Entrevista

“Já existem decisões judiciais definindo como improbidade a prática do assédio moral”

O advogado Marcos Sassin concedeu uma esclarecedora entrevista ontem no programa Conexão Brasília, pela Diário FM. Falou sobre assédio moral no ambiente de trabalho, um tema mais do que atual, que inclusive mereceu um amplo debate recentemente na Assembleia Legislativa do Amapá. Ele também atendeu a inúmeros telefonemas para a emissora, de gente relatando casos pessoais ou de que tiveram conhecimento, onde a prática do assédio moral ficou evidenciada. O Diário do Amapá publica a seguir os principais trechos dessa participação do advogado no rádio, em que falou também das iniciativas para tipificar como crime quem comete o assédio, tanto vertical como ascendente.


Diário do Amapá – Muita gente faz confusão entre o assédio moral e o assédio sexual. Qual a diferença entre os dois?
Marcus Sassim – Na realidade um engloba o outro. O assédio moral se caracteriza por toda e qualquer conduta abusiva e isso pode ser um gesto, uma palavra, um comportamento ou uma atitude que atente contra a reputação da pessoa, daquele trabalhador, contra a dignidade dele, ameaçando de demissão tendo condutas sistematizadas e não uma conduta isolada, mas reiteradas, é isso que vem a se constituir o assédio moral.

Diário – Não necessariamente se caracteriza em uma só oportunidade?
Marcus – Não, uma oportunidade só pode caracterizar um dano moral, cujo assédio moral também caracteriza o dano moral.

Diário – E o assédio sexual?
Marcus – Ele também pode fazer parte, é uma espécie de assédio moral também.

Diário – Já existe na legislação brasileira uma previsão legal com a definição desse crime de assédio moral?
Marcus – Especificamente não, mas especificamente a jurisprudência trabalhista já vem reconhecendo a existência do assédio moral, inclusive resultando em indenizações de valores altos, a título de R$ 100 mil, R$ 150 mil, conforme o caso que é colocado lá na Justiça.

Diário – É um caso típico da Justiça do Trabalho?
Marcus – É da Justiça do Trabalho, mas também pode ser da Justiça Estadual ou na esfera federal também. O assédio pode ser do trabalhador tanto do regime celetista como do servidor público, nas três esferas, municipal, estadual ou federal.

Diário – O trabalhador celetista, ou seja, aquele regido pela CLT [Consolidação das Leis do Trabalho] tem um foro próprio que é a Justiça do Trabalho, já o servidor público não, é regido pelo chamado Estatuto, não é?
Marcus – Isso, cada um tem seu estatuto próprio, o servidor federal tem o seu, assim como o estadual e até o municipal. O importante é dizer que a questão do assédio não é só do chefe contra o subordinado, entendeu? Ele pode ser dar entre colegas e pode ser praticado inclusive pelo subordinado em relação ao seu chefe, que é o assédio ascendente, digamos assim, que é o empregado que sabota o chefe.

Diário – Esses são os tipos de assédio, é isso que o senhor quer dizer?
Marcus – Exatamente, o vertical, o horizontal e o ascendente. Essa é uma denominação que a doutrina colocou. O vertical é do chefe para com o empregado, o horizontal é do mesmo nível, colega contra colega, e o ascendente é daquela equipe que procura sabotar o chefe, que não entende muito das coisas.

Diário – Teve até um caso recente envolvendo um juiz acusado de praticar assédio contra seus subordinados não foi?
Marcus – É um exemplo de assédio no serviço público, mais precisamente no Judiciário. Houve um juiz de Pernambuco que foi aposentado em função de que eles estava assediando os servidores que trabalhavam com ele. Inclusive o STJ [Superior Tribunal de Justiça] hoje considera como ato de improbidade administrativa a conduta de assédio moral, com a perda e a suspensão dos direitos políticos, é importante dizer isso.

Diário – Contra os políticos então, é isso?
Marcus – Alguém que está no mandato e comete essa prática de assédio moral pode ser enquadrado como improbidade administrativa.

Diário – O senhor poderia dar alguns exemplos práticos daquilo que configura uma prática de assédio moral doutor?
Marcus – Posso dar exemplos que valem tanto para o serviço público como para a iniciativa privada. Retirar da vítima autonomia, ou seja, a pessoa tem uma função e o chefe vai lá e fala: – Tu não vai mais fazer isso! Quer dizer, uma pessoa é chamada para ser supervisor e o chefe vai lá e diz que ele não supervisiona mais nada, entendeu? Outra coisa é deixar de transmitir informações para o empregado para que ele possa desenvolver o trabalho dele. Também tem a contestação, a pessoas faz o trabalho dela e o chefe procura um erro, que pode ser uma vírgula e o superior se recusa a receber o trabalho. E aí vão outros inúmeros casos.

Diário – Teve até uma cartilha lançada pelo Ministério da Saúde com alguns exemplos desses, como por exemplo, induzir o funcionário ao erro, criticar de forma injusta ou exagerada assim como isolar a vítima, como é esse último?
Marcus – Esse do isolamento é realmente difícil, não é? É você tirar a pessoa da convivência com os colegas, como colocar a pessoas em uma sala sozinho, o tempo todo. Essa é uma prática que não pode mais existir no âmbito do trabalho. Com relação a isso existem as doenças provocadas em virtude do assédio moral que são importante dizer.

Diário – Daí essa cartilha ser editada pelo próprio Ministério da Saúde?
Marcus – É porque o assédio moral pode provocar doenças inclusive como a depressão. E até casos de depressão séria que venha a afastar o empregado do trabalho ou o servidor público da sua função, o que é prejuízo tanto para o erário quanto para a empresa.

Diário – Afinal de contas o cidadão talvez passe a maior parte do seu tempo exatamente no ambiente de trabalho, não é mesmo?
Marcus – É, em geral passa oito horas por dia no regime celetista ou até casos de gente que trabalho, doze, treze ou quatorze horas por dia, então é bom que se mantenha um ambiente saudável no trabalho, é bom que se atente para isso, que o empregador tenha cuidado com o que está acontecendo.

Diário – E o que já existem em termos de iniciativas de se definir leis com previsão e até punição para os casos de assédio moral?
Marcus – Existem vários projetos de lei, inclusive um criminalizando o assédio moral, vários aliás, com penas de três meses a um ano [de prisão], outros com penas de 1 ano a 2 anos, enfim são vários projetos. Mas uma lei específica não existe ainda, nem no regime celetista nem no âmbito da legislação federal, que regularia essa questão junto aos servidores públicos. Mas, como disse, há jurisdição tanto dos Tribunais regionais do Trabalho como da Justiça Federal e da Justiça Estadual já reconhecendo a existência do assédio moral e vai analisando caso a caso. Ela [a Justiça] já reconhecendo já coíbe, já gera um direito a indenização por essa prática, inclusive com penas.

Perfil..
Entrevistado. O advogado Marcus Miller Machado Sassin tem 37 anos de idade, é paraense da cidade de Belém. Diplomado em Direito pela Universidade da Amazônia (Unama), no ano 2000; também fez uma especialização em Direito Constitucional e Administração pela Unama; é pós-graduando em Direito do Trabalho pela Universidade Santa Cruz (Rio Grande do Sul). É advogado militante há 13 anos, sendo os cinco últimos anos no Amapá, com atuação junto à Justiça do Trabalho. Mais recentemente vem proferindo palestra e participado de debates a respeito da prática do assédio moral no serviço público e também na iniciativa privada. Está lotado na banca de advocacia denominada Gomes e Associados.


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