Pe. Claudio Pighin

Comunicar encontrando as pessoas onde estão e como são (II parte)

O próprio jornalismo, como exposição da realidade, requer a capacidade de ir aonde mais ninguém vai: mover-se com desejo de ver. Uma curiosidade, uma abertura, uma paixão. Temos que agradecer à coragem e determinação de tantos profissionais (jornalistas, operadores de câmara, editores, cineastas que trabalham muitas vezes sob grandes riscos), se hoje conhecemos, por exemplo, a difícil condição das minorias perseguidas em várias partes do mundo, se muitos abusos e injustiças contra os pobres e contra a criação foram denunciados, se muitas guerras esquecidas foram noticiadas. Seria uma perda não só para a informação, mas também para toda a sociedade e para a democracia, se faltassem estas vozes: um empobrecimento para a nossa humanidade.

Numerosas realidades do planeta – e mais ainda neste tempo de pandemia – dirigem ao mundo da comunicação um convite a «ir e ver». Há o risco de narrar a pandemia ou qualquer outra crise só com os olhos do mundo mais rico, de manter uma «dupla contabilidade». Por exemplo, na questão das vacinas e dos cuidados médicos em geral, pensemos no risco de exclusão que correm as pessoas mais indigentes. Quem nos contará a expectativa de cura nas aldeias mais pobres da Ásia, América Latina e África? Deste modo as diferenças sociais e económicas a nível planetário correm o risco de marcar a ordem da distribuição das vacinas anti-Covid, com os pobres sempre em último lugar; e o direito à saúde para todos, afirmado em linha de princípio, acaba esvaziado da sua valência real. Mas, também no mundo dos mais afortunados, permanece oculto em grande parte o drama social das famílias decaídas rapidamente na pobreza: causam impressão, mas sem merecer grande espaço nas notícias, as pessoas que, vencendo a vergonha, fazem a fila à porta dos centros da Cáritas para receber uma ração de víveres.

A rede, com as suas inumeráveis expressões nos social, pode multiplicar a capacidade de relato e partilha: muitos mais olhos abertos sobre o mundo, um fluxo contínuo de imagens e testemunhos. A tecnologia digital dá-nos a possibilidade duma informação em primeira mão e rápida, por vezes muito útil; pensemos nas emergências em que as primeiras notícias e mesmo as primeiras informações de serviço às populações viajam precisamente na web. É um instrumento formidável, que nos responsabiliza a todos como utentes e desfrutadores. Potencialmente, todos podemos tornar-nos testemunhas de acontecimentos que de contrário seriam negligenciados pelos meios de comunicação tradicionais, oferecer a nossa contribuição civil, fazer ressaltar mais histórias, mesmo positivas. Graças à rede, temos a possibilidade de contar o que vemos, o que acontece diante dos nossos olhos, de partilhar testemunhos.

Entretanto foram-se tornando evidentes, para todos, os riscos duma comunicação social não verificável. Há tempo que nos demos conta de como as notícias e até as imagens sejam facilmente manipuláveis, por infinitos motivos, às vezes por um banal narcisismo. Uma tal consciência crítica impele-nos, não a demonizar o instrumento, mas a uma maior capacidade de discernimento e a um sentido de responsabilidade mais maduro, seja quando se difundem seja quando se recebem conteúdos. Todos somos responsáveis pela comunicação que fazemos, pelas informações que damos, pelo controlo que podemos conjuntamente exercer sobre as notícias falsas, desmascarando-as. Todos estamos chamados a ser testemunhas da verdade: a ir, ver e partilhar. (Continua no próximo).

Comunicar encontrando as pessoas onde estão e como são

Oconvite a «ir e ver», que acompanha os primeiros e comovedores encontros de Jesus com os discípulos, é também o método de toda a comunicação humana autêntica. Para poder contar a verdade da vida que se faz história, é necessário sair da presunção cómoda do «já sabido» e mover-se, ir ver, estar com as pessoas, ouvi-las, recolher as sugestões da realidade, que nunca deixará de nos surpreender em algum dos seus aspetos. «Abre, maravilhado, os olhos ao que vires e deixa as tuas mãos cumular-se do vigor da seiva, de tal modo que os outros possam, ao ler-te, tocar com as mãos o milagre palpitante da vida»: aconselhava o Beato Manuel Lozano Garridoaos seus colegas jornalistas. Por isso, este ano, desejo dedicar a Mensagem à chamada a «ir e ver», como sugestão para toda a expressão comunicativa que queira ser transparente e honesta: tanto na redação dum jornal como no mundo da web, tanto na pregação comum da Igreja como na comunicação política ou social. «Vem e verás» foi o modo como a fé cristã se comunicou a partir dos primeiros encontros nas margens do rio Jordão e do lago da Galileia.

Pensemos no grande tema da informação. Há já algum tempo que vozes atentas se queixam do risco dum nivelamento em «jornais fotocópia» ou em noticiários de televisão, rádio e websites que são substancialmente iguais, onde os géneros da entrevista e da reportagem perdem espaço e qualidade em troca duma informação pré-fabricada, «de palácio», autorreferencial, que cada vez menos consegue interceptar a verdade das coisas e a vida concreta das pessoas, e já não é capaz de individuar os fenómenos sociais mais graves nem as energias positivas que se libertam da base da sociedade. A crise editorial corre o risco de levar a uma informação construída nas redações, diante do computador, nos terminais das agências, nas redes sociais, sem nunca sair à rua, sem «gastar a sola dos sapatos», sem encontrar pessoas para procurar histórias ou verificar com os próprios olhos determinadas situações. Mas, se não nos abrimos ao encontro, permanecemos espectadores externos, apesar das inovações tecnológicas com a capacidade que têm de nos apresentar uma realidade engrandecida onde nos parece estar imersos. Todo o instrumento só é útil e válido, se nos impele a ir e ver coisas que de contrário não chegaríamos a saber, se coloca em rede conhecimentos que de contrário não circulariam, se consente encontro que de contrário não teriam lugar.

Aos primeiros discípulos que querem conhecer Jesus, depois do seu Batismo no rio Jordão, Ele responde: «Vinde e vereis», convidando-os a permanecer em relação com Ele. Passado mais de meio século, quando João, já muito idoso, escreve o seu Evangelho, recorda alguns detalhes «de crónica» que revelam a sua presença no local e o impacto que teve na sua vida aquela experiência: «era cerca da hora décima», observa ele! Isto é, as quatro horas da tarde. No dia seguinte (narra ainda João), Filipe informa Natanael do encontro com o Messias. O seu amigo, porém, mostra-se cético: «De Nazaré pode vir alguma coisa boa?» Filipe não procura convencê-lo com raciocínios, mas diz-lhe: «vem e verás». Natanael vai e vê, e a partir daquele momento a sua vida muda. A fé cristã começa assim; e comunica-se assim: com um conhecimento direto, nascido da experiência, e não por ouvir dizer. «Já não é pelas tuas palavras que acreditamos; nós próprios ouvimos…»: dizem as pessoas à Samaritana, depois de Jesus Se ter demorado na sua aldeia. O método «vem e verás» é o mais simples para se conhecer uma realidade; é a verificação mais honesta de qualquer anúncio, porque, para conhecer, é preciso encontrar, permitir à pessoa que tenho à minha frente que me fale, deixar que o seu testemunho chegue até mim. (Continua no próximo).

A vida que tentamos preservar

Uma criança luta entre a vida e a morte. Não consegue nem mais chorar, somente os seus olhos estão estarrecidos, levantando as mãozinhas para o alto. Essa imagem triste e desoladora é a realidade de uma humanidade que vive em constante perigo. Às vezes, temos essa consciência, mas na maioria das vezes somos inconscientes. Não é somente a covid-19, mas inúmeras situações de perigo que enfrentamos diariamente. A partir de uma situação pessoal à comunitária, da própria cidade ao próprio país, das nações ao planeta inteiro, estamos em constante perigo de vida.

Lembro-me de um jovem que me disse alguns anos atrás: “De noite, deitado na cama, eu fico olhando o teto do quarto e, no entanto, a companheira dorme tranquilamente!” Uma perfeita imagem de maneira diferente para enfrentar a realidade. Tem gente que se desespera, entra em pânico e tem outra que não está nem aí, ou não se importa com nada. A nossa humanidade está dividida ao enfrentar a história. E essa divisão gera sempre mais separações. Com isto, é evidente que enfraquece a convivência humana, levando-a a contraposições de desconfiança, de inimizade, de hostilidades e ódios.

Essa situação leva os povos a se enfraquecerem e a não terem a capacidade de se unir para combater tudo aquilo que ameaça a vida da humanidade. Então, eu me pergunto: “Se a gente não consegue discernir as pessoas como irmãos, que tem o mesmo percurso histórico de vida, como podemos nos unir para caminhar juntos e enfrentar juntos o que a vida nos reserva?” A verdadeira pandemia é também essa calamidade de vivermos como inimigos, separados na construção da vida. Não sabemos ir além dos nossos pontos de vista para compreender a realidade.

Aliás, fazemos dessa maneira de compreensão unívoca o absoluto e, portanto, não conseguimos mais ver os outros pontos de vista das outras pessoas. Fazemos das nossas ideologias algo de absoluto, totalitário, fechando assim as portas das convivências fraternas. Creio que para superar tudo isso precisamos partir mais que das ideias das pessoas. São elas que nos interpelam para construir uma humanidade que saiba enfrentar juntos as ameaças da vida. Saber derrotar as pandemias faz parte da vida da humanidade.

É bom reafirmar: temos uma certeza, as pandemias, as ameaças, chegarão mais ainda, porém, o problema é derrotá-las. Como? Isto depende de nós. Se sabemos discernir as realidades a partir das pessoas e não das ideias. Devemos ser mais realistas para discernir a vida dos outros. Não podemos viver despreocupados, viver no sono da vida, e tanto menos traumatizar a nossa conduta de vida, a nossa convivência. É a sabedoria de andarmos juntos que podemos ter a capacidade de sairmos esperançosos e vitoriosos de vida. E essa caminhada fraterna se constrói na humildade e no serviço, despojados de qualquer desejo ambicioso de títulos e de poder.

Precisamos ter a capacidade de nos revestir de São Francisco para reforçar a nossa condição de servidores. Nem com sono nem traumatizados: continuar a nossa vida.

Papa Francisco: dia mundial dos doentes (II parte)

Continua o papa Francisco:

“Viu-se que, aos idosos, aos mais frágeis e vulneráveis, nem sempre é garantido o acesso aos cuidados médicos, ou não o é sempre de forma equitativa. Isto depende das opções políticas, do modo de administrar os recursos e do empenho de quantos revestem funções de responsabilidade. O investimento de recursos nos cuidados e assistência das pessoas doentes é uma prioridade ditada pelo princípio de que a saúde é um bem comum primário. Ao mesmo tempo, a pandemia destacou também a dedicação e generosidade de profissionais de saúde, voluntários, trabalhadores e trabalhadoras, sacerdotes, religiosos e religiosas: com profissionalismo, abnegação, sentido de responsabilidade e amor ao próximo, ajudaram, trataram, confortaram e serviram tantos doentes e os seus familiares. Uma série silenciosa de homens e mulheres que optaram por fixar aqueles rostos, ocupando-se das feridas de pacientes que sentiam como próximo em virtude da pertença comum à família humana.

Com efeito, a proximidade é um bálsamo precioso, que dá apoio e consolação a quem sofre na doença. Enquanto cristãos, vivemos tal proximidade como expressão do amor de Jesus Cristo, o bom Samaritano, que, compadecido, Se fez próximo de todo o ser humano, ferido pelo pecado. (…)E vivemos esta proximidade pessoalmente, mas também de forma comunitária: na realidade, o amor fraterno em Cristo gera uma comunidade capaz de curar, que não abandona ninguém, que inclui e acolhe sobretudo os mais frágeis.

A propósito, quero recordar a importância da solidariedade fraterna, que se manifesta concretamente no serviço, podendo assumir formas muito diferentes mas todas elas tendentes a apoiar o próximo. Neste compromisso, cada um é capaz de, «à vista concreta dos mais frágeis (…), pôr de lado as suas exigências e expectativas, os seus desejos de omnipotência (…): o serviço fixa sempre o rosto do irmão, toca a sua carne, sente a sua proximidade e, em alguns casos, até “padece” com ela e procura a promoção do irmão. Por isso, o serviço nunca é ideológico, dado que não servimos ideias, mas pessoas».

Para haver uma boa terapia é decisivo o aspecto relacional, através do qual se pode conseguir uma abordagem holística da pessoa doente. A valorização deste aspecto ajuda também os médicos, enfermeiros, profissionais e voluntários a ocuparem-se daqueles que sofrem para os acompanhar ao longo do itinerário de cura, graças a uma relação interpessoal de confiança. Trata-se, pois, de estabelecer um pacto entre as pessoas carecidas de cuidados e aqueles que as tratam; um pacto baseado na confiança e respeito mútuos, na sinceridade, na disponibilidade, de modo a superar toda e qualquer barreira defensiva, colocar no centro a dignidade da pessoa doente, tutelar o profissionalismo dos agentes de saúde e manter um bom relacionamento com as famílias dos doentes.

Tal relação com a pessoa doente encontra uma fonte inesgotável de motivações e energias precisamente na caridade de Cristo, como demonstra o testemunho milenar de homens e mulheres que se santificaram servindo os enfermos. (…)

Queridos irmãos e irmãs, o mandamento do amor, que Jesus deixou aos seus discípulos, encontra uma realização concreta também no relacionamento com os doentes. Uma sociedade é tanto mais humana quanto melhor souber cuidar dos seus membros frágeis e atribulados e o fizer com uma eficiência animada por amor fraterno. (…)”

FRANCISCO.

Papa Francisco: dia mundial dos doentes

A celebração do XXIX Dia Mundial do Doente que tem lugar a 11 de fevereiro de 2021, memória de Nossa Senhora de Lurdes, é momento propício para prestar uma atenção especial às pessoas doentes e a quantos as assistem quer nos centros sanitários quer no seio das famílias e comunidades. Penso de modo particular nas pessoas que sofrem em todo o mundo os efeitos da pandemia do coronavírus. A todos, especialmente aos mais pobres e marginalizados, expresso a minha proximidade espiritual, assegurando a solicitude e o afeto da Igreja.

O tema deste Dia inspira-se no trecho evangélico em que Jesus critica a hipocrisia de quantos dizem mas não fazem (Mt 23, 1-12). Quando a fé fica reduzida a exercícios verbais estéreis, sem se envolver na história e nas necessidades do outro, então falha a coerência entre o credo professado e a vida real. O risco é grave; Jesus, para acautelar do perigo de derrapagem na idolatria de si mesmo, usa expressões fortes e afirma: «Um só é o vosso Mestre e vós sois todos irmãos».

Esta crítica feita por Jesus àqueles que «dizem e não fazem» é sempre salutar para todos, pois ninguém está imune do mal da hipocrisia, um mal muito grave, cujo efeito é impedir-nos de desabrochar como filhos do único Pai, chamados a viver uma fraternidade universal.

Como reação à necessidade em que versa o irmão e a irmã, Jesus apresenta um modelo de comportamento totalmente oposto à hipocrisia: propõe deter-se, escutar, estabelecer uma relação direta e pessoal, sentir empatia e enternecimento, deixar-se comover pelo seu sofrimento até lhe valer e servir (Lc 10, 30-35).

A experiência da doença faz-nos sentir a nossa vulnerabilidade e, ao mesmo tempo, a necessidade natural do outro. Torna ainda mais nítida a nossa condição de criaturas, experimentando de maneira evidente a nossa dependência de Deus. De fato, quando estamos doentes, a incerteza, o temor e, por vezes, o pavor impregnam a mente e o coração; encontramo-nos numa situação de impotência, porque a saúde não depende das nossas capacidades nem do nosso afã (Mt 6, 27).

A doença obriga a questionar-se sobre o sentido da vida; uma pergunta que, na fé, se dirige a Deus. Nela, procura-se um significado novo e uma direção nova para a existência e, por vezes, pode não encontrar imediatamente uma resposta. Os próprios amigos e familiares nem sempre são capazes de nos ajudar nesta busca afanosa.
Emblemática a este respeito é a figura bíblica de Jó. A esposa e os amigos não conseguem acompanhá-lo na sua desventura; antes, acusam-no aumentando nele solidão e desorientamento. Jó cai num estado de abandono e confusão. Mas é precisamente através desta fragilidade extrema, rejeitando toda a hipocrisia e escolhendo o caminho da sinceridade para com Deus e os outros, que faz chegar o seu grito instante a Deus, que acaba por responder abrindo-lhe um novo horizonte: confirma que o seu sofrimento não é uma punição nem um castigo, tal como não é distanciamento de Deus nem sinal de indiferença d’Ele. E assim, do coração ferido e recuperado de Jó, brota aquela vibrante e comovente declaração ao Senhor: «Os meus ouvidos tinham ouvido falar de Ti, mas agora veem-Te os meus próprios olhos» (Jó 42, 5).

A doença tem sempre um rosto, e até mais do que um: o rosto de todas as pessoas doentes, mesmo daquelas que se sentem ignoradas, excluídas, vítimas de injustiças sociais que lhes negam direitos essenciais (Fratelli tutti, 22). A atual pandemia colocou em evidência tantas insuficiências dos sistemas sanitários e carências na assistência às pessoas doentes. (Continuação na próxima).

Cultura do cuidado como percurso de paz

“É doloroso constatar que, ao lado de numerosos testemunhos de caridade e solidariedade, infelizmente ganham novo impulso várias formas de nacionalismo, racismo, xenofobia e também guerras e conflitos que semeiam morte e destruição. Estes e outros acontecimentos, que marcaram o caminho da humanidade no ano de 2020, ensinam-nos a importância de cuidarmos uns dos outros e da criação a fim de se construir uma sociedade alicerçada em relações de fraternidade. Por isso, escolhi como tema desta mensagem «a cultura do cuidado como percurso de paz»; a cultura do cuidado para erradicar a cultura da indiferença, do descarte e do conflito, que hoje muitas vezes parece prevalecer.” Com essas palavras o papa Francisco nos convida como perseguir a paz nesse novo ano. A paz é possível por meio de uma informação de paz. Duas realidades fundamentais para a convivência humana. Parece que estão em risco. O nosso mundo, onde o progresso avança sempre mais e a tecnologia da mídia se expande com ritmos acelerados, mostra-nos a real ligação e dependência entre esses dois fatores, a comunicação e a informação.

Estamos dominados pelo determinismo tecnológico. Reconhecemos que o ser humano possa encontrar as soluções por meio da sua capacidade do saber e do dialogar. No entanto, nos questionamos: será que estamos ensaiando, vivendo esta dimensão do saber e do dialogar?

Pelo menos nós da Igreja nos interrogamos o que estamos fazendo, de fato, em relação a isso. Despertemos, porque a paz tem pressa, não pode nos esperar, porque bilhões de crianças, mulheres e homens estão vivendo de maneira dramática. A paz não é simplesmente a ausência da guerra e nem é promovida apenas para evitar o conflito mais vasto. Ao contrário, ajuda a orientar o nosso raciocínio e as nossas ações para o bem de todos. Ela se torna uma filosofia de ação que nos ajuda a sermos todos responsáveis pelo bem comum e nos obriga a dedicarmos todos os nossos esforços para a sua causa.

Vejamos, por exemplo, como a informação é submetida a limitações e condicionamentos políticos e econômicos, arriscando, assim, de ser sempre menos independente, livre e insuficiente. Desde sempre, a guerra como o terrorismo se alimentam por uma informação facciosa, parcial e duvidosa que gera medo, ódio e violência. Ao mesmo tempo, cada vez que se esconde ou se muda a verdade, que se obscurece uma manifestação ou projeto de paz, que se privilegiam os interesses de uns no lugar do bem comum, cumpre-se assim um grave atentado à construção da paz.

Infelizmente, os grandes e poderosos meios de informação geralmente difundem uma falsa ideia da paz que se associa a inércia, renúncia, entrega, resignação, impotência. As imagens, palavras e atitudes irresponsáveis transmitem princípios e comportamentos que corroem as raízes por uma cultura da paz. Porém, a paz se gera e mantém com uma informação e uma comunicação livre, se preocupa com o bem comum, é próxima aos direitos e as necessidades das pessoas. Assim sendo, uma livre informação pode crescer somente na paz.

Por isso, eu acredito na paz, porém, não podemos nos iludir que isto aconteça sem uma nossa colaboração. O nosso papel é fundamental em acreditar que é possível se dedicar para dar a nossa contribuição. Nesse sentido, no ano 2021 não devemos “dormir”, mas acordar as nossas aspirações para uma cultura de paz.

Natal na pandemia

A celebração do Santo Natal na pandemia nos deixa bem tristes e mais medrosos. Perante uma realidade de incertezas da vida o nascimento de Jesus nos fala de uma vida que tem coragem de olhar além de tudo que nos aflige e nos abala.

 

Ele se torna pequeno para ser acolhido por todos nós que estamos passando esses momentos da nossa história tão assustadora. Nosso Deus é sábio em nos ajudar a compartilhar sua divindade compartilhando a dramaticidade da nossa vida.

 

É nisso que consiste nossa dignidade. Somos atraídos para essa verdade. Essa experiência de fé marca a nossa história. Portanto, imitando os pastores queremos anunciar nesses momentos difíceis boas notícias. Notícias animadoras, confortantes que fazem esperar grandes coisas, horizontes novos e sem fim. Incentivar novas relações sociais, comunitárias e familiares mais justas e fraternas.

 

Porém, em muitas ocasiões, quanta falta de transparência em tudo isso! Podem ver que as problemáticas, as dificuldades de se entender, os conflitos que surgem em consequência disso, tornam-se quase como uma denúncia da nossa não correta ação de vida. Assim sendo, creio que é necessário imitarmos aqueles pastores. Hoje em dia, estamos vivendo um bombardeio de informações, sobretudo nas redes sociais, mas tudo isso nos leva a ter um conhecimento real e verdadeiro da realidade ou cria mais confusão na nossa cabeça, favorecendo mais conflitos pessoais e sociais? E aquela gruta onde nasceu o Menino Jesus? A humildade e a simplicidade revelam um fato extraordinário de Deus que se rebaixa até nós.

 

Pergunto-me: se Deus se torna presente na nossa vida com total humildade, por que nós não podemos estar juntos despojados de qualquer arrogância, soberba, altivez? O Altíssimo se faz presentíssimo, não desprezando a nossa realidade, mas, ao contrário, compartilhando conosco o seu grande poder porque é preocupado com a nossa vida. Então, como queremos caminhar com os outros para compartilharmos aquilo que somos? Temos a coragem de nos rebaixar para favorecer os outros? A onipotência do nosso Deus, por incrível que pareça, se manifesta nessa capacidade de entrar na nossa vida. Uma verdadeira e transparente convivência é totalmente humilde porque quer favorecer a vida e, sobretudo, de quem mais necessita. É solidária e fraterna. Não é uma elucubração de palavras e pensamentos, mas de testemunho de vida.

 

Aquele silêncio recolhido daquela gruta emana uma magnífica e poderosa comunicação: a vida não tem limite. Quantas vezes não sabemos priorizar o silêncio, e sobretudo hoje em dia quando estamos recolhidos, isolados por causa dessa pandemia, temos medo de estar sós.  No entanto, no nascimento, Deus não fez manifestações de praça, barulhos de palavras, não tocaram tambores, ao contrário de nós, quando queremos mostrar algo de importante usamos todos os possíveis meios que estão ao nosso dispor para contar o evento da nossa vida.

Deus prefere comunicar no silêncio, porém, nós preferimos comunicar com barulhos. Que diferença! Creio que esta grande solenidade do Santo Natal possa se tornar para todos um momento de reflexão sobre como podemos aperfeiçoar a relação entre nós nesses tempos difíceis.

 

Feliz e Santo Natal.

Uma notícia superficial pode até destruir uma pessoa

A palavra ética provém do grego que quer dizer moral. Portanto, é a ciência que tem como objeto os valores em relação à ação do ser humano, baseando-se, sobretudo, no comportamento dele. A ética em quanto normativa se apresenta ao ser humano como uma tarefa, um fim, um ideal para realizar um esforço positivo ou remover os obstáculos que a sociedade, a cultura e a tradição se opõem. Em outros termos, a ética é o conjunto de valores com os quais se pode formular juízos sobre o que é bom, correto ou não.

A ética, portanto, tem a capacidade de discernir valores: aqueles bons, daqueles ruins; aqueles corretos, daqueles errados; aqueles praticáveis dos impraticáveis. Por isso, existe um código deontológico na comunicação (por deontologia, explica-se, é a filosofia moral que individua e debate os deveres das condições profissionais). Este código não tira a liberdade dos jornalistas, dos profissionais que atuam na mídia em geral, mas é um sistema de coordenação para orientar a atividade de cada membro da categoria. É como se fosse um manual que individua o mínimo ético comum.
Isto não significa, repito, tirar o direito de manifestar livremente o próprio pensamento com palavras ou qualquer outro meio de difusão. Todos os que trabalham no campo comunicacional têm a obrigação de respeitar a verdade substancial dos fatos, observando os deveres impostos pela lealdade e pela fé. A presença da ética impõe, além do mais, a todos os jornalistas e editores a correção de eventuais notícias ditas de formas erradas, e a corrigir eventuais erros, e sobretudo a respeitar o segredo profissional sobre a fonte da notícia.

A liberdade da imprensa deve ser guardada como um direito inalienável dos cidadãos. Um famoso político executivo, que não quero citar o nome, dizia: “Prefiro publicar uma notícia velha amanhã no lugar de uma falsa hoje”. Neste sentido, podemos atingir a questão da privacidade que oferece uma proteção das informações pessoais que são conservadas de maneira legítimas nos arquivos das organizações públicas e privadas.

A privacidade não implica em esconder um terrível segredo. Ela não faz outra coisa, senão reconhecer a importância de não dar a qualquer um o poder de fiscalizar a vida dos outros para o respeito deles próprios, a dignidade pessoal e a segurança, a autonomia e a identidade, em geral, a integridade e a imunidade da pessoa. A privacidade não quer dizer ser sempre ligada a uma condição de vida de um indivíduo único, mas ela pode ser compartilhada entre indivíduos ou pessoas que tenham algo em comum.

Neste sentido, é de suma importância respeitar esta ação de privacidade porque não sabemos, na verdade, a realidade e assim poderíamos prejudicar a existência daqueles indivíduos. Respeitar a privacidade significa também reconhecer quanto é importante o ser humano, embora que nas maiorias das vezes não seja reconhecido. Na bíblia, encontramos na leitura dos salmos que diz “quem conhece o ser humano, senão somente Deus?”. A privacidade, portanto, na comunicação é um momento de respeito, porque na verdade não conhecemos a verdadeira situação. Às vezes, reproduzir um fato ou notícia de maneira superficial pode até destruir uma pessoa.

Sem uma verdadeira comunicação as pessoas se sentem perdidas

A vida da cidade é bem diferente da vida rural. Então, qual é impacto comunicacional que gera a convivência das pessoas entre as duas realidades?

Os laços de união entre as pessoas na vida rural são bem mais consistentes que na vida urbana. O sentido de pertencer a um grupo ou família é bem determinante. No entanto, na vida urbana, a pessoa se individualiza cada vez mais, sendo levada a tomar decisões sozinha, praticamente isolando-se. A pessoa no mundo urbano se torna o centro de tudo, e a comunidade ou grupo torna-se somente uma referência optativa. Exatamente ao contrário do mundo rural. O ser humano do mundo urbano é sempre mais solitário, porém, com o prazer de estar, às vezes, imergido na massa popular. Gosta do anonimato. Portanto, uma população concentrada na maior parte nas cidades, temos como consequência uma população marcada por um excesso de individualização.

Aí a gente se pergunta: qual é a comunicação que prevalece nesse tipo de vivência? Reconhecemos que o mundo urbano oferece também grandes possibilidades de conhecimento e de progresso, mas deixa as pessoas fragilizadas no tecido comunitário, e também sem rumo. Por que isso? Porque a pessoa em si, ainda que seja forte e preparada, não tem capacidade de viver sozinha. Não suporta uma vida determinada no isolamento. Não é suficiente viver encostados uns nos outros. Precisamos compartilhar. No final, a verdadeira comunicaçao é isso próprio: é um processo de identificação entre as pessoas. Com isso, estamos vendo que se torna difícil uma comunicação no mundo urbano, embora que se possua muita tecnologia de comunicação.

O indivíduo urbano tem a sua disposição uma mídia avançada, mas se torna incapaz de fazer uma verdadeira comunicação. Segundo pesquisas religiosas realizadas alguns anos atrás, a maioria dos brasileiros fez opção da religião por motivação pessoal, ditada pelos seus interesses de circunstância. Veja como o critério da subjetividade se tornou mais importante do que o critério da objetividade. A cultura urbana enaltece esse tipo de opção de vida subjetiva. Qual o resultado de tudo isso? Nesse caso, teremos uma perspectiva de um florescente crescimento de pluralismo religioso. O ser humano da cultura urbana tenta uma identidade, também na questão religiosa, a partir das suas necessidades, e quer uma resposta imediata. Com isso, o pluralismo do novo fenômeno religioso responde aos seus anseios.

Ele entra solitário e sai reconhecido. Fortalece uma nova identidade humana. O ser humano imergido em uma cultura urbana é cada vez mais lançado além das suas fronteiras, dos seus limites. Torna-se planetário e, assim, perde de vista aquele espaço de intercomunicação mais próxima. Tem dificuldades de se comunicar com as pessoas que vivem perto dele. Assim sendo, precisa resgatar uma comunicação que saiba valorizar o intercâmbio humano, e tentar relativizar a importância dos grandes meios de comunicação na convivência social.

A midia deve favorecer a fraternidade

Um jovem me falou: “Padre, lá em casa ninguém me entende e eu assim fico sempre com o meu computador navegando na internet.”
A comunicação, o grande desafio do nosso tempo, é o fundamento existencial da relação humana, que tem o poder de fazer passar tal relação da essencial à existência, do intemporal (sem tempo) ao histórico. O destinatário assim procede em direção à meta de se tornar, não somente o que recebe comunicação, mas também que comunica. É um sujeito que procura e cria, determinado aprender a ser. É um laboratório de cor, sentimento, fantasia, razão, que o faz sujeito receptor e transmissor no mesmo tempo.

Como destinatário da comunicação audiovisual e digital, vive hoje imergido numa realidade flutuante, composta e heterogenia, experimentado o assim chamado conhecimento empírico. No entanto, não pode se tornar um recipiente, mas um filtro. Este é o desafio que se apresenta hoje. Porém, não podemos negar a grande importância que têm os instrumentos da comunicação social em promover a unidade e o progresso da família humana.
A Igreja é consciente de tudo isso, como confirma o decreto conciliar Vaticano II, Inter Mirífica (Entre as maravilhas), e o constante magistério pontifício. Da mensagem de S. João Paulo II para a 25ª jornada mundial para as comunicações (A proclamação da mensagem de Cristo nos meios de comunicação), extrai-se a seguinte consideração: “Desde muito tempo, a Igreja considera que a mídia seja vista como dom de Deus. O fim desses dons é a aproximação uns dos outros, mais intimamente na fraternidade e na busca do nosso destino humano. O uso dos meios de comunicação, hoje, a total disposição dos seres humanos, requer um alto sentido de responsabilidade com o qual se faz o seu uso. Neste quadro, cada membro da família humana, desde o mais simples consumidor ao maior produtor, tem sempre uma responsabilidade individual”.

Não obstante, o progresso da tecnologia precisa reconhecer que o nosso tempo, e também a mídia, é marcado por um difuso sentido de insegurança. É a insegurança que gera os seus medos. Em cada época, o ser humano teve os seus medos. Por exemplo, a época da civilização agrícola. Neste sentido, foi justamente relevado que o medo foi induzido pelo mundo externo: medo do cosmo com a sua imprevisibilidade gera insegurança. Isso levava a uma tensão fortemente mirada na busca das leis da natureza para dominar. Nesta perspectiva, a abertura ao religioso era reconhecida e gerava na boa e na má sorte aquela solidariedade que, infelizmente, hoje falta na era midiática.

Passando do medo cosmológico àquele que hoje podemos chamar de medo antropológico, o beneficiado pelas comunicações sociais se acha angustiado por um sentido de desorientação. O tempo da telemática é, portanto, contraposto por um sentido geral de mal estar existencial, que constitui aquilo que chamamos de medo do ser humano contemporâneo. Ocorre, portanto, sermos preparados mentalmente para enfrentar esta situação de poder que seduz e, ao mesmo tempo, faz medo.