Portanto, estamos vendo como o magistério da Igreja mantém a unidade do ser humano, em perfeita sintonia com a Sagrada Escritura, dando assim uma harmonia em todo o seu ser e no seu mistério. É nessa unidade que as pessoas adquirem a grande força para se reconhecerem e viverem a condição de filhos e filhas de Deus. Desse jeito, tem capacidade de louvar o seu Criador. Ainda no catecismo da Igreja Católica se lê o seguinte: “Muitas vezes, o termo alma designa na Sagrada Escritura a vida humana ou a pessoa humana inteira. Mas designa também o que há de mais íntimo no homem e o que há nele de maior valor, aquilo que mais particularmente o faz ser imagem de Deus: ‘alma’ significa o princípio espiritual no homem (A. 26.23 § 363).”

O cardeal emérito de Milão, Dionigi Tettamanzi, disse: “A lei suprema da Igreja é a salvação das almas, não em uma visão dualística nem unilateral da pessoa humana, mas, sim, na unidade incindível.” Concluindo, posso dizer que a ciência perante a morte para. No entanto, a experiência da fé na busca de Deus nos permite falar de alma que é eterna. Assim sendo, o ser humano é muito mais daquilo que estamos enxergando através da sua corporeidade. Ele é também alma.