Entrevista

Ruben diz que decisão da Alap sobre Kaká é surreal

“Um horror de técnica legislativa”


Para o advogado Ruben Bemerguy, a Assembleia Legislativa praticou “um horror de técnica legislativa” no caso da tentativa de impedir que o deputado Kaká Barbosa assuma a Presidência da Casa de Leis, em fevereiro de 2017, depois de ter sido devidamente eleito pelos parlamentares estaduais

“Essa é uma realidade impassível a qualquer objeção fundamentada. Os eleitos, seja na esfera parlamentar eleitoral propriamente dita, seja na esfera administrativa, têm direito ao exercício do mandato para o qual foram eleitos”, diz o causídico em entrevista exclusiva ao Diário do Amapá. Ruben advoga em defesa do deputado Kaká.

O advogado vê que tentar impedir a posse de Kaká Barbosa é surreal, principalmente quando se trata de um Parlamento em que se pressupõe reverenciar a razoável técnica legislativa e um mínimo de respeito à Constituição, especialmente direitos individuais.

“Se, como no caso concreto, uma Mesa é composta por sete membros e quatro ou, como no caso, seis deles resolvem renunciar, esse ato não contém lógica legal que determine a extensão àquele parlamentar eleito dirigente e que não renunciou. Renúncia é, antes de tudo, um direito individual, uma decisão unilateral, expressa. Ninguém, absolutamente ninguém, tem o poder de obrigar a outro renunciar porque esse alguém renunciou. Ninguém, absolutamente ninguém, tem o poder renunciar pelo outro. É até difícil acreditar que essa norma tenha sido produzida por um Parlamento”, também defende Ruben Bemerguy na entrevista que segue.

DA – O senhor advoga a causa do deputado Kaká Barbosa contra a Assembleia Legislativa. Ele, o deputado Kaká, diz que assume a Presidência da Casa em 1 de fevereiro de 2017. A Assembleia diz que fará novas eleições. E agora?
Ruben – O deputado Kaká Barbosa foi eleito por 21 de seus pares para presidir a Mesa Diretora da Assembleia no período correspondente à 3ª e 4ª Sessões Legislativas da 7ª Legislatura com início em 1 de fevereiro de 2017 e término em 31 de janeiro de 2019. Essa é uma realidade impassível a qualquer objeção fundamentada. Os eleitos, seja na esfera parlamentar eleitoral propriamente dita, seja na esfera administrativa, têm direito ao exercício do mandato para o qual foram eleitos.

DA – Mas a Assembleia anulou a eleição do deputado Kaká Barbosa…
Ruben – A própria Assembleia desanulou, com perdão pelo pequeno neologismo, essa anulação. Um horror de técnica legislativa, mas é verdade.

DA – Como assim?
Ruben – A Assembleia Legislativa modificou há pouco tempo o seu Regimento Interno. Eles, os parlamentares, estabeleceram a seguinte premissa: Se a Mesa Diretora é formada por um presidente, um 1º vice presidente e um 2º vice presidente, e também por uma 1ª Secretaria, uma 2ª Secretaria, uma 3ª Secretaria e uma 4ª Secretária, a renúncia de pelo menos quatro integrantes, dois entre o Presidente e vices, dois entre os secretários, mesmo antes da posse dos eleitos, tornaria a eleição já realizada automaticamente nula.

DA – Mas foi o que ocorreu…
Ruben – É verdade e isso é muito mais do que surreal, principalmente quando se trata de um Parlamento em que se pressupõe reverenciar a razoável técnica legislativa e um mínimo de respeito à Constituição, especialmente direitos individuais.

DA – Pode explicar?
Ruben – Se, como no caso concreto, uma Mesa é composta por sete membros e quatro ou, como no caso, seis deles resolvem renunciar, esse ato não contém lógica legal que determine a extensão àquele parlamentar eleito dirigente e que não renunciou. Renúncia é, antes de tudo, um direito individual, uma decisão unilateral, expressa. Ninguém, absolutamente ninguém, tem o poder de obrigar a outro renunciar por que esse alguém renunciou. Ninguém, absolutamente ninguém, tem o poder renunciar pelo outro. É até difícil acreditar que essa norma tenha sido produzida por um Parlamento.

DA – Mas o judiciário tem dado razão para a Assembleia….
Ruben – Em hipótese nenhuma. Basta ler as decisões.

DA – Mas a Assembleia fará novas eleições.
Ruben – Isso pouco se me dá. Só se ela quiser passar por cima das decisões judiciais, e essa é uma aventura perigosa. Ouça, a Assembleia anulou a eleição do deputado Kaká Barbosa em razão da renúncia de outros seis membros da Mesa que tomariam posse em 1 de fevereiro de 2017. O deputado Kaká propôs um mandado de segurança contra isso. Exatamente contra essa anulação. A liminar foi concedida em favor do deputado Kaká Barbosa. Nessa decisão o desembargador determina que a Assembleia se abstenha de realizar nova eleição da Mesa Diretora. E mais: ouça, eu vou ler para você um trecho da decisão: “A notícia da proximidade de nova eleição da Mesa Diretora da Assembleia Legislativa do Estado do Amapá (biênio 2017/2019), agendada para o dia de amanhã 25/08/2016, às 10h, quando há muito consolidado idêntico processo eletivo, conforme Ata da 45ª Sessão Ordinária Deliberativa ocorrida dia 31.05.2016 (fs. 55-61), revela, neste exame superficial, o caráter pouco democrático e antirrepublicano das regras regimentais daquela Casa de Leis, quando disciplina, por outras palavras, a destituição sumária e não fundamentada do Presidente eleito mediante mero ato de renúncia de alguns membros da Mesa Diretora, em detrimento do princípio da vontade da maioria e da própria Constituição Estadual (art. 95, inciso I)”.

DA – E depois?
Ruben – Depois, o prolator da decisão iria submeter essa decisão ao Pleno do Tribunal de Justiça. Antes disso, entretanto, a Assembleia resolveu anular aquela decisão que havia anulado a eleição do deputado Kaká Barbosa. Aliás, esse documento produzido pela Assembleia está nos autos, e diz não só que anula a anulação da eleição do deputado Kaká como também mantém íntegra a própria eleição dele. E por que a Assembleia fez isso? Por que o Regimento Interno da Assembleia não se sustenta em uma discussão judicial.

DA – Mais o desembargador revogou a liminar…
Ruben – Claro que sim. Se a liminar era para impedir que a Assembleia realizasse as eleições e a própria Assembleia vem aos autos e diz que anulou o ato convocatório e que todos os atos praticados na eleição do deputado Kaká Barbosa estão mantidos, não há, evidentemente, nenhuma razão para a manutenção da liminar. Nesse aspecto, nem objeto há mais. A decisão é, na minha opinião, corretíssima.

DA – Então acabou?
Ruben – A Assembleia não havia publicado em seu Diário Oficial a decisão de anular a anulação da eleição do deputado Kaká. Em princípio, o ato não teria eficácia. Nós informamos isso nos autos e a Assembleia imediatamente publicou. Há também uma discussão quanto à possibilidade de reconhecer no mandado de segurança a inconstitucionalidade da norma regimental da Assembleia. Vamos aguardar o julgamento do mérito da ação.

DA – O que senhor deseja para o Amapá?
Ruben – Bem, aí falando em meu nome, só meu, sem qualquer alusão a minha atuação profissional no processo sobre o qual conversamos, eu espero, sinceramente, para o bem do Amapá, a Eclésia II, a Eclésia III, a Eclésia IV. Acho que só a judicialização do ambiente político salva o Amapá. Só o Ministério Público, portanto, em regra.


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