Cidades

Valorização cultural e empreendedorismo são repassadas de pai para filho no Mercado Central

No novo Mercado Central, serão comercializados alimentos, artesanato, artigos religiosos, assim como café, chopp, sorvete e serviços de barbearia, ervaria, relojoaria e outros. 


A Prefeitura de Macapá prepara a reinauguração do novo  Mercado Central como um espaço comercial, cultural e turístico de Macapá. Local que está sendo revitalizado com recursos oriundos de emenda parlamentar do senador Randolfe Rodrigues, no valor de R$ 2,5 milhões, e contrapartida do Município.

E falar de Mercado é contar a história de quem o viu e o ajudou a nascer, como relata Luiz Gonzaga Nery, atual proprietário do famoso Bar Du Pedro, point etílico tradicional da cidade. “Sou nascido e criado neste bar. Vi a cidade inteira crescer e a memória mais viva que tenho é do Mercado Central lotado e meu pai conversando com os clientes”, relembra com um sorriso no rosto Luiz Gonzaga, de 59 anos.

O primeiro dono foi Pedro Nery, pai do Luiz. Ele recebeu o espaço em 1959 e mandou um letrista pintar a entrada. Mas, por um pequeno erro ortográfico, o “do” ficou “du”, o que acabou dando certo. “Esse erro foi o nosso diferencial. O pessoal adorou a ideia”, comenta o filho do seu Pedro.

Na época, o bar era simples, com as bebidas na prateleira, geladeira, mesas e cadeiras, o balcão, e um diferencial, era também uma sorveteria. Muitos pais iam beber enquanto a molecada ia tomar sorvete. “Eu tenho várias fotos com meus amigos de infância sentados em uma mesa de bar tomando cerveja. Hoje, até rimos disso, mas a gente se sentia descolado no meio dos adultos”, conta seu Luiz.

Em meio as boas lembranças da infância, Luiz cresceu e logo começou a ajudar nos afazeres do bar. Servia, limpava, pagava as contas e também se divertia. “Eu comecei a trabalhar com o meu pai em 1973, mas apenas em 2004 que eu assumi a gerência do bar. Lembro que na década de 80 o movimento melhorou com a descoberta de jazidas de ouro, vinham muitos carros do garimpo para o mercado, isso movimentou demais”.

Para Luiz, o bar sempre foi um local ideal para encontrar amigos, ouvir histórias, ter uma renda e aprender mais sobre a cidade. “Vinham muitos artistas para cá. Quem gostava muito de vim era o comandante Barcelos, que ia jogar dama e beber aos sábados. Muitos políticos vinham e ainda vem aqui. Os mais ligados ao povo gostavam de frequentar, de viver a cidade, pois o Centro da cidade começou aqui, no mercado”.

Em 2002, o movimento tava um pouco fraco e Luiz, como bom pedagogo e macapaense, decidiu relembrar a história do bar para trazer nostalgia ao ponto que era bem badalado nos anos 70 e 80. “No início, a gente não via muito futuro, aí pensei em atrativos, um deles era colocar as fotos antigas dos jogadores da cidade no bar. Isso chamava clientes e inflamava até o ego, porque as pessoas se viam na construção da cidade. Eu coloquei foto dos jogadores Bira, Aldenir, França e Pitel. Isso trouxe muita nostalgia e até atraiu os netos deles para cá. As pessoas viam e gostavam”, frisa.

Nessas 60 décadas do “Bar Du Pedro”, além da boa vontade do dono, em agradar a clientela, tem também fotos de moradores famosos e anônimos de Macapá. Hoje, o espaço tem uma decoração cheia de prateleiras, latas e garrafas de bebidas que nem existem mais, como a do Flip Guaraná e Guarasuco. Tem também um quadro com a foto de uma das conquistas do Botafogo.

“Temos um público de todas as gerações, tem a geração do meu pai, dos filhos dos amigos do meu pai e da minha geração, e de tantas outras que vêm para cá beber, ter um bom papo, ver a história da cidade em fotos e também conhecer o mercado, que tem muito da cultura de Macapá”, destaca Luiz, com carinho.

Ele é um dos muitos empreendedores do mercado que está na segunda geração no espaço. Outro ponto tradicional do lugar que também é cheio de história é a barbearia e salão “Diplomata”, que funciona na entrada do mercado há 27 anos. Quem conta a história do outro lado do grande empreendimento histórico é a empresária Marinalva Gonçalves de Almeida, de 49 anos.

Ela diz que no início trabalhava com a venda de comida, como panelada, sopa, galinha caipira e refeições. “A procura era grande, mas depois começou a ter muitos concorrentes e meu marido decidiu mudar de ramo, para barbearia”. A barbearia era administrada por Valter Almeida. Quem sempre circulava pelo espaço era o pequeno Danilo Jonh, que cresceu correndo pelo empreendimento comercial e logo também começou a ajudar nos afazeres.

“Como muitas mulheres vinham acompanhar o marido, acabamos agregando mais serviços, como corte de cabelo feminino e de manicure. Quando vimos já era salão e barbearia. Sempre fomos três pessoas, eu, o marido e o filho. Somos proprietários e funcionários”, relata Marinalva.

“Sou nascido e criado no salão e aprendi a cuidar dele com os meus pais. Nossa renda toda era daqui e tudo que acontece na cidade nós sabemos por aqui”, conta Danilo, herdeiro da família. Mas se engana quem pensa que a vida é só flores. Apesar do alto astral da família, da grande demanda no salão, eles já passaram por apuros com períodos de uma baixa demanda, que quase pensaram em vender o salão. “Mesmo nas dificuldades, o mercado sempre nos sustentou”, relembra a matriarca que gosta de contar as histórias engraçadas no salão.

“Uma vez veio um pessoal de Caiena aqui. Eles chegaram pedido um negócio que ninguém entendia, porque falavam um crioulo. Menina foi um deus nos acuda. A gente não ia perder o cliente, pegamos um dicionário e tivemos que nos virar nos trintas. O cara foi falando e eu fui olhando no dicionário. Conseguimos desenrolar, já fiz muitas amizades com turistas e com o pessoal que vem fazer concurso, que também passa pela gente”.

Foi nesse espaço cheio de histórias, vivências e curiosidades que cresceu a cidade de Macapá. O local abriga não apenas empreendedores, mas macapaenses apaixonados pela cidade e história de Macapá. O Mercado Central é um dos símbolos da história da cidade. Foi inaugurado no dia 13 de setembro de 1953 pelo então governador Janary Nunes e o prefeito Claudomiro de Moraes. O espaço era uma obra gigantesca para a época e tinha como finalidade comercializar produtos da roça, que eram desembarcados no Trapiche Eliezer Levy.


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