Última Hora

Sarney se revolta com anúncio de pedido de prisão

“Estou perplexo, indignado e revoltado; jamais agi para obstruir a Justiça”, diz o político.


O ex presidente do Brasil e ex senador José Sarney emitiu Nota, nessa terça-feira, 7, abordando o pedido de prisão que teria sido feito contra ele ao STF pelo procurador geral da república, Rodrigo Janot, que também teria feito o mesmo pedido contra o presidente do senado, Renan Calheiros, e o senador Romero Jucá com a acusação de que os três manifestaram interesse de interferir na Operação Lavo Jato em gravações de conversa que separadamente tiveram com o ex presidente da Transpetro, Sérgio Machado.
O pedido de prisão estaria há uma semana com o ministro do STF, Teori Zavascki, relator da Lava Jato. Sérgio Machado apresentou as gravações em depoimento prestado no processo, beneficiado pela delação premiada. Além disso, o ex presidente da Transpetro disse que deu R$ 20 milhões a José Sarney, R$ 30 milhões a Renan Calheiros e outros R$ 20 milhões a Romero Jucá, a título de propina da empresa responsável pelo transporte de combustíveis no país.

“Nota

Estou perplexo,indignado e revoltado.

Dediquei sessenta anos de vida pública ao País e à defesa do Estado de Direito. Julguei que tivesse o respeito de autoridades do porte do Procurador Geral da República. Jamais agi para obstruir a Justiça. Sempre a prestigiei e fortaleci. Prestei serviços ao País, o maior deles, conduzir a transição para a democracia e a elaboração da Constituição da República.

Filho de magistrado e de membro do Ministério Público, mesmo antes da nova Constituição promovi e sancionei leis que o beneficiam, inclusive a criação da Ação Civil Pública e as mudanças que o fortalecem, sob a liderança do Ministro Sepúlveda Pertence, meu Procurador Geral e patrono do Ministério Público.

O Brasil conhece a minha trajetória, o meu cuidado no trato da coisa pública, a minha verdadeira devoção à Justiça, sob a égide do Supremo Tribunal Federal.

José Sarney”

 

Brilhante trajetória

José Sarney é advogado, político e escritor. Foi o 31º presidente do Brasil (1985-1990) e o 20° vice presidente do Brasil (1985). Foi governador do Maranhão (1966-1971) e senador pelo mesmo estado (1971-1985). Depois de deixar a Presidência, foi novamente senador, em 1991, dessa vez pelo recém criado estado do Amapá, pelo qual foi reeleito duas vezes seguidas. Ele presidiu o Senado brasileiro por três vezes. Durante o mandato de José Sarney, na Presidência da República, foram restabelecidas as eleições diretas para presidente, prefeito e governador. Foi aprovado pelo Congresso o direito de voto dos analfabetos e a Constituição brasileira de 1988 por uma Assembleia Nacional Constituinte. Na política externa, o Brasil se reaproximou de países comunistas como China e a antiga União Soviética), reatou relações com Cuba e estreitou laços com Argentina e Uruguai, com a assinatura do protocolo do Mercosul. Como escritor, Sarney é autor de obras como O Norte das Águas, O Dono do Mar e Saraminda, membro da Academia Brasileira de Letras e membro correspondente da Academia das Ciências de Lisboa.

Carreira política
José Sarney é o político brasileiro com mais longa carreira, 60 anos no plano nacional, superando o senador Limpo de Abreu (53 anos de carreira política e 36 como senador vitalício). Ruy Barbosa, o mais duradouro político no período republicano, foi senador por 31 anos contra os 36 de Sarney e Limpo de Abreu. Durante sua vida pública, atuou sob quatro constituições (1946, 1967, 1969 e 1988), essa última convocada por ele, no exercício da Presidência da República, e quatro governos sob a Constituição de 1946, seis no governos militares e, depois de seu mandato presidencial, cinco sob a Constituição de 1988 — 15 governos.

Eleições e Constituinte
Sarney se notabilizou pela condução do processo de redemocratização do país. Ainda em 1985 foram legalizados os partidos políticos até então clandestinos, e o presidente recebeu no Palácio do Planalto líderes históricos da esquerda como João Amazonas e Giocondo Dias. No fim do ano realizaram-se as primeiras eleições diretas para prefeito das capitais em vinte anos. Em junho, Sarney envia mensagem ao Congresso convocando uma Assembleia Nacional Constituinte, a ser composta por deputados e senadores que seriam eleitos em novembro de 1986 e pelos senadores no exercício do mandato. Resgatando a iniciativa de Tancredo Neves, que havia convidado Afonso Arinos para presidir uma comissão de alto nível encarregada de redigir um anteprojeto de constituição, nos moldes da que o chanceler Afrânio de Mello Franco, seu pai, havia presidido em 1933, em setembro Sarney criou comissão especial para fornecer subsídios aos constituintes, composta por 50 membros. O anteprojeto não foi aproveitado por decisão de Ulysses Guimarães. Em 1 de fevereiro de 1987, a Constituinte, formada por 559 congressistas e presidida pelo deputado Ulysses Guimarães, foi instalada. A Carta Constitucional foi promulgada em 5 de outubro de 1988. Ainda em 1988 ocorreram eleições municipais. Em 1989 foram realizadas eleições diretas para Presidente da República — as primeiras em 29 anos. José Sarney foi sucedido na Presidência por Fernando Collor de Mello.

Senador pelo Amapá
Em 1990, Sarney transferiu seu domicílio eleitoral para o recém-criado estado do Amapá, antigo território federal, candidatou-se e foi eleito senador no mesmo ano. Em seu mandato se destaca pela defesa da Área de Livre Comércio de Macapá e Santana, pelo projeto do Estatuto da Micro e Pequena Empresa e pelo projeto que garantiu a distribuição gratuita de medicamentos aos portadores de HIV, cujo pioneirismo teve repercussão internacional. Em 1995 foi eleito presidente do Senado, quando renovou a estrutura administrativa e colocou em dia o funcionamento legislativo, com pendências de vários anos. Criou também a estrutura de comunicações da casa, com rádio, televisão e jornal, tornando transparentes as atividades parlamentares. Em 1998 foi reeleito senador pelo Amapá. Entre outras medidas a favor do estado, defendeu a extensão dos benefícios do porto de Manaus.

Em 1999, apresentou o primeiro projeto de lei instituindo cotas raciais. Sua proposta previa cota mínima de 20% para o preenchimento de vagas nos concursos a cargos públicos, nas instituições de ensino nos três níveis de governo — federal, estadual e municipal — e nos contratos do Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies). O projeto foi aprovado no Senado, mas, anexado ao Estatuto da Igualdade Racial, desapareceu na Câmara dos Deputados. Foi, no entanto, quem introduziu o uso de cotas nas instituições de ensino, que se tornaram um marco nas relações raciais no Brasil. Propôs também a criação da Política Nacional do Livro, a criação de um Fundo Nacional de Assistência à Vítimas de Violência, o Plano de Desenvolvimento Regional dos Municípios do Entorno do Parque do Tumucumaque.

Carreira literária
Ao lado de sua vida política, José Sarney desenvolve uma extensa carreira literária, como autor de contos, crônicas, ensaios e romances. Criador do Suplemento Literário de O Imparcial, participou de um grupo de escritores e artistas que se reunia na Movelaria Guanabara, em São Luís. Nesta época — começo da década de 1950 — edita com Luiz Carlos de Bello Parga e Bandeira Tribuzzi a revista A Ilha, porta voz do pós-modernismo no Maranhão, e par de revistas lançadas por todo o Brasil. A influência dominante no grupo é de Bandeira Tribuzzi, que estudara em Portugal e de lá trouxera a apreciação de Fernando Pessoa e dos poetas portugueses do segundo quarto do século XX. Sua colaboração esparsa lhe valeu a eleição precoce para a Academia Maranhense, em 1952, aos 22 anos. No ano seguinte lança um estudo antropológico, Pesquisa sobre a Pesca de Curral, e logo depois o primeiro livro de poesia, A Canção Inicial. Com a intensa atividade política dos anos seguintes, só voltaria a publicar literatura depois de um longo intervalo, justamente quando vivia a efervescência do governo do Maranhão. Trata-se de um livro de contos, Norte das Águas, escrito com uma linguagem de grande riqueza vocabular e domínio formal, saudado em todo o Brasil. Em 1978 voltou à poesia, com Os Maribondos de Fogo.

Depois de um intervalo em que publica um grande volume de discursos, retorna à literatura em 1995 com O Dono do Mar, romance em que renovaria as experiências formais de Norte das Águas, em um contexto de tempo múltiplo e forte erotismo. Em 2000 lança um novo romance, Saraminda, que o confirmaria como mestre do gênero, com uma escrita despojada e poética, ambientado na região fronteiriça entre o Amapá e a Guiana Francesa. Num terceiro romance, A Duquesa Vale uma Missa, de 2007, Sarney transfere o cenário literário para o eixo Rio-São Paulo. Sarney é autor de uma vasta colaboração na imprensa, onde se destaca a crônica semanal na Folha de S. Paulo, que retomada em 1991, publicou ininterruptamente durante mais de 20 anos. Estas crônicas foram recolhidas em oito volumes, e a Academia Brasileira de Letras publicou uma antologia, Tempo de Pacotilha.

Sarney foi eleito em 17 de julho de 1980 para suceder ao escritor José de Almeida na Academia Brasileira de Letras, onde ocupa a Cadeira 38, que tem como patrono o poeta Tobias Barreto. É o decano (o membro eleito há mais tempo) da agremiação.


Deixe seu comentário


Publicidade