Polícia

Sejusp monitora 7 facções criminosas no Amapá e anuncia ofensiva

Serviços de inteligência das forças de segurança do Amapá confirmam a existência de 7 facções criminosas atuando no Estado. Planejamento estratégico garante combate efetivo.


Secretário Carlos Souza diz que Estado atua com inteligência para reprimir o crime organizado. Foto: Joelson Palheta

Elden Carlos
Editor

A guerra entre facções criminosas – que eclode nos presídios e estados de todo o país – revela o lado obscuro do crime organizado e que tem feito centenas de mortos em território nacional numa batalha sangrenta pelo poder e disputa no mercado ilegal de venda de drogas e armas. Assim como as empresas, facções criminosas têm uma hierarquia rígida e responsabilidades atribuídas a cada posto.

Em entrevista exclusiva ao Diário, o secretário Carlos Souza (Sejusp), que é coronel da Polícia Militar do Amapá, onde já ocupou o posto de comandante-geral, confirmou que os serviços de inteligência das forças de segurança do Estado mapearam 7 facções instaladas em âmbito local.

O Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV), que atuam em âmbito nacional, têm células no presídio do Amapá. Outra facção identificada foi a Família do Norte (FDN) que surgiu nos presídios do Amazonas e também expandiu tentáculos para terras amapaenses.

Surgida das entranhas do PCC, a Família Terror Amapá (FTA), agora briga pelo domínio de território. Atualmente ela é investigada por execuções ocorridas no habitacional Macapaba, na ZN de Macapá.

Facções que dominam presídios em nível nacional se instalaram no Amapá: Foto/Reprodução

Segundo o secretário, o Estado tem trabalhado de forma integrada com a Justiça, Ministério Público, Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Polícia Federal (PRF) e outras instituições federais, além, claro, do Ministério da Justiça e Segurança Pública, para reprimir o crime organizado, evitando a expansão dessas organizações.

De acordo com Carlos Souza, o Amapá tem feito um enfrentamento incisivo. Ele lembra que para que haja esse combate, é necessário, primeiro, ter um serviço de inteligência eficaz. “Nossas operações são decorrentes desse primeiro ponto. O enfrentamento a essas organizações criminosas só pode ser feito com inteligência integrada. Por isso, montamos uma força-tarefa para garantir que o Estado não seja sobrepujado pelos criminosos. Depois da inteligência, entramos com logística e todo o aparato necessário para reprimir qualquer ataque contra nossa soberania. O crime organizado existe e está ai. O que não podemos é vendar os olhos para isso. O que tiver que ser enfrentado, enfrentaremos”, disse.

Entrevista

Diário: Como os estados brasileiros estão se organizando para esse enfrentamento, já que durante algum tempo essa pauta não foi discutida da maneira adequada?
Secretário: As organizações criminosas são uma realidade no país. A proposta do novo governo [Federal], inclusive, com o novo ministro da Justiça e Segurança Pública, é um trabalho efetivo que começa com alterações de lei, para que possamos ter como combater legalmente essas organizações. Os governadores, no primeiro encontro com o ministro Sérgio Moro, já solicitaram que ele retome o projeto de implantação de, no mínimo, uma penitenciária federal em cada capital, para que haja essa interação, evitando que tenhamos que transferir os presos de maior periculosidade daqui para outras federações. Especialistas afirmam que quando se manda um interno para outro presídio ele vai se ‘especializar’, então, não é a política correta.

Diário: O Amapá tem buscado parcerias para esse combate às facções criminosas. Se, sim, qual o ganho com isso?
Secretário: O que eu classifico como grande ganho do Amapá no efetivo combate ao crime organizado é a integração de todo o sistema de segurança pública com o Ministério Público e Judiciário, as forças federais [PRF, Abin, PF], com quem mantemos reuniões ordinárias na Sejusp onde são traçadas metas e objetivos nesse combate. É um trabalho muito forte das agências de inteligência para munir nossos homens na rua. Muitas das ações [99%] que a população vê acontecer, são resultados de trabalho de inteligência onde as polícias civil e militar recebem essas informações das agências e fazem o enfrentamento.

Células de facções criminosas atuam dentro do Iapen


Diário: Os presídios de todo o país se tornaram ‘escritórios do crime organizado’. Execuções, roubos e outros crimes são articulados das cadeias.; No Amapá não é diferente. É possível mudar essa realidade?

Secretário: Existe um planejamento das organizações dentro das cadeias, e isso é realidade. Por isso, estamos às vésperas de licitar a segurança máxima [presídio], onde teremos pela primeira vez no Amapá o RDD (Regime Disciplinar Diferenciado). Já aprovamos o projeto de R$ 36 milhões para construção de uma penitenciária de segurança média. Dessa forma, vamos organizar o sistema prisional, acabando com os ‘escritórios do crime’ que hoje existe, por exemplo, no Iapen, e de onde são planejados os crimes de toda natureza.

Uma das intervenções dentro presídio amapaense


Diário: O senhor fala em combater o crime organizado de forma nacionalmente integrada. Se aplica a isso a tecnologia?

Secretário: Quando falamos em atuar de forma integrada, nacionalmente, é para sermos superiores nesse enfrentamento. Por exemplo, temos, aqui, organização criminosa que recebe comando do estado de São Paulo. Então, não adianta não estarmos lincados, integrados com as forças de segurança paulista. E, para isso, é preciso tecnologia. É necessária essa troca de informações. Só como exemplo, o que vem ocorrendo no Ceará (CE), poderia ocorrer aqui ou em outro lugar, já que as organizações migraram para os estados do Norte e Nordeste e estão abrindo novas rotas do tráfico. Eles têm interesse em ganhar hegemonia nessas regiões e para isso ocorrem os ataques e execuções daqueles que tentam se opor.

Diário: É possível afirmar que o Amapá se tornou uma nova rota das facções criminosas para o tráfico de drogas e armas?
Secretário: Todos sabem que existe uma guerra intensa contra o tráfico de drogas na fronteira do Paraguai com estados como o Mato Grosso. Diante disso, as organizações criminosas abriram novas rotas, tendo essa, via Suriname, e passando pelo Amapá. Então, esse trabalho de integração com os órgãos federais é essencial. Recentemente houve a apreensão de 600 quilos cocaína pura que passou em frente a Macapá depois de sair do Suriname. Foi uma ação conjunta da Marinha e PF que resultou nessa apreensão. Ora, a droga não tem como destino o Amapá, mas somos rota, então é preciso trabalhar com inteligência integrada.

Operação da Polícia Civil que resultou em uma das maiores apreensões de drogas no Amapá

Diário: Apesar das matanças em várias regiões, por que não é interessante para as facções os crimes de homicídio? O que seria o ‘tripé’ do crime organizado?
Secretário: Veja bem; não é interessante para uma organização criminosa o homicídio. Quando existe uma disputa pela hegemonia de um grupo em determinada área, acontece aquilo que vimos no presídio de Manaus, por exemplo, onde quase 60 presos foram decapitados. Aquela foi uma ação da Família do Norte para expulsar o PCC; Aí, existem esses conflitos. Quando já existe a hegemonia de determinado grupo, como é o caso do PCC, em São Paulo, o número de homicídios é baixo. Nós trabalhamos no combate ao tráfico de drogas, de armas e roubos, que é exatamente o tripé das organizações criminosas para capitalizar fundos. Temos aqui as unidades especializadas como Bope e Força Tática para – após o trabalho de inteligência – fazer esse enfrentamento.

Bope e Força Tática são empregados nas operações com alto nível de risco


Diário: A guerra entre as facções tem gerado, também, a execução de agentes de segurança pública em outros estados. O senhor teme que isso ocorra no Amapá?

Secretário: Para os criminosos, abater um agente da área de segurança pública é como se fosse um troféu. O que está ocorrendo no vizinho estado do Pará, por exemplo, aonde policiais vem sendo alvos dessas organizações, é o que buscamos evitar aqui, e, como? Usando nossos serviços de inteligência das polícias Civil e Militar. Vou te citar um caso concreto no Amapá. O Centro Integrado em Operações e Inteligência (Ciop) identificou uma situação em que um policial militar havia sido rendido por bandidos, colocado no porta-malas de um carro e seria executado. Esse trabalho de inteligência foi decisivo para salvar a vida do nosso policial. O Estado não se curvará em momento algum para quem quer que seja. Por isso, além desse mecanismo integrado de inteligência, preparamos nossos policiais para situações diversas de enfrentamento, inclusive, quando ele não estiver em serviço. Nós, enquanto agentes públicos, não podemos baixar a guarda.

Diário: Como o Ministério Público, Judiciário e outros órgãos atuam na chamada força-tarefa que foi criada no Amapá?
Secretário: Esse enfrentamento às organizações criminosas no Amapá nos levaram a criar uma força-tarefa que conta com a participação de um desembargador, que é responsável por disseminar essas informações junto aos juízes criminais, e uma procuradora do Ministério Púnlico, que perpassa e alimenta todos os promotores criminais, que é o primeiro nível nesse enfrentamento. Então, todos acompanham de forma integral nossas ações. Foi criado um sistema que é alimentado pessoalmente por este secretário. Se eu tiver o Judiciário, Ministério Público, Polícia Federal, Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e outros órgãos, teremos a efetividade nesse combate.

Diário: O Estado se municiou de recursos para investimentos em inteligência e reaparelhamento do sistema de segurança para enfrentar essa guerra?
Secretário: A estruturação do sistema de segurança pública do Amapá recebeu investimentos nos últimos quatro anos na ordem de quase R$ 200 milhões. São recursos de emenda de bancada, do governo Federal e emendas individuais. Podemos destacar a implantação das tornozeleiras eletrônicas [já em operação]; o bloqueador de sinal de celular, que está em via de licitação; o body scanner, que será implantado na entrada do Iapen onde até mesmo o governador ou secretário em visita terão que obrigatoriamente passar pelo scanner corporal; além do sistema estadual de comunicação digital. Com esse sistema, eu poderei fazer um chamado via rádio transmissor (HT) de Macapá para Oiapoque sem nenhum problema, além do que esse sistema não poderá ser monitorado pelos criminosos. Também, foram feitos investimentos em logística e equipamentos de segurança.

Um dos investimentos feitos pelo Estado foi em armas e equipamentos de segurança. Aqui, para o Iapen


Diário: Existe algum planejamento concreto para modernizar o sistema prisional?

Secretário: Dia 28 de janeiro nós participaremos, em Brasília, de uma reunião do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), que vai discutir as boas práticas de inteligência e interação. No dia 30, vou estar reunido com o diretor do Depen debatendo as novas estratégias para os presídios. O Brasil acordou e entende que nós precisamos combater o crime começando pelos presídios. Eu sou oficial de polícia e tinha essa visão de que era só prender e jogar lá dentro, mas aprendemos que deve haver a prisão, o cumprimento da pena e impedir que eles continuem mantendo contato com o mundo exterior.

Operações foram montadas para saturar áreas identificadas como críticas pela polícia

Diário: O senhor falou em planejamento, estratégias, inteligência e integração, mas, na prática, como a sociedade pode ver o resultado desse trabalho?
Secretário: Uma vez tomadas todas as medidas de planejamento, colocamos nas ruas nossas forças policiais civis e militares. Agora mesmo, estamos com uma operação no conjunto Macapaba, aonde além do batalhão de área, contamos com as unidades especiais do Bope e Força Tática. Mas, não é apenas entrar, saturar e ir embora. Vamos reforçar o policiamento permanente e ostensivo nessas áreas consideradas críticas para assegurar a garantia da ordem pública e proteção do cidadão de bem.


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