Cidades

Juiz assegura direito de mudança de nome e gênero em registro civil a jovem trans de 17 anos

Pela decisão do juiz Antônio Menezes, a jovem passa a se chamar Katherine de Araújo Esquerdo


O juiz substituto Antônio José de Menezes, em exercício na 6ª Vara Cível e de Fazenda Pública de Macapá, decidiu pela alteração do registro civil de uma jovem trans, de 17 anos, que passou a se chamar oficialmente Katherine de Araújo Esquerdo. A petição judicial tem como representante legal a mãe, Hellen Lanhellas de Araújo, que desde que a filha, aos 12 anos, se declarou menina, apesar de ter nascido fisiologicamente como menino, buscou acompanhamento terapêutico para iniciar a transição de gênero. Mãe e filha decidiram compartilhar esta história.

Na decisão, o magistrado julgou procedente a solicitação, determinando que o Cartório do 4º Ofício Milena Rodrigues Henique, em Manaus-AM, onde a jovem foi registrada, “proceda a retificação no assento de nascimento e o sexo/gênero feminino, bem como deve ser assinalada a existência de determinação judicial, sem menção à razão ou ao conteúdo das alterações procedidas, res guardando-se a publicidade dos registros e a intimidade da parte requerente”.

Para Katherine, esta é a primeira conquista de muitas que ainda virão. A jovem revela que se percebeu diferente aos quatro anos de idade, vindo a sofrer com o preconceito à medida que passou a frequentar a escola. “Não gosto de fazer o papel de vítima, porque meu coração é maior do que o preconceito que sofri, mas é muito difícil para uma criança se sentir dissociada de sua verdadeira identidade, sem saber o que está ; acontecendo, se aquilo é natural ou se é um comportamento errado, condenável”, relatou Katherine.

Aos 12 anos ela decidiu informar à família que não se sentia menino, mas que era uma menina. “Eu tive depressão, ansiedade, mas superei com muita coragem e falei francamente com a minha família, porque essas coisas têm que ser tratadas com transparência, mesmo que sejam difíceis de serem ditas”, enfatizou.

Para a mãe, Hellen, que já observava o comportamento diferente da filha, não foi surpresa. Mas, a determinação da menina em assumir sua identidade de gênero a preocupou. “É claro que a preocupação com a forma como ela seria tratada lá fora, no mundo, com tanto preconceito e violência, me impactou. Mas, desde que ela se declarou menina, passei a buscar formas de ajudá-la neste processo de transição. E a p rimeira atitude foi buscar terapia especializada, e como não encontrei em Macapá, nos mudamos para São Paulo”, explicou.


Já na capital paulista, Hellen passou a integrar o Grupo de Mães pela Diversidade, encontrando mulheres que passaram e passam pelas mesmas dificuldades e lutam juntas para superar. “Ser trans não é uma opção, é uma condição, e o grupo de mães nos ensina a defender nossos filhos, porque eles precisam de liberdade, viver suas vidas e não estarão sempre debaixo de nossas asas”, evidenciou Hellen.

“O fato de termos uma lei a nosso favor é muito importante, para que nossos filhos possam ter o direito de ser aceitos em seus locais de estudo, de trabalho, no meio social, com o gênero com o qual se identificam. Muitos transgêneros acabam caindo na marginalidade porque são rejeitados no mercado de trabalho por causa de seus nomes serem diferentes da forma como se apresentam”, detalhou Hellen.

Em São Paulo Katherine passou a ter acompanhamento psicológico com a equipe especializada do Ambulatório de Transtorno de Identidade de Gênero e Orientação Sexual, do Hospital das Clínicas, coordenada pelo psiquiatra Alexandre Saadeh, referência na área. “O primeiro núcleo que discrimina é a família, e esses jovens ficam sem chão. Então, estamos aqui para mostrar que essas pessoas são normais, tem família e querem o direito de viver com normalidade, com direito ao trabalho, ao estudo e à dignidade”, destacou Hellen.

Katherine se diz uma pessoa discreta, apesar de se expressar com muita facilidade. “É muito bom ter o nome que escolhi nos meus documentos. Minha missão é mostrar às garotas como eu, que elas podem procurar seus direitos, mas antes disso devem ter acesso ao tratamento que nos ajuda a saber de fato se é isso que queremos, porque não é uma brincadeira, é uma decisão de vida que precisa ser tomada com muita serenidade e respeito por si mesma”, concluiu a jovem.


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