Entrevista

“O ribeirinho coloca sulfato de alumínio na água achando que é cloro”

Ela desenvolveu startup com uma solução sustentável e eficaz para purificar água bruta e barrenta, transformando em água pura e alcalina, ajudando comunidades inteiras a buscar mais saúde e qualidade de vida


 

Cléber Barbosa
Da Redação

 

Diário do Amapá – Você nasceu onde e como começa exatamente essa sua trajetória empreendedora voltada a ajudar comunidades como a sua?
Vanda Pororoca – Eu nasci em Oiapoque, até que minha família se mudou para a Ilha do Marajó, indo trabalhar com extração de madeira, que era a atividade comum naquela época e foi a causa da contratação. Mas eles decidiram ficar por lá Ilha Caviana, numa comunidade chamada Rio Buçutuba, onde eu me criei.

 

Diário – E por que Vanda Pororoca, tem a ver com sua etnia ou com o seu invento?
Vanda – Sim, está relacionado ao nosso tratamento de água. É que na nossa região a nossa água é muito mexida pela força da pororoca, daí a água da Amazônia ser barrenta, fica totalmente turva devido a força das águas durante o encontro das marés, então quando a gente conseguiu purificar essa água, tirando de dentro da lama da pororoca eu falei vou levar [o nome], até porque a pororoca é um fenômeno amazônico, não é? Todo mundo tem o seu [fenômeno natural], furacão, tornado, enfim, nós amazônidas temos a pororoca – uma força incrível da natureza.

 

Diário – Uma startup é uma plataforma que se propõe a resolver um problema, uma solução inovadora, a sua era limpar a água da sua comunidade?
Vanda – Exatamente. Devido a minha vivência como líder comunitária eu via todo mundo tomar água contaminada, e contaminada por sulfato de alumínio, que a Amazônia inteira usam pensando que seja hipoclorito. Noventa por cento das pessoas na Amazônia usam para fazer descer a lama da água mexida pela pororoca, então aquela lama tem que descer para que a água fique clara [decantação], então usam o alumínio pensando que é cloro. Então se você chegar numa comunidade ribeirinha e perguntar o que eles usam para purificar a água eles vão dizer que é cloro, mas não é. Isso vale para uma vasilha pequena, como para um tambor, então jogam o hipoclorito, na inocência deles, achando que a água está tratada e tomam ela para tudo, fazer café, comida, enfim, tudo com aquela água. Só que tem um detalhe, na própria embalagem do sulfato de alumínio está escrito o alerta sobre não ingerir pois queima as mucosas, daí as pessoas começarem a adoecer com problemas estomacais, gastrite e até câncer do estômago, úlceras, tudo num índice muito alto, fora as outras situações preliminares, diarreia, enfim, vai esbandalhando tudo, o organismo todo. Minha preocupação sempre foi essa.

 

Diário – E como a solução começou a ser construída?
Vanda – Bem, conheci, há sete anos, um pesquisador aqui do estado, do Instituto Federal do Amapá (IFAP), chamado Pedro Aquino de Santana, que já trabalhava em algumas iniciativas de tratamento de água, então falei para ele sobre o nosso problema e ele topou, foi pra dentro da mata com a gente e durante sete anos a gente ficou testando de tudo, pois quando ele soube da nossa situação ele disse “meu Deus, vocês estão se matando todos os dias”. Eu não sei se já repararam, mas o ribeirinho tem um estereótipo, não sei se é assim que fala, aquele jeito de ser pequenino, entroncado como se diz no popular, então eu acho que isso é por conta da água, pois todos nós temos esse mesmo jeitinho, quando nos olham de loge já dizem “olha, lá vem um cabuçu”, né? [risos] Então depois a gente viu que isso tudo tem a ver com a ingestão da água [contaminada].

 

Diário – E a água segundo os especialistas, é a base para garantir saúde.
Vanda – Exatamente, só na minha família tínhamos duas pessoas com problemas sérios de gastrite quando a gente começou esse trabalho, então depois de testarmos de tudo chegamos a um produto que vimos daria para resolver, mas não queríamos que ficasse restrito apenas à nossa comunidade, mas ajudar a muitas outras comunidades. Foi então que pensamos em utilizar o açaí, que tem em todo lugar, foi então que achamos o nosso forno ideal para a produção do carvão à base de açaí.

 

Diário – E esse carvão serve como um filtro, é isso?
Vanda – A gente não usa só o carvão, mas ele é um dos principais integrantes dos nossos filtros, que chamamos estação de purificação.

 

Diário – Purificar a ponto de ser totalmente potável?
Vanda – A nossa água, o diferencial da nossa água dentre tudo que existe, é como se a nossa água voltasse lá para a fonte, lá onde ela nasceu, só que com dois benefícios, o primeiro não ter mais os patógenos, e segundo ela vai com o pH elevado, então a água fica totalmente pura. Como 70% do nosso corpo é água, então quando você toma uma água pura e alcalina os benefícios são imediatos.

 

Perfil

Vanda Pororoca – Tem 49 anos, mãe de 3 filhos biológicos e 18 de coração. É comprometida com a sustentabilidade por isso trabalha com produtos oriundos da floresta e em comunhão com a natureza.

 

O problema
– Segundo a OMS, 2 bilhões de pessoas (25% da população mundial) não têm acesso a água potável.
– 88% das internações hospitalares emcomunidades vulneráveis estão relacionadas à ingestão de água contaminada
– 32% da população não tem acesso a água potável na Amazônia

A proposta
– Redução de doenças, promoção de saúde e como desnutrição e qualidade de vida diarreia em crianças e adultos para comunidades e adultos. remotas.

Trajetória
– Trabalhou em cooperativa, com grupo de mulheres da floresta, com lideranças comunitárias em área ribeirinhas e áreas de pontes em Macapá.
– Atualmente me encontro envolvida em desenvolver comunidades em vulnerabilidade.
– A Vanda Pororoca foi uma das finalistas com a sua Startup AMAZON POROROCA no Expo Favela Amapá e em dezembro concorreu a etapa nacional no Expo Favela Brasil 2024.
– Também participou de um reality show na Rede Globo no programa É de Casa.

 

 


Deixe seu comentário


Publicidade