Política

Resolução autoriza magistrados para conhecer termos circunstanciados lavrados por PMs

O agendamento das audiências referentes aos termos circunstanciados ocorrerão de acordo com a agenda previamente ajustada com o Juízo competente para processar e julgar os feitos atinentes aos Juizados Especiais Criminais.


Paulo Silva
Editoria de Política

O Tribunal de Justiça do Amapá (TJAP) republicou, na sexta-feira (15), a Resolução 1287/2019 que trata da regulamentação da fase preliminar dos procedimentos dos Juizados Especiais Criminais, concedendo autorização aos magistrados de 1º e 2º graus para conhecer os Termos Circunstanciados (TCs) lavrados por policiais militares no estado. A resolução provocou reação da Associação dos Delegados de Polícia do Amapá (Acadepol) e do delegado-geral de Polícia Civil Uberlândio Gomes.

Contendo quatro artigos, a resolução assinada pelo desembargador Carlos Tork, presidente do Tribunal de Justiça, autoriza no âmbito do Poder Judiciário do Amapá o recebimento de termos circunstanciados, de que trata a Lei 9.099/95, lavrados por policiais militares. Havendo necessidade de realização de exame pericial e outras medidas urgentes, o policial militar à frente da ocorrência fará os encaminhamentos junto aos órgãos oficiais competentes. O agendamento das audiências referentes aos termos circunstanciados ocorrerão de acordo com a agenda previamente ajustada com o Juízo competente para processar e julgar os feitos atinentes aos Juizados Especiais Criminais.

A resolução considera que principal escopo da Lei 9.099/95 foi o de entregar ao sistema de persecução criminal brasileiro um microssistema regido pelos princípios da simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade e que o Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) é o registro de um fato definido como crime de menor potencial ofensivo, que serve como peça informativa ao Juizado Especial Criminal, no bojo do qual se faz, de regra, apenas um relato do fato, qualifica-se os envolvidos, indica-se possíveis testemunhas e, se possível, acrescentam-se outras informações complementares.

Também considera que a expressão “autoridade policial” tem maior alcance para a finalidade de lavratura de um Termo Circunstanciado de Ocorrência, conforme veiculado no acórdão da ADI 2862/SP (julg. 26/03/2008) e ainda o entendimento da Reclamação STF 6612/SE (julg. 26/02/2009).

O documento também considera o precedente estabelecido no Acordo de Cooperação Técnica 007/2015-TJAP, firmado entre o Tribunal de Justiça do Amapá, a União e o Ministério Público estadual, acordando que os Policiais Rodoviários Federais podem elaborar o Termo Circunstanciado de Ocorrência nos casos de crimes de menor potencial ofensivo ocorrido no âmbito das rodovias federais do Amapá, objeto do processo administrativo  004385/2015.

A resolução do TJAP considera que no estado do Amapá há regiões remotas, a exemplo do distrito do Bailique e outras localidades interioranas, desprovidas de delegacia instalada e de policiais civis (Polícia Judiciária) para prestação desse serviço, ao contrário da Polícia Militar que se faz presente nesses locais e realiza, além da lavratura do Boletim de Ocorrência, o trabalho de pacificação nas comunidades. Cita também a  existência de atos normativos semelhantes nos Tribunais de São Paulo, Santa Catarina, Goiás e Pernambuco.

REAÇÃO DA POLÍCIA CIVIL

A resolução do Tribunal de Justiça do Amapá, concedendo autorização aos magistrados de 1º e 2º graus para conhecer os termos circunstanciados lavrados por policiais militares, provocou reação imediata da Associação dos Delegados de Polícia do Amapá, através do presidente Rogério Campos Souza, e do delegado-geral de Polícia Antônio Uberlândio de Azevedo Gomes.

Através de nota de Repúdio, Rogério Souza e Uberlândio Gomes dizem que “receberam a absurda notícia de que o Tribunal de Justiça do Amapá, através de uma resolução, autorizou seus juízes de primeiro grau a receberem Termos Circunstanciados de Ocorrência advindos da Polícia Militar, ou seja, autorizou a polícia ostensiva preventiva a usurpar sistematicamente as atribuições constitucionais e legais da polícia civil através de uma simplória “resolução”. Parece até uma piada, se as consequências não fossem trágicas”.

A perplexidade, segue a nota, é tamanha, e a indignação maior ainda, porque o ato parte não de leigos, mas de um tribunal do Poder Judiciário brasileiro, que tem a obrigação de velar pelo cumprimento das leis e da Constituição Federal, mas ao revés as pisoteia sem a menor cerimônia. Modifica regras processuais penais constitucionais por resolução, quando só o Congresso Nacional, por lei e por emenda constitucional, poderia fazê-lo! É um desprezo total a perguntar-nos: será que vivemos em estado de total anarquia? Será que vivemos numa ditadura do Poder Judiciário? Afinal, o que é que vale, a lei ou a vontade dos homens!? Se for a derradeira, voltaremos à barbárie!

A nota aponta o que seriam algumas das nefastas consequências deste irresponsável ato. E a primeira e mais grave delas é conflagrar duas instituições armadas, acirrar animosidade entre dois braços armados do Estado, predispondo-os a digladiarem-se por atribuições que, até as pedras do rio Araguari sabem, pertencem à Polícia Judiciária Civil, eis que atos de investigação de civis, realizados de forma sintética e simplificada, por força de lei.

Outra consequência nefasta, mas dura e necessária, continua a nota, será que todo e qualquer policial militar flagrado pelos integrantes da polícia civil realizando atos de ofício desta, como recomenda claramente o artigo 328 do Código Penal, será autuado e indiciado por usurpação de função pública, eis que num Estado Democrático de Direito o que deve prevalecer é o império das leis e não a vontade apaixonada dos falhos homens.

“Ao cidadão do Amapá, nós esclarecemos e orientamos que jamais se submeta a ser levado

para um quartel da PM, a fim de ser submetido à lavratura de Termo Circunstanciado de Ocorrência! O único lugar destinado pela lei e pela Constituição para que isso seja feito é uma Delegacia de Polícia Civil ou Federal, conforme o caso.  À OAB e aos nobres advogados caberá o imprescindível papel de defesa do regime normativo nacional, com o intransigente resguardo dos direitos individuais dos seus clientes, sustentando, se preciso for até às cortes internacionais, a invalidade e completa nulidade de tais escabrosos atos”, diz outro trecho da nota.

Advogados ouvidos pelo Diário do Amapá disseram que a resolução do Tribunal de Justiça do Amapá não fere a Constituição.


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