Entrevista

“Acreditaram até que a vacina transforma as pessoas em jacaré”

O Diário do Amapá traz uma conversa com o epidemiologista e professor da Universidade de Illinois (EUA) Pedro Hallal, um dos responsáveis pelo estudo, sobre os impactos da desinformação sobre a covid-19 para a população. Confira!


■ Epidemiologista brasileiro Pedro Hallal, um dos responsáveis pelo estudo Epicovid 2.0 no país.

 

Cléber Barbosa
Da Redação

 

O senhor é um dos responsáveis pelo estudo sobre os impactos da desinformação sobre a covid-19 para a população. O que é a pesquisa Epicovid 2.0 e o que apresenta de novo?
Pedro Hallal – AÉ muito importante que a gente, depois de ter avaliado o quanto o vírus estava se disseminando no Brasil, lá em 2020, agora, em 2024, avalie o impacto que a pandemia teve sobre a vida das pessoas e sobre a vida das famílias. Cerca de 15% dos entrevistados registraram morte de um familiar devido à Covid-19. Já 48,6% relataram redução na renda, aspecto que acarretou insegurança alimentar para 47,4%, ou seja, pessoas que não tinham a garantia de prover seu alimento diariamente. Cerca de 34,9% perderam o emprego e 21,5% interromperam os estudos durante a pandemia.

 

De acordo com a pesquisa, uma das principais causas da hesitação vacinal é a falta de confiança nas vacinas contra a covid-19. Como você avalia isso?
Pedro Hallal – HInfelizmente, naquele momento da pandemia, nós tínhamos lideranças políticas no país que disseminavam notícias de que a vacina fazia mal. Hoje o Epicovid 2.0 mostra o impacto que aquela irresponsabilidade cometida por alguns líderes teve sobre a população brasileira. Nós lidamos com uma vacina que parte da população tem desconfiança porque ouviu durante anos que ela é ruim, que não é segura, que transforma as pessoas em jacaré. Essa irresponsabilidade de disseminar desinformação tem impacto para as famílias brasileiras até hoje.

 

Outra desinformação espalhada por alguns grupos é a de que a pandemia não existiu, que ela foi inventada. Como podemos esclarecer que a pandemia foi real?
Pedro Hallal – ANós temos o dado de que 15% das famílias brasileiras tiveram algum familiar próximo que morreu durante a pandemia. Então, a simples menção de alguém imaginar que a pandemia não existiu é tão absurda quanto alguém imaginar que a Terra é plana e não esférica. A pandemia existiu sim e, infelizmente, o Brasil foi um dos países mais afetados. A mortalidade no Brasil foi quatro vezes maior do que a média mundial e o que a pesquisa mostra agora é que essa pandemia trouxe impactos sérios para a vida das pessoas e das famílias brasileiras.

Como a população pode se proteger dos diversos conteúdos falsos que chegam nas redes sociais e nos aplicativos de trocas de mensagens? Alguma dica?
Pedro Hallal – Sempre que a gente recebe uma informação, seja em grupos de mensagem, e-mail ou rede social, é importante buscar de onde veio aquela informação. Tem muita gente usando a desinformação para ganhar dinheiro. A gente sabe que alguns conteúdos bombásticos completamente equivocados geram muitos likes, muitos cliques, então a gente recomenda que as pessoas sempre busquem a fonte de onde surgiu aquele conteúdo.

É importante lidar com fontes confiáveis, com órgãos de imprensa, com especialistas, ou seja, com quem tem credibilidade para falar sobre o assunto. Acontece isso na minha família. Muitas vezes a minha mãe recebe algum conteúdo no WhatsApp e o meu pai me pergunta se é verdade. Eu mostro pra eles. “Vamos clicar aqui na fonte original”. E quando vai na fonte original, eu mostro porque não é verdade. É importante que todas as pessoas façam isso como forma de se proteger de tanta informação falsa sendo disseminada no Brasil, eu diria até de uma forma criminosa.

Nota da Redação: De acordo com a pesquisa “Epicovid 2.0: Inquérito nacional para avaliação da real dimensão da pandemia de Covid-19 no Brasil”, entre os entrevistados que não se vacinaram, 32,4% alegam optar por não se vacinar contra a Covid-19 por não acreditar na vacina como motivo. Já outros 31% dos não vacinados acreditam que a vacina contra a doença pode fazer mal. O estudo foi apresentado pelo Ministério da Saúde . O Epicovid 2.0 é a maior pesquisa de base populacional sobre a doença no Brasil. Ela foi conduzida em 133 cidades brasileiras, com uma amostra de 33.250 entrevistas, e avaliou o impacto da pandemia sobre a população brasileira. Os resultados são voltados ao histórico de infecções, os impactos socioeconômicos, vacinação e condições pós-covid. O estudo é uma continuação do Epicovid-19, iniciado em 2020, agora focado nos impactos contínuos do vírus na sociedade e na vida das pessoas. O Saúde com Ciência conversou com o epidemiologista e professor da Universidade de Illinois (EUA) Pedro Hallal, um dos responsáveis pelo estudo, sobre os impactos da desinformação sobre a covid-19 para toda a população brasileira.

 

Perfil

Pedro Hallal  – Epidemiologista, professor e ex-reitor da Universidade Federal de Pelotas (UFPel). Coordena o maior estudo sobre a disseminação da covid-19 no Brasil.

 

Breve biografia
– Possui graduação em Educação Física (2000), mestrado (2002) e doutorado (2005) em Epidemiologia pela Universidade Federal de Pelotas.
– Realizou estágio pós-doutoral no Instituto de Saúde da Criança da Universidade de Londres.
– Atuou como Reitor da UFPel entre 2017 e 2020.
– É Professor Titular da Universidade de Illinois Urbana-Champaign, Estados Unidos e Professor Visitante da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo.
– Coordena o EPICOVID-19, o maior estudo epidemiológico sobre coronavírus no Brasil.
– É um dos coordenadores da Coorte de 2015 de Pelotas e do Observatório Global de Atividade Física.
– É um dos sócios fundadores e ex-presidente da Sociedade Brasileira de Atividade Física e Saúde.
– Foi membro afiliado da Academia Brasileira de Ciências entre 2008 e 2013.
– Foi bolsista de produtividade 1A do CNPq.
– É Editor-Chefe do Journal of Physical Activity and Health..

 

Posição de destaque nacional

– Pedro Hallal é epidemiologista, professor e ex-reitor da Universidade Federal de Pelotas (UFPel). Coordena o maior estudo sobre a disseminação da covid-19 no Brasil.

 


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