Política

Advogados debatem no rádio julgamento de Lula que ocorre amanhã em Porto Alegre

Helder Carneiro vê possibilidade de prescrição dos crimes e diz que não há prova de que o ex-presidente praticou qualquer crime no caso do triplex de Guarujá. Mesmo assim, ele acredita na confirmação da sentença condenatória por causa da forte pressão popular. Wagner Gomes afirma que resultado é imprevisível, e diz que a possibilidade do clamor popular influenciar no julgamento é remota.


O julgamento do recurso de apelação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva divide a opinião e a posição dos brasileiros, e atrai a atenção de todo o planeta. Representantes de vários países vêm manifestando preocupação com o julgamento do petista, que já foi citado por Barak Obama como “o político mais popular do mundo”. Na semana passada congressistas dos Estados Unidos divulgaram uma carta mostrando preocupação com o julgamento de Lula no caso triplex, argumentando que, até aqui, o processo tem sido denunciado por violações de direitos e evidências de que se trata de uma  perseguição judicial motivada por interesses políticos.

A carta diz que o julgamento em primeira instância se deu nas mãos do juiz Sergio Moro, que agiu como o chefe da acusação contra Lula. Para os congressistas norte-americanos, Moro foi escolhido para o caso porque as frágeis acusações contra o ex-presidente seriam rejeitadas por qualquer outro magistrado, afirmando que o ex-presidente foi acusado por receber um triplex reformado que pertence à OAS, e condenado sem nenhuma prova de que ele ou sua família tenham usufruído do apartamento. Ao contrário disso, a única “prova” que a Lava Jato levou aos autos, nesse sentido, foi o depoimento de Léo Pinheiro, que teve a “sentença drasticamente reduzida” por Moro, após ajudar os procuradores.

Para os congressistas estadunidentes, “Infelizmente” já existem sinais de que o julgamento na segunda instância, que ocorre nesta quarta-feira (24) em Porto Alegre (RS), “também foi contaminado pela perseguição a Lula”. Eles citam a entrevista em que o presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), Thompson Flores, elogia a sentença de Moro como “impecável” e o fato de que sua chefe de gabinete manifestou-se, nas redes sociais, a favor da prisão do petista. No Amapá a população também aguarda com ansiedade o julgamento e está dividida. O meio jurídico também está dividido no que diz respeito ao resultado do julgamento, o que motivou um debate na manhã desta terça-feira (23) no programa LuizMeloEntrevista (DiárioFM 90,9), que reuniu os advogados criminalistas Helder Carneiro e Wagner Gomes, que possuem opiniões conflitantes, com a participação, ao vivo, de ouvintes.

Para Wagner Gomes, não há porque não confiar no Judiciário, porque no entendimento dele, o TRF4 não é uma instituição política e, apesar do clamor popular, vai garantir o amplo direito de defesa e do contraditório ao ex-presidente: “Claro que o clamor popular influencia, muitas vezes decisivamente, em todos os setores da realidade humana, mas eu como advogado tenho que confiar no Judiciário, o Lula possui grandes advogados e o Tribunal Regional Federal da 4ª Região com certeza vai dar ale a garantia constitucional da mais ampla defesa e do contraditório, fazendo um julgamento justo”.

Helder Carneiro pensa diferente. Segundo ele, apesar da absoluta falta de prova no caso do triplex do Guarujá, oficialmente em nome da construtora OAS, mas atribuída a Lula, motivo da condenação e que é o objeto do recurso, a confirmação da sentença do juiz Sérgio Moro é previsível: “Eu acho que ele vai ter a condenação mantida exclusivamente por causa do clamor popular, da pressão popular, porque o conjunto probatório não ampara essa condenação no caso específico do triplex, que é o que estará sendo julgado. Por isso sou de opinião que essa condenação foi uma injustiça”.

Possibilidade de prescrição
Helder Carneiro também considera a possibilidade dos desembargadores considerarem que os crimes prescritos, isto é, a perda do direito de punir do Estado pelo seu não exercício em determinado lapso de tempo. Conforme explicou o criminalista, existem duas maneiras de se computar a prescrição: a primeira pela pena em abstrato e a segunda pela pena em concreto. No caso em abstrato, ainda não há condenação penal, motivo pelo qual é utilizado como base para o cálculo da prescrição a pena máxima em prevista para o delito. No caso em concreto, a pena constante na sentença, que houver transitado em julgado ao menos para acusação, é que serve de base para o cálculo da prescrição.

“A prescrição é conceituada como a perda da pretensão do titular de um direito que não o exerceu em determinado lapso temporal. É importante destacar que se conta a prescrição em cada crime, e não no cômputo da condenação, isto é, os 9 anos que totalizam as penas dos crimes, por exemplo os 5 anos por corrupção e os 4 por lavagem de dinheiro. Tem também o fato de que o Lula tem mais de 70 anos, e nessa caso a prescrição conta pela metade, por isso entendo que os desembargadores da Turma do TRF4 que vão julgar o recurso poderão entender que os crimes pelos quais o Lula foi condenado estão prescritos”, analisou Helder Carneiro.

Questionado por um ouvinte sobre porque o deputado federal Paulo Maluf, que possui mais de 80 anos, não foi beneficiado pela prescrição, considerando o lapso temporal de mais de 25 anos da suposta prática dos crimes pelos quais ele foi condenado, Helder respondeu que não tem como explicar porque não conhece o processo, mas ponderou que se sente mais embasado para emitir opinião sobre o caso do ex-presidente Lula por causa da ampla repercussão e detalhamento que vem sendo pela imprensa, diferentemente do caso do deputado paulistas:

– Eu não posso falar (do processo do Maluf) porque não conheço os autos. No caso do Lula eu também estou trabalhando em tese, com base nas informações que são veiculadas pela imprensa, que são mais detalhadas do que o caso do Paulo Maluf. O mais interessante é que os advogados do Lula falam claramente em absolvição, sem priorizar a prescrição, e isso ocorre, eu creio, porque eles estão pensando na questão política, porque ocorrendo a absolvição vai pesar mais politicamente perante a opinião pública para o ex-presidente, com foco na eleição presidencial, do que a prescrição, por isso os advogados não estão falando explicitamente em prescrição, apesar do fato de que eles fizeram essa arguição na semana passada ao TRF4, quando também pediram que, em caso de condenação, seja garantido o direito ao Lula de recorrer em liberdade – pontuou Helder Carneiro.

Instado pela bancada do programa a comentar, Wagner Gomes concordou com Helder Carneiro nesse ponto, mas ressaltou a necessidade de um julgamento justo e equilibrado, e também se manifestou sobre a possibilidade da pressão popular influenciar os desembargadores federais: “É necessário levar em conta sobre a necessidade de um julgamento justo e equilibrado, com base nas provas dos autos, no contexto probatório, porque o Lula tem que ser julgado como qualquer outro cidadão brasileiro, garantido o direito constitucional da ampla defesa e do contraditório e, se for culpado, que seja condenado, porque ‘pau que dá em Chico tem que dar também em Francisco’. Mas eu creio que tanto os desembargadores do TRF4, como os ministros do STJ (Superior Tribunal de Justiça) e o STF (Supremo Tribunal Federal) vão agir com equilíbrio e com justiça, apesar do fato de que o clamor popular vem influenciando (no caso do ex-presidente) desde o inicio. Entretanto, eu acho que, pelas informações divulgadas pela imprensa, nesse caso triplex o conjunto probatório contra ele é muito falho. Diante de tudo isso eu não posso descartar na possibilidade, por mais remota que seja da pressão popular influenciar a decisão dos três juízes que vão julgar o recurso”.

Possibilidade de Lula ficar inelegível
Ao descartar a possibilidade do ex-presidente ser preso em caso de confirmação da sentença do juiz Sérgio Moro, Helder Carneiro considerou, também, que Lula não ficará inelegível até pelo menos o registro da candidatura, que deverá na opinião dele, se sustentar até após o pleito eleitoral por causa dos recursos cabíveis.

“Caso mantida a condenação pelo TRF4 eu descarto a possibilidade de prisão, porque a defesa ainda poderá recorrer no próprio Tribunal, pois caberá Embargo de Declaração, que é o instrumento jurídico usado por uma das partes de um processo judicial para pedir ao juiz ou tribunal que esclareça determinados aspectos de uma decisão proferida quando há alguma dúvida, omissão, contradição ou obscuridade, e que suspende os prazos recursais. Além disso, se houver um voto divergente também caberá embargos divergentes, que é o recurso usado para impugnar decisão colegiada, nesse caso a Turma do TRF4. Após esgotados todos os recursos sim, mas como a tramitação desses recursos historicamente é longa, demanda muito tempo, acredito que o registro da candidatura dele à presidente da República deverá ocorrer, com a possibilidade do Lula concorrer sem problema nas eleições de outubro”, previu.

Também nesses aspectos Wagner Gomes concordou com Helder Carneiro: “Concordo inteiramente com o doutor Helder, porque o Lula não será preso imediatamente, e em caso de confirmação da sentença do juiz Sérgio Moro pelo TRF4 ele também não ficará inelegível, porque a Lei da Ficha Limpa torna inelegível quem é condenado com sentença transitada em julgado no 2º Grau de Jurisdição, isto é, até esgotados todos os recursos no Tribunal. Com certeza o Lula terá condições legais de registrar a candidatura e tentar efeito suspensivo nos recurso para disputar a eleição. Até lá o processo vai percorrer um longo caminho, ainda devendo permanecer um bom tempo no TRF4, depois o STJ e posteriormente, se for o caso de caber recurso extraordinário, vai ao STF. O que eu lamento, e isso eu não posso deixar de colocar, é que o julgamento do Lula foi partidarizado, e o que deveria ser apenas um processo judicial acabou virando jogo político”.


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