Entrevista

“Antes de ser amigo, pai tem que ser pai, tem que participar da educação do filho”

Antônio Jackson Souza Brandão – Pesquisador em Estudos Imagéticos


Um dos nomes mais respeitados em todo o Brasil em se tratando de Estudos Imagéticos, o professor-doutor Jack Brandão concedeu uma enédita entrevista ontem ao Amapá durante o programa Conexão Brasília, da rádio Diário FM. Com a desenvoltura e a contundência de um educador, suscitou reflexões a respeito do papel de educar nos dias atuais, quando os filhos são bombardeados por muitas informações repassadas por mídias de toda ordem. Poeta, romancista, ensaísta, crítico de arte, fotógrafo, professor e pesquisador da questão imagética, o professor Jack Brandão é um teórico da questão iconofotológica e estuda o impacto das imagens extemporâneas e contemporâneas no meio em que vivemos, aborda a influência do Instagram e das selfies, tão compartilhadas na rede. Os principais trechos a seguir.

 

Diário do Amapá – Professor, para começar de uma forma didática explique o que faz um pesquisador imagético?
Profº Jack Brandão – Essa é uma pergunta muito interessante, pois nós trabalhamos há muitos anos com essa questão da imagem, e quando falamos a respeito de imagem temos que lembrar que nós estamos cercados de imagens por todos os lados e, de modo especial, quando nós pensamos na própria questão da Internet, que hoje nos possibilitou ter mais acesso ainda a elas, só que o grande problema que eu acredito é que nós não damos importância às imagens e achamos que as dominamos, só que é exatamente o contrário, elas nos dominam de uma forma extremamente intensa.

Diário – Como assim professor?
Profº Jack – Posso dar um exemplo. Eu criei um termo chamado “iconotropismo”, que da mesma forma que as plantas buscam a luz, o que chamamos de fototropismo, nós somos “iconotrópicos”. Ícono é uma palavra grega que significa “imagem”, então nós buscamos a imagem de uma forma muito intensa e não nos damos conta disso. É aí que nós nos perdemos em um mar de imagens muito grande e hoje na própria questão da “selfie”, né? Então nós precisamos, nós queremos, as redes sociais nos impõem a necessidade de buscarmos imagens de mais imagens e ainda a necessidade de buscar conhecer e criar outras imagens, a ponto de nós criarmos um outro mundo que não existe, aquilo que também eu chamo de “paramundo”.

Diário – Um mundo virtual, é isso?
Profº Jack – É o mundo das redes sociais, aquele onde grande parte das imagens que são postadas na realidade não passam de pose, não passam de um artificialismo que você vai buscando, buscando, a ponto de muitos jovens não saberem nem em que mundo estão, se é um mundo real ou um mundo da fantasia, esse “paramundo” que falei antes, criado para agradar os outros.

Diário – Fala-se até numa tal síndrome do mundo perfeito, não é?
Profº Jack – Exatamente, nós criamos isso, buscamos isso. Nós queremos criar um mundo que não existe, mas o grande problema que eu vejo aí não é nem projetar o mundo perfeito, mas acreditar que este mundo é o real, então há uma inversão, ou seja, eu crio um mundo irreal e acredito que esse mundo é real. Então o grande problema não é nem criar uma personagem, até podemos, pois se vamos à sala de aula de uma universidade eu sou uma pessoa lá, eu sou uma pessoa com meus amigos, sou uma pessoa na minha casa. O problema não está aí, o problema é quando eu crio uma imagem e eu coloco isso, que não deixa de ser um simulacro, uma fantasia, e digo que essa imagem é que é o real. Esse é o grande problema, daí a própria questão da própria ansiedade que as pessoas têm pois isso acaba virando uma espécie de competição onde o outro parece sempre mais feliz, sempre bem e eu estou sempre mau.

Diário – Existe uma relação até paradoxal sobre a Internet, que ao mesmo tempo em que leva pessoas mais retraídas a uma atividade social mesmo que através da rede de computadores, também contribui para que se tenham menos relações pessoais, como é isso professor?
Profº Jack – É como você falou, um paradoxo, a Internet hoje nos fornece o mundo, nós temos o mundo em nossas mãos, muito diferente daquilo que a gente tinha antigamente, pois é só lembrar de quando a gente precisava fazer uma pesquisa era forçado a ir a uma biblioteca, comprar uma enciclopédia, estudar, ler, enfim, hoje nós temos isso tudo está ao alcance das mãos. Agora infelizmente a grande realidade é que nós não conseguimos entregar isso, pior do que isso, nós temos a falsa impressão de anonimato, pois afinal por mais que acredite que jamais vai ser rastreado, ser encontrado, é muito difícil que não o seja. E ainda existe a internet proibida, a “Deep Web”, que aparentemente é muito mais difícil, mas só não se encontra quem não quer. Mas o fato é que quem pensa em aproveitar o suposto anonimato para usar, abusar daquilo que ele acha que é a realidade. E tão nós liberamos os monstros que estavam escondidos dentro de nós, como essa onda de ódio, racismo, misoginia, enfim, absurdo.

Diário – Pois é, o que seria um espaço democrático para você expressar a sua opinião acaba virando essa coisa que se volta contra a pessoa num bombardeio de quem tem opinião contrária, não é?
Profº Jack – Sim e devemos pensar também que os próprios influenciadores digitais nem todos teriam a capacidade de influenciar alguém, começa por aí. Mas hoje impõe-se isso de uma tal forma que as pessoas acreditam e enxergam neles como a verdade absoluta. Então a partir do momento que eles ditam as suas regras, de uma forma correta ou incorreta, isso não vem ao caso, se torna fato. E isso é extremamente perigoso, de modo especial para os mais jovens e digo isso porque se pegarmos a mídia, como o Instagram, para citar um exemplo, acho muito perniciosos para os mais jovens, isso já é comprovado cientificamente. Exatamente porque cria um determinado padrão e você tem que segui-lo.

Diário – E por que os mais jovens especificamente?
Profº Jack – É que são os que mais sofrem com esses aplicativos que deveriam ser algo agradável, para você postar como há um tempo atrás quando você tirava as suas fotos e havia até uma espécie de álbum de família que você expunha para um grupo de pessoas muito pequeno, seus acontecimentos, determinados acontecimentos que valiam a pena. Hoje não, as pessoas querem expor aquilo que necessariamente viveram, quantas pessoas criam imagens de locais que não foram, simplesmente para dizer que estavam lá. Como é o caso das selfies, quantas pessoas até se arriscam a morrer para colocar uma imagem nas redes sociais. É algo triste isso.

Diário – Outras questão que o senhor pode falar com propriedade por viver em São Paulo é como esse excesso de exposição da intimidade atenta contra a própria segurança das pessoas, que revelam suas rotinas, isso tudo muito fácil de localizar pelo GPS dos aparelhos.
Profº Jack – Sem sombra de dúvidas. Infelizmente isso é uma realidade pois essas pessoas na necessidade desse mundo criado artificialmente, essa fantasia, elas esquecem isso, acham que estão protegidas, querem o anonimato, mas querem se expor, então esquecem que não só aqueles que se dizem nossos amigos estão nos vendo, mas os outros também estão.

Diário – Bem professor, neste domingo é o Dia dos Pais, então a partir de tantas reflexões feitas nesta entrevista que mensagem o senhor poderia transmitir a respeito do papel de ser pai hoje, com tanta coisa para preencher o tempo, para se distrair e porque não dizer afastar pais e filhos de um convívio mais de pele, de olho no olho?
Profº Jack – Olha, eu sou pai também e posso dizer que antes de ser amigo, o pai tem que ser pai, tem que participar da educação do filho, de modo especial na infância, tem que trabalhar isso, porque quando chega na adolescência a gente sabe a dificuldade que será, ainda mais hoje que as crianças praticamente já nascem com o celular na mão, e não é fácil também lidar com isso. Os pais acham muitas vezes que é mais fácil entregar um celular na mão do filho criança como uma forma de mantê-los calados, mantê-los na linha, mas muitas vezes estes próprios aparelhos, as mídias, vão fazer as vezes deles – o papel de pais – e depois não adianta reclamar.

Diário – Obrigado pela entrevista professor e um feliz dia dos pais ao senhor.
Profº Jack – Eu agradeço e desejo também um bom dia dos pais a todos e espero conhecer o Amapá em breve, acho um estado lindo.

 


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