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Corrupção, camisa amarela e tênis

O aumento, de 2010 até o ano passado, foi de 13 vezes, passando de R$ 1,1 bilhão naquele ano para R$ 13,7 bilhões em 2014. O resultado de tais medidas foi o crescimento nas transferências para grupos educacionais em mais de R$ 2 bilhões.



 

Fernando Rizzolo
Colaborador

Naquele domingo, 15 de março, estava decidido a me indignar nas ruas. Logo na noite de sábado separei meu tênis e uma antiga camiseta amarela que pouco tinha a ver com a bandeira brasileira – esta já tão machucada por tudo que se soube dos vários aspectos do nosso Brasil: corrupção na Petrobrás (ainda com a imagem do presidente Lula de macacão manchado de óleo), das promessas da presidente Dilma sobre o pré-sal, enfim – o meu tênis e a minha camisa estavam bem ali, prontos para serem usados. Era como que, ao vesti-los, pudesse externar minha indignação. Diante do silêncio do governo e principalmente da presidente Dilma, compensaria minha revolta.

Por alguns minutos relutei, isso no domingo, em ir às ruas e decidi por fim ficar em casa, embora a televisão tenha permanecido ligada. Numa cadeira do quarto observava meu tênis e a minha camiseta inertes, como que dizendo que de nada adiantaria me juntar à multidão. Entretanto, mesmo que pela tevê, valeria a pena acompanhar a disposição de milhões de brasileiros, como eu, indignados.

A grande pergunta que realmente intriga é porque a presidente Dilma não se desculpou em público sobre o evento de maior corrupção que assustou o mundo, o da Petrobrás, apesar de no dia seguinte abordar o tema da “humildade”. Outra atitude lamentável do governo é sua posição, de certa forma, refratária ao ajuste fiscal. Prova dessa condição é a ameaça do ministro Joaquim Levy de abandonar o barco. Ainda há que se considerar certas políticas que são eleitoreiras como a “farra do Fies”, por exemplo. Criado em 1999 com a finalidade de emprestar dinheiro para alunos cursarem faculdades particulares, o Fies teve uma explosão de contratos após mudanças promovidas em 2010 para elevar o número de matrículas. Os juros caíram de 6,5% para 3,4% ao ano, abaixo da inflação.

Além disso, o financiamento pôde ser obtido a qualquer momento, a exigência de fiador foi relaxada e o prazo de quitação, alongado. Na verdade, de lá para cá, o total gasto por ano pelo governo federal com crédito estudantil disparou. O aumento, de 2010 até o ano passado, foi de 13 vezes, passando de R$ 1,1 bilhão naquele ano para R$ 13,7 bilhões em 2014. O resultado de tais medidas foi o crescimento nas transferências para grupos educacionais em mais de R$ 2 bilhões. Várias instituições de ensino receberam o dobro do que a Embraer, fabricante de aviões militares, e a Odebrecht, responsável por dezenas de obras pelo Brasil.

Vivemos num país corroído pela falta de valores, temos políticos corruptos, instituições enfraquecidas e, o pior, o povo brasileiro pouco pode fazer a não ser protestar nas ruas. Eu, enfim, acabei não indo, talvez porque no fundo meu tênis e a minha camiseta me soavam dizendo “prefira o luto, ficando em casa e se indignando em frente a sua televisão”. Assim, passei meu 15 de março com roupa normal e de mal com esta democracia.


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