Entrevista

Quadrinhos falam também de pessoas normais.

A semana foi marcada por uma exposição no Sesc Amapá sobre o universo geek, aficionados em desenhos e quadrinhos. Então o Diário repercute hoje um grande nome do segmento, ilustrador de quadrinho que inspirou até uma série da Netflix.


Cleber Barbosa
Da Redação

 

Diário do Amapá – Quando a gente olha para uma obra, é legal saber o que inspirou a pessoa que a produziu. Nesse sentido, qual foi o quadrinho ou os quadrinhos que fizeram você se apaixonar por essa forma narrativa?

Gabriel Bá – Bom, com certeza os quadrinhos de super-herói me fizeram viciar em quadrinhos. Porque eles têm essa forma de novela, em que todo mês sai um capítulo novo com aquele personagem. Eu comprava gibis em um sebo, em uma cidade do interior onde meus avós moravam. E eu lia os gibis e, na semana seguinte, quando ia visitar meus avós, trocava o [gibi] velho pelos novos. Então eu não tinha os gibis. Mas aí eu comecei a ler uma história de super-heróis, especificamente uma que se chamava Superaventuras Marvel, que era uma coletânea, uma antologia. E as Superaventuras Marvel tinham as histórias do X-Men, que, pra quem tem a minha idade e nasceu antes de ter desenho animado dos X-Men na TV, você lia aquilo e falava xis-Men. Então nada mais é do que novela, né?

 

Diário – Muitas possibilidades, não é?

Gabriel Bá – Exatamente. Um monte de personagens, um monte de pessoas que são desajustadas, não são aceitas pela sociedade porque são mutantes e, ainda assim, são heróis. A partir daquele momento eu não queria mais trocar o quadrinho no sebo. Eu queria ir à banca e comprar o novo. E aí eu comecei a acompanhar as histórias. Nessa época, eu nem sabia que existia o roteirista e o quadrinista. Achava que eram a mesma pessoa.

 

Diário – Nos quadrinhos você tem uma estética própria, enquanto a estética da série é, claro, uma adaptação. Como você entende essa mudança na linguagem visual entre as duas mídias?

Gabriel Bá – Durante muito tempo, antes dessa história de adaptação existir, eu ficava muito mais preocupado com esse tipo de fidelidade da imagem, como os personagens iam ser transpostos. Então [na série] todos os personagens têm uma abordagem um pouquinho mais naturalista, até porque conversa com outro público. O público de história em quadrinho, hoje em dia está se ampliando, mas é um público mais restrito, que está acostumado com personagens mais absurdos. O público que assiste a TV não é assim. Então, para tentar atingir um público um pouco maior, a gente teve que pegar esses personagens e tentar colocar em um pacote um pouquinho mais realista, um pouquinho mais normal, digamos assim. Quando eu comecei a ver que todas as decisões, todas as mudanças, não só estéticas, mas da história, tinham uma intenção que beneficiava esse produto que era a série de TV, aos poucos eu fui deixando o lado fã, que quer que fique igual [ao quadrinho], e encarando como uma outra coisa. Então pra mim o mais importante é que essa outra coisa seja bem feita, seja bem contada e faça sentido dentro do universo da história da série.

Diário – Você se formou na Escola de Arte Dramática (ECA), que tem um perfil de curso de Artes Visuais mais acadêmico. Quais eram suas expectativas quando você entrou na ECA e, depois, quando saiu?

Gabriel Bá – Quando entrei na USP, eu já queria fazer quadrinhos, mas não tinha faculdade de quadrinhos. Então pensei “O que vou fazer? Vou fazer Artes Plásticas”. Tem a ver, tem desenho (risos). Achei que eu iria aprender a pintar, esculpir, essas coisas todas que você não aprende, não é? Tinha muita aula teórica, que sempre achei interessante porque gosto de História. Mas a gente entra na faculdade e conhece outras pessoas, que vêm de lugares diferentes, que já fizeram outra faculdade, que gostam de quadrinhos, que faziam quadrinhos já na faculdade. E a USP tem essa magia. Eu me inscrevi em um monte de coisas, mil coisas novas que eu não estava esperando. Mas, durante esse tempo todo aqui na faculdade, eu fui entendendo que não era para fazer o que eu achava que era desenho. Era pra eu tentar descobrir o que eu queria, qual era meu trabalho, o que eu queria dizer, e aí tentar fazer isso. Então eu fui descobrindo.

 

Diário – E tem amigos dessa época ainda hoje, gente, por exemplo que se manteve nesse segmento ou a maioria migrou para outras áreas?

Gabriel Bá – Agora, honestamente mesmo, acho que a melhor coisa que eu aprendi na ECA foi porque a ECA tinha 13 cursos, outras profissões. Então eu convivia com gente que não era só desenhista, artista. Da minha turma de Artes Plásticas, tenho um amigo hoje. Das outras profissões, tenho dezenas.

 

Perfil

Gabriel Bá – Quadrinista famoso por sua séries populares como ROCK’n’ROLL, Daytripper e The Umbrella Academy. Ele também é criador da aclamada história em quadrinhos De:Tales, de 2006.

 

Dados de sua biografia

-Gabriel Bá (São Paulo, 5 de junho de 1976) é um quadrinista brasileiro, nascido no estado de São Paulo, sendo um dos mais premiados quadrinistas brasileiros da atualidade. Junto com seu irmão gêmeo Fábio Moon, já publicou trabalhos nos EUA, Itália e Espanha. Foram os primeiros brasileiros a ganharem o Prêmio Eisner de quadrinhos.

 

Antes da Fama

– Ele começou a publicar histórias em quadrinhos de forma independente em 1993.

Curiosidades

– Sua história The Umbrella Academy ganhou o prêmio Eisner de quadrinhos em 2008.

Vida pessoal
– Seu irmão gêmeo, Fábio Moon, também é desenhista.

Ligações

– Ele trabalhou com o cantor Gerard Way, da banda My Chemical Romance, nos quadrinhos The Umbrella Academy.


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