Política

Randolfe Rodrigues: “Sobrou para os mais pobres”

Em exclusiva ao Estadão, Randolfe avalia 1ºs passsos do governo Bolsonaro e até reconhece que ‘militares não são problema’


“A reforma da previdência foi anunciada como combate aos privilégios. Mas os ditos privilégios, que são as grandes aposentadorias dos serviços públicos e dos políticos, só representam 20% da economia de R$ 1,1 trilhão anunciada pelo ministro Paulo Guedes. R$ 900 bi estão no regime geral da previdência pública, que é parte dos mais pobres. Sobrou para os mais pobres”.

Quando Randolfe propôs um convite para Gustavo Bebianno depor na Casa, decidi procurá-lo, para falar um pouco sobre o que vem sendo o trabalho de oposição a este governo. Randolfe lidera um bloco de 14 senadores de 4 partidos, que ganhou o nome de “Senado Independente”. Com o PT de fora, o bloco propõe um novo espírito de oposição, em uma tentativa de dialogar com o recado que veio das urnas.

Como é que está se articulando essa força de oposição?
Fui designado por uma circunstância do regimento do Senado. A oposição sempre é o maior bloco parlamentar que se opõe ideologicamente ao campo em que está o governo. Nosso bloco reúne Rede, PDT, PPS e PSB. Esse bloco é maior que o bloco do PT. Embora o PT também seja de oposição, nosso bloco não tem o PT.

Por que não tem o PT?
O último ciclo político, de ascensão do bolsonarismo, tem muita responsabilidade do petismo. Não queremos restabelecer ou manter uma polarização que resultou na situação em que estamos. Depois de 2018, o sistema político tem que ser reinventado. Temos que entender o recado das urnas.Então resolvemos constituir algo novo, uma forma nova de atuar, de fazer oposição.

No que ela se diferencia?
Temos respeito pelo PT e sua localização no campo da oposição, provavelmente atuaremos juntos em várias frentes, mas temos também diferenças na forma como o PT vinha fazendo essa oposição. Não vamos fazer uma oposição para paralisar o Brasil. Não somos uma oposição sistemática. Estamos em campo oposto ao governo mas vamos debater cada tema com maturidade, defendendo os direitos individuais, a democracia, dialogando com as reformas que o Brasil precisa.

Como você definiria o PSL?
O PSL é o resultado da ruptura de um processo histórico inaugurado pela redemocratização. Tinha 8 deputados, agora conta com a maior bancada da Câmara. É a expressão dos novos tempos.

Não é curioso que justamente o caixa dois tenha sido fatiado no pacote anticrime de Sergio Moro?
Mais curioso é a nova declaração de Moro (“o caixa dois é um crime grave, mas não tem a mesma gravidade que corrupção, crime organizado e crimes violentos”). O que já tinha sido criminalizado pela sociedade brasileira, ele praticamente descriminalizou. Este fatiamento do pacote em 3 partes, uma para segurança pública, outra para corrupção e a terceira para caixa dois, sepultou qualquer possibilidade de termos algum marco legal sobre corrupção. Poderemos avançar em termos de segurança pública mas me parece que as outras partes estão condenadas aos arquivos.

O que o governo Bolsonaro fez de bom até aqui?
O que poderia ter de bom era o pacote de Sérgio Moro, mas este está sob risco, houve uma clara concessão do governo à pressão de parte de sua própria base.

E a reforma da previdência?
Partimos do pressuposto que a reforma da previdência é necessária, mas divergimos sob vários aspectos, da forma como ela foi apresentada.

Como assim?
Foi anunciada como combate aos privilégios. Mas os ditos privilégios, que são as grandes aposentadorias dos serviços públicos e dos políticos, só representam 20% da economia de R$ 1,1 trilhão anunciada pelo ministro Paulo Guedes. R$ 900 bi estão no regime geral da previdência pública, que é parte dos mais pobres. É a retirada de direitos. A isso vamos nos opor.

20% e 80%?
Nas nossas contas, sim. Os servidores públicos e a aposentadoria dos políticos representam uma economia de só R$ 200 bilhões. Já o regime geral da previdência pública, os abonos salariais, o BPC – Benefício de Prestação Continuada, representam 80%.

Então onde está a retirada dos privilégios?
Estão retirando o direito dos mais pobres. E estão combatendo menos os privilegiados.
Quando fui eleito, em 2011, renunciei à previdência dos congressistas e entrei no regime geral da previdência social, como qualquer cidadão brasileiro. Se eu tivesse aceito receber aposentadoria de congressista, ao final deste meu segundo mandato eu teria uma aposentadoria de R$ 16 mil.

Até morrer?
R$ 16 mil até meus últimos dias de existência, e poderia deixar essa aposentaria para minha pensionista.

Enquanto isso o grosso do povo recebe quanto?
Os mais pobres, um salário mínimo. Os que estão no regime geral da previdência pública, no máximo R$ 4 ou R$ 5 mil. Veja a diferença gritante.
Nesta proposta, o governo mexe com a aposentadoria dos servidores públicos, já a altera de imediato. Mas esta dos congressistas, só para os novos eleitos do futuro. Os de agora vão continuar recebendo.

Onde está combate aos privilégios?
Então em primeiro lugar, a reforma tem que ser para todos, civis e militares, e isso precisa tramitar junto no Congresso. Em segundo, tem que atacar os privilégios mesmo, e em terceiro não pode ser reforma somente da previdência. Veja, o governo não mexeu um centavo nas desonerações, boa parte delas ocorreram no governo petista.

Qual a leitura que você faz, do momento atual deste governo?
Olha, o governo está tendo muita dificuldade com o Congresso e pode levar o Brasil a uma crise gravíssima. É um governo sustentado em duas pernas. Primeiro, uma espécie de moralismo de goela. Esse moralismo está se esfacelando com o escândalo dos laranjas e a frustração com o pacote anticorrupção. O outro pilar é a reforma da previdência. Que pode demorar para ser entregue.

Como está estruturado este governo?
O governo é constituído por vários núcleos. Mas o comando do presidente vem se demonstrando frágil. Tem o núcleo da família, um pequeno núcleo político, tem o núcleo dos militares, tem o núcleo ligado ao Moro, e o núcleo ligado ao Paulo Guedes. Tem vários núcleos de comando. O problema é a falta de comando, a ausência de autoridade de governo em torno do presidente. Um presidente que se anuncia como autoritário mas começa sem autoridade.

Porém, o presidente passou um tempo hospitalizado.
De fato isso não deve ser relevado, mas ainda assim, pelo tempo que está no governo, ele tem revelado fragilidade. Não está à altura de um presidente bater boca via whatsapp com um subalterno, isso para mim enfraquece a autoridade e a magistratura do cargo.

Ontem mesmo li um texto de Luis Fernando Verissimo, comparando Bolsonaro com Collor…
Tem similaridades. Mas acho que o início de Bolsonaro tem se revelado mais frágil do que foi com Collor.

Como está Flavio Bolsonaro?
Tem estado quieto, tem sido pouco expressivo. Ele foi muito abatido.

E o que dizer sobre a presença militar no governo?
Os militares não são problema.

Talvez solução (risos).
Talvez sejam até solução. Os quadros militares que tem no governo são os melhores possíveis. São quadros que dignificam as Forças Armadas. Esse é um aspecto novo da oposição. Enquanto tem setores de antigamente que colocam as Forças Armadas como problema, para nós elas não são um problema.

Parece que neste novo sistema político pós 2018, as redes sociais representam papel importante. Isso é bom? Em que medida?
Elas são uma realidade, com um papel de intervenção na política reconhecido. Sem elas por exemplo, talvez não teríamos deixado de votar em Renan.As redes podem ser um parâmetro, mas gerir um mandato parlamentar por twitter, é reduzir o papel da representação parlamentar. É uma realidade nova com a qual o parlamento tem que dialogar. Mas é importante lembrar que as redes não representam necessariamente o pensamento do povo, há muitas tags fabricadas.

As redes podem ser um parâmetro, mas ferir um mandato parlamentar por twitter, é reduzir o papel da representação parlamentar. É um a realidade nova com a qual o parlamemento tem que dialogar. Mas é importante lembrar que as redes não representam necessariamente o pensamento do povo, há muitas tags fabricadas —adita o senador Randolfe, na polêmica entrevista ao jornal O Estado de São Paulo (Estadão).


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